Como já escrevi aqui no Brasileiras pelo Mundo, a Arábia Saudita é o único país no mundo onde as mulheres são proibidas de dirigir. E é nesse cenário, onde homens e mulheres são tratados de maneiras bem distintas dentro da sociedade, que fica a pergunta: como é o mercado de trabalho para as Sauditas?
Segundo dados recentes, 14% da força de trabalho do país é formada pelo sexo feminino. As sauditas trabalham, mas para isso precisam de uma autorização do seu guardião (que em árabe se chama “wali”, e pode ser o pai, esposo, tio ou primo), desde que o seu trabalho não atrapalhe nas suas tarefas como dona de casa, mãe e esposa. Em alguns casos, se na função profissional existir interação da mulher com uma pessoa do sexo masculino, a permissão para trabalhar pode não ser concedida pela família.
Isso pode parecer muito estranho para nós, tupiniquins, mas a separação entre homens e mulheres na Arábia Saudita acontece desde muito cedo ainda nos primeiros anos na escolinha. Já no jardim de infância, as turmas são separadas somente entre meninos e meninas, e essa segregação continua até mesmo na universidade. Apenas as famílias um pouco mais, digamos, “moderninhas” aceitam quando existe a necessidade da interação entre mulheres com homens em um ambiente profissional, por exemplo.
Uma curiosidade: eu mesma já tive a oportunidade de visitar um lar saudita e fiquei muito surpresa ao ver que, mesmo dentro de casa, os ambientes eram duplicados. Por exemplo: duas salas de estar, duas salas de jantar… Isso porque um ambiente é dedicado apenas para os homens e outro, somente para as mulheres. Existem famílias onde a interação entre homens e mulheres existem normalmente, como vivemos no Brasil, por exemplo, mas elas são minoria no país.
Mesmo com toda essa separação entre os sexos, a Arábia Saudita é um dos países que mais investe em educação. O governo, depois de uma criteriosa seleção, traça um plano de formação profissional totalmente patrocinado pelo país. Homens e também claro, mulheres, são beneficiadas por essa iniciativa. Para você ter uma ideia, 40% das Sauditas possui diploma de bacharel ou superior.
Apesar de todo o investimento do governo com a educação, de acordo com algumas estatísticas divulgadas no país, menos de 5% das mulheres são formadas nas áreas fundamentais para o desenvolvimento de uma nação, conhecida pela siga STEM (Science, Technology, Engineering e Math) – e menos de 4% se formam em áreas como Engenharia. A título comparativo, dois dos grandes empregadores do país possuem respectivamente 4% e 0.001% da sua força de trabalho composta pelas mulheres.
Em 2011, na capital, Riade, foi inaugurada a maior universidade do mundo, conhecida como Princess Nora bint Abdul Rahman, apenas para as mulheres. Com mais de 52 mil estudantes matriculadas, a Universidade é um dos maiores orgulhos do país. Eu já tive a oportunidade de ver a Universidade de perto, e o complexo é simplesmente gigantesco.
Mais para o oriente da Península, em regiões como Dammam, Dhahran e Al Khobar, onde se concentra grande parte da exploração de petróleo, as empresas da região também investem na educação das sauditas. Algumas empresas oferecem programas de educação de acordo com as necessidades da companhia. As mulheres são enviadas a países de 1° mundo como Estados Unidos e Inglaterra e vão estudar com tudo absolutamente pago pela empresa, em universidades conceituadas. A maioria das moças se formam na área de suporte e, depois de graduadas, retornam à companhia para colocar em prática tudo o que aprenderam no ambiente acadêmico. Fazer parte de um programa desses é motivo de orgulho para toda a família. Depois de alguns anos, muitas se inscrevem no programa de educação avançada, para mais 2 a 3 anos de mestrado fora das Arábias – mais uma vez com todos os custos pagos pelas empresa.
Apesar desses programas de total incentivo a capacitação das sauditas, hoje em dia vemos muitas mulheres trabalhando em funções populares como por exemplo, caixas de supermercado e atendente de lojas. Por incrível que possa parecer para nós, ver mulheres trabalhando, ainda mais com essa interação direta com o público em geral, era algo impensável há poucos anos atrás. O trabalho permite que essas mulheres tenham uma renda e possam assim ajudar as suas famílias.
Os passos podem parecer curtos e muito lentos para nós, brasileiras, acostumadas à liberdade para decidir o que estudar, onde trabalhar, o que fazer de nossas vidas. Mas a verdade é que pouco a pouco as mulheres sauditas vão conquistando o seu espaço dentro do mercado de trabalho na região. Elas ainda não podem dirigir mas já podem trabalhar como médicas, professoras, engenheiras, vendedoras e etc. Assim como nós, muitas são determinadas, esforçadas e batalhadoras, buscam uma oportunidade na construção de um futuro e um país cada vez melhor. Alguém ainda tem dúvida de que, aos poucos, unidas, elas vão longe? Sauditas ou não, um viva a todas nós, MULHERES!
15 Comments
Ola, parabens pelo artigo.
Tenho uma duvida: As mulheres estrangeiras (vc por exemplo) que decidem morar la tambem sao obrigadas e cumprir as mesmas leis que valem para as sauditas? (Nao dirigir, precisar de concessao pra trabalhar, cobrir o rosto, etc)?
Oi Sydnei, as mulheres estrangeiras precisam de concessão para trabalhar em todo o Oriente Médio, não apenas na Arábia Saudita, porém é somente uma autorização de praxe. As estrangeiras também não são obrigadas a cobrir o rosto nas Arábias. Com relação a não poder dirigir em Saudi, isso vale para todas as mulheres, estrangeiras ou locais. Eu falei mais sobre o assunto nesse outro artigo. Muito obrigada pela sua participação! Um grande abraço
sim… moro aqui também e temos que usar a abaya preta e cobrir o cabelo .. O rosto pode ficar de fora mas dirigir não podemos e trabalhar em alguns lugares já encontra-se mulheres trabalhando
Oi Juliana, em que parte da Arábia Saudita você mora?
Tem o “Brasileiras em Saudi” no Facebook (grupo secreto), para as Brasileiras que vivem por aqui. Você já faz parte? Um grande abraço 🙂
Oi, Carla, descobri teu blog há pouco tempo e tô amando!
Fiquei curiosa para saber como estrangeiras podem conseguir um emprego na Arábia Saudita. É necessário ter o domínio do idioma? Ou o inglês é suficiente para o começo?
Terminei um relacionamento recentemente com um saudita que conheci nos EUA justamente por não ter informações de como poderia dar continuidade à minha carreira na Arábia Saudita se me mudasse pra lá com ele.
Estou me formando em Engenharia de Produção e, por essa área ser predominantemente dominada por homens na Arábia Saudita (eu acredito), achei que seria muito difícil conseguir dar continuidade à minha carreira lá. Até porque, apesar de querer construir uma vida com ele, não considero a possibilidade de abandonar minha carreira. Beijos.
Oi Kamila, muito obrigada pelo seu comentário! Que bom que está curtindo o Carioca Travelando – esse é o objetivo 😉
Sugiro que leia esse post no Carioca Travelando onde eu respondo as dúvidas mais comuns que recebo sobre a região (na verdade é uma série com 3 posts, sendo esse o primeiro). Com relação a trabalhar na Arábia Saudita, é possível sim conseguir uma vaga por aqui, e a fluência no idioma inglês é fundamental. Um beijo pra você também e Boa Sorte! Carla
http://cariocatravelando.com/2014/04/especial-arabia-saudita.html
https://brasileiraspelomundo.com/arabia-saudita-mercado-de-trabalho-no-oriente-medio-29194056 (Sobre o Mercado de Trabalho no Oriente Médio)
Carla, ótimo artigo, mas acho que é (..) Engineering and Math, não engineer.
Isso mesmo John, você está certíssimo! Fala Nossa na hora de digitar. Muito obrigada 🙂
Olá Carla, estou prestes a ir para arabia, porém li uma reportagem em algum lugar que dizia que estrangeira assim que chegasse no aeroporto para poder entrar no país teria que vestir a abaya, isso é verdade?
Oi Fanny, seja muito bem vinda as Arábias! Olha, se você já tiver uma abaya em mãos, ótimo. Caso contrário fique tranquila, não precisa sair correndo atrás de uma abaya para entrar no país. Te sugiro viajar com uma calça comprida larga, que não marque muito o corpo, assim como um casaquinho que cubra os braços. É bom evitar cores fortes e decotes, a fim de não chamar muita atenção no aeroporto. Um look todo preto, calça, blusa e casaco é o ideal, mas se for de outras cores não tem problema mesmo. Já vi muitas expatriadas sem abaya no aeroporto, porém vestidas modestamente, andando por lá sem problemas. Eu mesma retiro a abaya no aeroporto, quando viajo para fora do país. Já sabe em qual cidade irá morar? Se tiver facebook, me passe o email que você usa por lá para que eu possa adicioná-la ao grupo secreto que criei, o “Brasileiras em Saudi”. Já somos mais de 100 mulheres no país vivendo com suas famílias em diversas cidades. A comunidade brasileira é muito unida, tenho certeza que irão te recepcionar bem. Me procure através do CariocaTravelando.com e será um prazer te ajudar no que for possível. Um grande beijo e boa sorte!
Carla, você pode me adicionar neste grupo secreto, meu marido está com uma proposta para trabalhar em Dammam e eu estou desesperada. E-mail deilse.pereira@gmail.com / Facebook Deilse Pereira. Beijos e obrigada!
Oi Deilse, tranquilize o seu coração e parabéns pela proposta de trabalho! Vou te enviar um email. Um grande abraço
Oi Carla, tudo bem? Vc pode me add nesse grupo tb? Meu marido recebeu uma proposta de trabalho e tô pesquisando como é lá. Cultura. Vestes. Como se portar……. me fala um pouco da educação, tenho um pequeno e fico preocupada… é Escola pública ou particular? Meu coração chega a sair pela boca só de pensar…….. Mas adoro desafios e dificuldades. Adoro me aventurar….bjao
Greice, a Carla parou de colaborar conosco mas você pode falar com ela através de seu blog pessoal, o Carioca Travelando.
Edição BPM
Pena que ainda depende de autorização da família, mas é bom saber que aos poucos as mulheres vem conquistando seu espaço no mundo patriarcal. Mas ainda há muito em que se avançar, mesmo aqui no Brasil onde há “liberdade*” ainda há um longo caminho a percorrer até uma igualdade de gêneros.