Porque os indianos tem tantos empregados?
A população da Índia atualmente é de mais de 1 bilhão e 300 milhões de pessoas. Vocês podem imaginar que, com tanta gente assim ,existe uma grande oferta de mão de obra; portanto, a mão de obra é muito barata.
Hoje vim contar um pouco sobre como é a dinâmica de trabalho dos ajudantes domésticos, aqui chamados de helpers (ajudantes). Apesar de viver no Brasil anteriormente, onde temos uma cultura parecida, fiquei bastante surpresa com o que vi acontecendo por aqui.
Assim que nos mudamos para o apartamento que tínhamos alugado, a dona do imóvel estava nos esperando para dar as boas-vindas. Toda orgulhosa do seu imóvel, me informou que estava tudo limpinho e logo me entregou alguns cartões de visitas escritos em hindi ou gujarati, as línguas da região. Perguntei o que era aquilo e ela me disse que era o cartão do homem que entregava o leite em casa, do moço que lavava o carro, do outro fulano que entregava o jornal e assim por diante… Era uma lista interminável de atendimentos a domicílio. Pensei comigo mesma que não precisaria nada disso, afinal de contas, leite se compra no supermercado e jornal, na banca. Essa era ainda a minha lógica brasileira.
A primeira surpresa aconteceu quando fui checar quão limpo estava o apartamento para eu poder trazer nossas “coisas” – algumas poucas malas que trouxemos conosco, uma vez que optamos por trazer apenas roupas e objetos pessoais. O prédio era novinho, acho que tinha um ano de construção, e era a primeira locação, portanto tudo na casa também era novo, inclusive todos os armários embutidos. Aqui vale uma observação: todos os móveis planejados e embutidos na Índia são fabricados e montados dentro do lugar onde serão instalados. Isso mesmo! Os marceneiros trazem todas as máquinas e passam meses fazendo os móveis dentro de casa. Vocês não podem imaginar o barulho e a sujeira que eles fazem. Acompanhei, de perto, dois vizinhos de porta fazendo o processo. Pois bem, voltando aos meus armários: a limpeza que a dona do apartamento se referiu não contemplou toda a cola e o pó da madeira que ficou acumulada dentro dos armários enquanto eles os estavam fazendo, e também não contemplou todos os outros tipos de sujeira que uma obra recém entregue deixa para trás. Passei muito tempo limpando tudo isso, porque nenhum helper conseguia me ajudar nessa tarefa.
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Foi então que comecei a procurar uma ajudante doméstica. O pó aqui é invencível, o que faz com que tenhamos que limpar tudo todos os dias. Descobri que, em geral, não existem ajudantes diaristas, mas sim que cada um faz um trabalho. Ou seja, uma pessoa vem (muitas vezes sem hora marcada), varre o chão e depois passa pano. Outra pessoa vem e tira o pó dos móveis. Uma terceira vem só para limpar os vidros. E, na maioria das vezes, elas trazem alguém da família ou para ajudar, ou apenas para ficar olhando.
Comigo essa dinâmica indiana durou uma semana. Era um entra e sai de gente em casa e nada ficava limpo, porque não existia nenhuma ordem na limpeza e arrumação. Foi quando o nosso motorista – pois é, precisamos de um motorista porque é impossível dirigir aqui, por questões de segurança -, que é mais um nessa lista dos helpers, nos indicou uma pessoa que trabalharia o dia todo e que falava inglês, mais ou menos umas 6 palavras. Aos poucos fomos nos adaptando, eu ao modo de viver indiano e ela, à nossa cultura.
Com o passar dos meses, fui convivendo mais com eles e entendendo que existem duas categorias de ajudantes: aqueles que trabalham para os estrangeiros, que em geral entendem um pouco de inglês, que estão mais acostumados com a cultura ocidental e, consequentemente, ganham muito mais que os da segunda categoria, que são aqueles que trabalham para famílias indianas.
Nas famílias indianas, geralmente o número de ajudantes é enorme. Basta ter um pouco de dinheiro e eles não fazem nada dentro de casa. Nem ao menos um copo de água eles se servem. Os ajudantes cuidam de tudo. Para exemplificar, tenho uma vizinha que era minha professora de inglês, e nos tornamos grandes amigas. Ela e o marido moram num apartamento de 3 quartos, uns 150 m2. Eles têm 29 anos. Ela é designer e ele é empresário. Eles têm ao todo 7 ajudantes em casa todos os dias. E funciona mais ou menos assim: tem um ajudante que lava o carro pela manhã, o motorista que atende o casal (ambos sabem dirigir) e um ajudante que mora com eles e trabalha 24 horas por dia, todos os dias, com uma folga por mês e recebe em torno de 120 dólares por mês pelo seu trabalho. Tem uma ajudante que trabalha das 9 às 17 horas todos os dias e recebe cerca de 70 dólares. Tem 2 cozinheiras que vêm todos os dias na hora do almoço e do jantar preparar as refeições, além do ajudante que passeia com os cachorros 2 vezes ao dia.
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Em geral, a remuneração é muito baixa e não existe lei que proteja esses trabalhadores. Eles começam a trabalhar muito jovens. Vemos meninas de 15 anos trabalhando como babás e sempre recebendo uma quantia para nós irrisória, apesar do baixo custo de vida daqui. Só para se ter uma ideia dos valores, aqui no meu prédio as famílias indianas costumam pagar:
- 10 dólares por mês para um ajudante lavar suas roupas;
- 30 dólares para cozinhar e limpar a cozinha todos os dias;
- Mais ou menos 4 dólares por mês para que eles limpem 3 banheiros todos os dias.
E temos também os motoristas, figura muito importante por aqui. Para a maioria dos indianos, ter um motorista é uma questão de status, enquanto que para os estrangeiros é uma questão de segurança. Eles recebem em média 150 dólares por mês para trabalhar 12 horas por dia para as famílias indianas.
Existe aqui um código quase secreto das profissões. Apesar de proibida por lei, sabemos que muitas castas só podem ter ou exercer determinadas profissões. Isso não é muito claro para nós, mas sabemos que funciona assim. Confesso que me sinto muito incomodada com isso, mas eles parecem não ter nenhum problema com essa organização que existe há milhares de anos. E você, o que acha disso?
9 Comments
Moro na Índia também, super me identifiquei com o apartamento novo cheio de sujeira de obra no início os meus produtos de limpeza eram Tiner e espátula, deu muito trabalho não gosto nem de lembrar.
Desde o início eu decidi que não teria um monte de pessoas entrando e saindo aqui em casa, com muito custo achei uma ajudante que não falava uma palavra se quer em Inglês, a saída foi mímica kkkkk. Ela topo trabalhar 100% no meu estilo, ensinei TUDO pra ela, começando com uma aula intensa de como usar a vassoura já que aqui a vassoura deles é bem diferente. E assim fomos nós acertando, foi preciso muuuita paciência da minha parte e força de vontade da dela. Já fazem quase 4 anos que ela trabalha conosco, hoje ela já sabe tomar conta de tudo sozinha, mas periodicamente eu preciso realinhar as coisas com ela pq parece que ela faz algumas coisas mas ela não entende o pq dela ter que fazer aquilo é ela acaba relaxando um pouco por talvez achar que não seja importante.
Ola Naiobi, obrigada pelo contato e comentario. Em que lugar voce mora? Vamos trocar umas experiencias? Por aqui eu desisti de ensinar a usar a nossa vassoura e tambem o aspirador. Deixo ela usar a vassoura dela, mas cobro pelo resultado kkkk
Sem duvida e um exercicio diario de paciencia e perseveranca. E acredito que o mais dificil e que nossa refrencia de limpeza e muito diferente da deles. O que voce acha? Beijos e vamos nos falando,
triste, muito triste. Aqui (no Brasil) já acho um absurdo o salário das domésticas e os abusos que muitas sofrem, imagino como sofrem os indianos mais pobres!
Rita obrigada pelo comentario. E voce tem toda razao, eles sofrem muito mesmo. A desigualdade social aqui consegue ser maior do que no Brasil e as condicoes de trabalho assim como as leis trabalhistas sao precarias.
Uma loucura as diferenças nesta relação de trabalho. Eu e a Janaina ficamos atônitos com toda esta questão; não conhecíamos este sistema da India e acharmos um absurdo os valores e forma de trabalho dos “helpers”,
Parabéns Barbara, pelo excelente texto, informativo e muito divertido.
Abraço,
Fernando
Janaina e Fernando, que bom que gostaram do texto. E realmente chocante para nos brasileiros a dinamica de trabalho deles, imagine para os europeus e americanos que nao sao acostumados a ter ninguem para ajuda-los. E de fato um outro mundo kkkk
Obrigada pelo comentario!!
Dá arrepios só de pensar na sujeira quando se instala os móveis planejados, imagina fazer no local? Não dá para imaginar.
Adorei o comentário de ter um motorista por questão de segurança. Imagino que nem com o motorista o trânsito da India deve ser seguro!
Priscila nao tenho referencia para a quantidade de po que isso faz. Para nos e impensavel, mas para eles muito natural. Sao essas coisas que mudam nossa visao de mundo !! Beijos no coracao e obrigada.
A questão de comunicação é difícil..
Cara .. Pois tenho uma amigo que conversamos e ele fala que é caro a internet e que só da pra falar quando um amigo lhe da uma oportunidade…