Eu sou médica e desde que cheguei ao México trabalho com equipes de doação de órgãos e transplantes. Atualmente sou coordenadora de doação e transplante na Cidade do México, em um hospital privado. Fiz mestrado em Tanatologia e estou a um semestre de terminar o doutorado também em Tanatologia.
Há alguns dias eu vi um vídeo de um cachorrinho que ficou cego, e depois foi operado. O reencontro dele com a sua família, quando ele recuperou sua visão foi emocionante! Foi uma festa, parecia que ele dizia: – OBRIGADO GENTE, OBRIGADO MESMO!
Se é assim para um animalzinho, imaginem como é para um ser humano recuperar a visão. É ser livre, recuperar a vida social, trabalhar, estudar, viajar saudável pelo mundo!
No México, segundo o CENATRA (Centro Nacional de Transplantes) 20500 pessoas estão esperando um presente especial chamado transplante de órgãos ou de tecidos. São homens, mulheres e crianças na lista:
- 12460 pessoas esperam um rim.
- 7514 pessoas esperam para recuperar sua visão com um transplante de córneas.
- 386 esperam um fígado.
- 55 esperam um coração.
Para o fígado e o coração, o assunto é grave por que muitas pessoas se não forem transplantadas logo, falecerão em pouco tempo.
Que tipo de transplante existe?
Existem dois tipos:
1) Doador vivo, quando uma pessoa doa para outra um órgão duplo, tipo o rim, um pedacinho do fígado, ou tecido, como a medula óssea. Quem pode fazer esta doação são homens e mulheres maiores de idade.
Mateo, um dos nossos pacientes pediátricos, tinha dois anos e 8 meses quando descobriram que ele tinha câncer no fígado, e precisava ser transplantado para sobreviver. Seu pai foi o doador. Mateo recebeu um segmento hepático do seu pai, há dois anos, que salvou a sua vida!
Quando ele foi operado tinha três aninhos, e sua vida era limitada, ter um cachorrinho nem em sonho, ir para escolinha? Era perigoso… Hoje o nosso Mateo Mocito (assim podem procurá-lo nas redes sociais) tem a sua cachorrinha, vai para escola, e é um menino sadio.
2) Doador cadavérico: quando falecemos dentro de um hospital, depois que sofremos um traumatismo craniano encefálico grave, que pode ser um acidente na rua, levar um tiro na cabeça, ou arrebentar um aneurisma no cérebro, por exemplo. Estes pacientes podem evoluir para morte encefálica, quer dizer que mesmo que o coração esteja batendo, o cérebro não funciona mais, ele morre, e dai demora pouco tempo para o coração deixar de funcionar.
Nesses casos, se você já decidiu ser doadora de órgãos, e for classificada, quando você falecer você pode deixar um presente para no mínimo cinco pessoas diferentes. Enquanto essas pessoas existirem, elas se lembrarão de você e da sua família, e tenho certeza que todos os dias agradecerão essa nova oportunidade de vida.
O que eu preciso para ser uma doadora de órgãos?
A única coisa que você precisa fazer é falar da sua decisão com sua família e amigos. Na maioria dos países não precisa assinar nenhum documento ou deixar nada por escrito, porém, a sua família deve saber da sua decisão de ser doadora de órgãos, para que a única coisa que ela tenha que fazer, é autorizar ao hospital que você está internada a que os presentes que você deixou, sejam encaminhados a quem precisa, por meio dos médicos, quando você não necessitar mais dos seus órgãos.
O momento da morte é um momento de muita tristeza e confusão emocional, mas se você já conversou com a sua família ela só dará seguimento ao seu desejo, e isso ajuda muito no processo de luto. A família sente que realiza o teu desejo, mesmo depois da morte.
Muitas famílias, não autorizam a doação porque não sabiam do desejo da pessoa que faleceu. Por isso converse em casa sobre a doação de órgãos. Outras não gostam que falar sobre a morte, porém é necessário. O fato de que nós que estejamos fora do nosso país não impede a doação, desde que alguém da família autorize o hospital.
Também tem quem não quer dizer que é doadora, porque acha que os médicos não cuidarão bem do paciente com a intenção de retirar os órgãos para transplantes. Isso é lenda urbana.
Para que uma pessoa seja doadora, ela tem que ser diagnosticada com morte encefálica, e são realizados vários estudos para comprovar que o cérebro realmente morreu. A morte encefálica, é diferente do coma cerebral.
No estado do coma cerebral, é como se o cérebro estivesse em standby, ele pode voltar a funcionar de uma hora para outra, assim como pode passar, anos descansando. Já a morte encefálica é um diagnostico irreversível e o paciente não vai melhorar, nem vai acordar.
Finalmente nem todas as pessoas que decidem ser doadoras se tornam doadoras no momento da morte, porque existe uma série de exames que são feitos para ver se somos as doadoras ideias.
Eu já decidi que quero deixar presentes para as pessoas que precisam e doadora de órgãos se tudo der certo no final e minha família já foi avisada.
Nós nunca saberemos quem poderá ser beneficiado com o nosso ato de amor. Informe-se como ser doador no país que você está vivendo agora.
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Estou apaixonada por seus textos. Da para ver que você é uma apaixonada por seu ofício, lhe desejo toda sorte do mundo e que venham mais textos inspiradores como este.
beijo grande Bruna