Cinco coisas que levaria da Alemanha para o Brasil.
Neste artigo, listo as coisas que mais aprecio e respeito na Alemanha. Se possível, as levaria na mala, distribuindo essas qualidades pelo Brasil na minha próxima visita. Tentei fugir dos lugares-comuns e não citar a segurança, a economia estável e o transporte público eficiente. Apesar da importância, são coisas relativamente fáceis de nomear.
Optei, então, por abordar fatores que me agradam e qualidades descobertas a partir de uma vivência mais longa na Alemanha. Além disso, creio que os pontos levantados influenciam diretamente a boa qualidade de vida alemã. É simples olhar para um país rico e estável, como a Alemanha, e pensar que há algo inerentemente superior nele e em seus habitantes.
Porém, se despir tanto do sentimento de inferioridade quanto da ideia da superioridade europeia é um processo mais complexo. Como já abordado com o exemplo da Suíça, nada vem do nada. Se a Alemanha é um país rico e com boas condições de vida, é porque há razões concretas para isso.
Um aviso, contudo: a Alemanha não é um país perfeito. De fato, nenhum país é perfeito ou imaculado. Desigualdade e corrupção também existem na Alemanha. Como já falei antes, destacar um lado não significa fechar os olhos para o outro. Agora, no entanto, é o momento de focar nas coisas boas. Por isso, sem mais, eis o que levaria para o Brasil.
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1. O respeito pela arte, cultura e intelectualidade
Uma das experiências mais incríveis que tive na Alemanha foi visitar a casa, hoje museu, de Goethe em Weimar. Andei por aqueles cômodos inebriada na sensação de pisar o chão de uma das mentes mais brilhantes da humanidade.
Weimar ainda conta com as casas de Schiller e Nietzsche, ambas em bom estado de conservação e destinos turísticos cobiçados. Realmente, aqui não faltam grandes nomes das Artes e da Filosofia. Por isso, talvez, os alemães se empenhem tanto em conservar e difundir sua cultura. Porém, eles também sabem que valorizando sua cultura, valorizam seu país.
De forma geral, observo na sociedade alemã um profundo respeito pela arte, cultura e intelectualidade. Claro, nem todo alemão é um grande pensador. Mas hábitos como ler, visitar museus e exposições, frequentar leituras públicas, teatros e concertos fazem parte da rotina de muitas pessoas.
2. A consciência ecológica
Não é à toa que wandern é um dos primeiros verbos ensinados nas aulas de alemão. Wandern não é simplesmente caminhar ou fazer trilhas, mas uma forma de vivenciar a natureza bastante popular na Alemanha.
Muitos alemães adoram estar em contato com a natureza e, até mesmo, com o selvagem. Talvez essa seja uma das razões para a grande consciência ecológica. Ela está presente tanto em atitudes corriqueiras, como a separação obrigatória do lixo para reciclagem, como nas iniciativas das diversas ONGs dedicadas ao meio ambiente.
3. O debate
Os alemães adoram discutir sobre tudo: futebol, política, cinema, música, economia, alienígenas. Se você perguntar a um alemão sua opinião sobre algo, ele provavelmente vai refletir alguns momentos e dar uma resposta fundamentada.
Além disso, a sociedade alemã é extremamente autocrítica e questionadora. Talk shows políticos como hart aber fair (cuja tradução literal já diz muito: “duro, mas justo”) e Anne Will são populares e trazem participantes – políticos, ativistas, escritores – de opiniões opostas para discutir temas complexos e polêmicos. Dificilmente eles mudam suas posições, mas a lição é que a sociedade precisa estar aberta ao debate.
4. A memória histórica
Protagonista da Segunda Guerra Mundial e palco das tensões da Guerra Fria, a Alemanha possui uma das mais sombrias histórias recentes. Não seria surpreendente, portanto, se o governo e a sociedade optassem por uma súbita perda de consciência, insistindo em deixar o passado no passado.
Por isso, o trabalho com a memória na Alemanha é tão admirável. Um país sem memória é um país sem identidade e sem futuro. É preciso sim olhar para trás, assumir os erros, reconhecer os crimes, responsabilizar os autores, indenizar as vítimas e dizer “nunca mais”.
Dos julgamentos pós-guerra dos crimes contra a humanidade à construção de monumentos e museus em memória das vítimas do regime nazista, a Alemanha escolheu encarar sua história. Assim, o país conseguiu se reerguer e é hoje uma nação respeitada internacionalmente.
5. A seriedade
Eu já reclamei muito da rigidez dos alemães e, confesso, ainda sinto falta de certa leveza e da flexibilidade nas interações. Porém, aprendi a apreciar a seriedade alemã assim que entendi que a seriedade significa responsabilidade – por suas palavras e atitudes. Não há jeitinhos, há regras. Na vida prática, isso torna as coisas muito mais justas e transparentes.
Há alguns meses, estive no Rio de Janeiro. Estava hospedada em Ipanema e fui fazer compras num supermercado próximo ao apartamento. Não precisei pensar duas vezes antes de levar minha própria sacolinha de pano. Coloquei as compras na sacola e carreguei com as mãos o que não coube, incluindo um pacote de papel higiênico.
No caminho de volta, notei certos olhares horrorizados, provocados pela visão de uma mulher carregando seu próprio papel higiênico. Lembrei-me da primeira vez que comprei um pacote de papel higiênico em Leipzig. Fiquei constrangida de carregá-lo, como se houvesse motivo para o embaraço. Algo íntimo que não deveria ser revelado em público.
Felizmente, esse constrangimento foi superado em breve. Por isso, os olhares que recebi no Rio não me aborreceram. Fiquei feliz de ter crescido e deixado para trás uma vergonha boba e social. Não preciso de sacolinhas plásticas, não me incomodo de levar minhas compras nas mãos. Prefiro fazer esse gesto mínimo para a ajudar na preservação do meio ambiente.
Por que termino com essa história? Porque infelizmente não consigo trazer essa lista de desejos para o Brasil, mas – e essa é consolação – consigo trazer certas atitudes em mim.