Nos últimos meses, precisei realizar algumas viagens a trabalho. Como foram várias viagens realizadas em um curto espaço de tempo, ouvia algumas pessoas me dizerem: “Que inveja!”, “Nossa, que delícia! Vai dar para você ir para praia?”, “Fala sério que você só vai fazer o que precisa e não vai tirar um tempo para você aproveitar?” Por conta desses e outros comentários, comecei a perceber que muitas pessoas acham que viajar a trabalho parece ser a mesma coisa que viajar de férias, por isso, decidi escrever este texto.
Na minha opinião, quando um profissional é escolhido para realizar uma viagem a trabalho, é porque deve ser considerado a melhor pessoa para realizá-la, não é por ele ter sido selecionado para se divertir. Imagino que pessoas que viajam a trabalho sejam responsáveis o suficiente para cumprir todos os agendamentos envolvidos neste processo como qualquer profissional deve ou deveria ser, simples assim.
É claro, que conheço diversas pessoas que realmente não teriam as mínimas condições de incluir mais este tipo de tarefa na rotina, mesmo que só eventualmente, porque simplesmente não conseguem chegar no horário a uma reunião marcada no próprio escritório em que trabalham.
Por pensar desta maneira, não consigo entender onde está a parte legal e divertida presente no imaginário coletivo da turma que acha que tudo será festa. Sempre que preciso viajar a trabalho, sinto que a responsabilidade aumenta, por saber que também precisarei dar conta também dos seguintes aspectos:
• É impensável se atrasar por qualquer motivo. O medo que sinto de perder algum horário, para mim, é a parte mais tensa do processo. Por razões econômicas, acaba sendo comum um profissional precisar sair muito cedo e/ou chegar muito tarde em casa pelo fato dos preços de passagens serem mais acessíveis. Quando isso acontece e preciso sair de casa ainda de madrugada, confesso que nem durmo direito com medo de perder o horário;
• A variável preço para as empresas também é importante quando se trata de hotéis e, numa dessas, pode-se cair em uma roubada. Infelizmente, já passei por alguns perrengues neste sentido há alguns anos, e sentir-se insegura e desconfortável por causa de economia barata chega a ser desrespeitoso;
• Calcular o tempo de deslocamento para chegar ao compromisso marcado na cidade visitada também é fundamental. Imagine depois de toda a logística realizada, se tiver algum acidente ou trânsito que seja considerado “normal” e você não chegar? Certeza que haverá uma conversa interessante com seu chefe!
• Outra atividade comum quando se realiza estas viagens é a organização de notas fiscais e comprovantes que precisarão ser entregues na empresa para solicitação de reembolso. OK, faz parte, mas está aí uma etapa burocrática que deve ser vencida quando se viaja com crachá.
Sair da sua rotina para viajar a trabalho neste esquema, na minha percepção, é quase que realizar uma maratona. Você precisa ser muito organizado e prático: Costumo fazer check-in com antecedência, marcar poltronas que não fiquem no fundo do avião, não despachar mala, para ganhar um tempo que se torna precioso para não chegar esbaforido aonde quer que seja.
Quando as pessoas começarem a entender que não haverá uma medalha na linha de chegada depois de cumprir toda esta maratona, porque tudo isso é trabalho, talvez parem de fazer piadinhas e comentários desnecessários a respeito disso.
Um dia, conversando com uma amiga sobre as logísticas que faço para manter meus compromissos de viagens, ela me disse que seu pai, em uma fase da vida, também viajou muito, mas sempre viajava com um dia de antecedência para estar descansado e disposto para o compromisso do dia seguinte. Disse a ela, que dependendo da cidade que você estiver no Brasil e para onde você tiver que ir, dificilmente isso acontecerá. Isto porque comprar passagens com antecedência, marcadas para o dia do compromisso garantindo, assim, uma diária de hotel a menos, normalmente é a regra.
Pude constatar com outros amigos que também viajam a trabalho que a saga é a mesma e quando a viagem é internacional, não muda muita coisa não. Ah, quando a viagem é internacional é comum viajar com dois dias de antecedência, ou seja, viajar no sábado, para estar lindo no compromisso da segunda.
Entendo a necessidade de as empresas realizarem economias, que o índice de desemprego no Brasil tem aumentado mês a mês e que se manter no trabalho requer jogo de cintura, inclusive nesses aspectos, por isso, acredito que esse esquema de vida para os viajantes com crachá deverá permanecer por um bom tempo.
Às vezes me faço algumas perguntas que não sei se são feitas pelas empresas quando iniciam um planejamento de viagem para seus funcionários:
• Será que quando se compra uma passagem mais barata para pousar ou decolar em um aeroporto mais distante esquecem-se dos gastos com táxi utilizados nesses deslocamentos? Muitas vezes a soma do preço dessas passagens com o valor cobrado nesses deslocamentos empatam com o preço de uma passagem em um horário mais “normal” saindo ou decolando de um aeroporto mais central.
• Será que reservar um hotel por um preço mais em conta, sem avaliar se cumpre as mínimas condições de higiene, segurança e infraestrutura para o funcionário que estará fora de sua casa possa ficar hospedado é ideal? Às vezes a diferença de preço de um hotel desses comparada com um hotel simples, mas de rede que tem padrão para tudo é tão irrelevante que ainda assim deixa de ser considerada.
Ah, mas você pode estar perguntando: Mas não há pessoas que também fazem economias para realizar viagens de férias? Minha resposta é sim, porém há uma grande diferença aí. Uma pessoa pode até buscar opções mais econômicas, no entanto, as escolhas serão totalmente autônomas. Ela poderá comprar a passagem mais barata, viajar de madrugada, reservar o hotel que talvez não seja dos sonhos, porém o tempo para organizar o que se quiser fazer quando bem entender é todo dela, essa é a grande diferença na minha visão.
Meu intuito com este texto é tentar desmistificar a ideia de que viajar a trabalho é uma delícia, é divertido. Pode até ser para alguns, mas para mim e a maioria das pessoas não é bem assim. Delícia é poder viajar a lazer para onde quer que seja, no seu esquema, aí sim é de dar inveja. Pense nisso!
2 Comments
rsrs, a “vantagem” é que as vezes conhecemos, por mais corrido que seja, alguns lugares que nunca iriamos a lazer. .. mas como disse, é isso mesmo, a economia (porca) as vezes cai sobre o viajante a trabalho e a culpa acaba sendo nossa,, hoteis sem internet adequada, sem higiene ou conforto e chegamos cansandos e as vezes irritados a nossa tarefa que fomos designados… hoteis distantes que precisamos pegar um taxi para ir e oltar nas refeicoes..
Olá San,
Pois é, muita gente acha que existem “vantagens” ao realizar viagens a trabalho mesmo sabendo à maneira de como muitas empresas tratam todas as logísticas envolvidas.
Agradeço pela leitura, comentário e aproveito para desejar boa sorte em suas próximas viagens.
Um abraço,
Liliane