Olá, brasileiras espalhadas pelo mundo. É um grande prazer poder participar deste grupo, trocar experiências e sentir que não estou tão longe do Brasil quanto diz a geografia. A verdade é que quando saímos do nosso país, pelos mais diversos motivos, e nos tornamos as “expats”(como carinhosamente nos chamam por aqui) parece que tudo relacionado ao Brasil fica ainda mais verde e amarelo. Que saudades de tudo!
Saí do Brasil em 2005, quando me casei e fui morar na Patagônia, Argentina, com meu esposo que trabalhava por lá. Dois anos depois, fomos para o México e atualmente estamos na Indonésia há quase quatro anos.
A Indonésia é um país do Sudeste Asiático, formado por mais de 17.000 ilhas, considerado o maior arquipélago do mundo e o quarto país mais populoso, com 247 milhões de habitantes, atrás apenas da China, Índia e EUA.
É curioso, mas quando digo que moro na Indonésia a maioria das pessoas logo a relaciona com tsunami, Bali e atualmente com o lamentável caso das execuções de dois brasileiros. A Indonésia não é só isso, mas para nossos quase 200 milhões de brasileiros e outros tantos estrangeiros no mundo o lugar virou o centro das atenções, negativamente, nos últimos meses. Esqueçamos todos os comentários jocosos e outras piadas de mau gosto vistos nas redes sociais – pois a meu ver na verdade representam o descontentamento de um povo com a justiça e não com o condenado – e pensemos em como e por que ocorre esse tipo de punição por aqui.
Acreditem se quiser, o povo indonésio em geral é pacífico, alegre, curioso e tolerante. Haja visto que o país que abriga o maior número de muçulmanos no mundo orgulha-se por garantir a liberdade religiosa de seus habitantes, que se dividem entre cristãos católicos e protestantes, budistas e hinduístas.
Entretanto, sabemos que a coisa nem sempre é bem assim… A liberdade religiosa esbarra por exemplo em casos de casais de diferentes religiões, onde um deverá renunciar à sua religião para seguir a religião do cônjuge, ou mesmo quando se é obrigado a informar sua religião ao preencher um formulário em instituições públicas (e até mesmo em alguns cadastros de lojas!).
O fanatismo religioso aqui na Indonésia está longe de parecer-se à loucura que vivem alguns países árabes, mas os muçulmanos não deixam de ser rígidos em seus pareceres. E quanto mais rígido e correto você for, mais admirado será… E é aí que entra Joko Widodo, presidente eleito em 2014.
Com um discurso nacionalista, uma das promessas de campanha de Jokowi (como é conhecido) era fazer cumprir-se a lei contra os traficantes de drogas com a punição que lhes cabe nestes casos, coisa que vinha sendo adiada pelo presidente anterior. Segundo Jokowi, a luta contra o tráfico de drogas é uma “emergência nacional”.
E ainda que se relacione o tráfico de drogas com cidadãos estrangeiros, vários indonésios já foram sentenciados e condenados à morte. E com isso o presidente deixa claro que os países estrangeiros não se devem intrometer na autonomia de seu país. A lei se dá para o estrangeiro e para o nacional. E fim de papo.
Em janeiro deste ano, quando o brasileiro Marco Archer foi executado, eu estava no Brasil. Lembro-me de ter ouvido o assunto por semanas nos noticiários, com direito a especiais do Fantástico. Requintes de detalhes de como o fuzilamento acontece e reportagens angustiantemente descritivas, trazidas diariamente por sites de notícias, eram de embrulhar o estômago e colocava pessoas pró e contra a discutirem nos comentários (alguns completamente sádicos por sinal!).
Na semana passada, com a morte de Rodrigo Goularte, eu estava aqui na Indonésia. E não fosse por um breve noticiário em indonésio que assisti numa sala de espera (então consegui apenas “adivinhar” do que se tratava) ou por notícias do Brasil, eu nem saberia que o brasileiro havia sido executado.
Junto com Rodrigo, foram executados dois traficantes australianos que faziam parte de uma máfia conhecida como “Bali Nine” (os 9 de Bali). A imprensa australiana também deu grande atenção ao caso, trazendo à tona a discussão da pena de morte como uma pena desumana e injusta. O hashtag #Boycottbali apareceu com força nas redes sociais, sendo rebatido por críticas à hipocrisia por não boicotarem também outros 19 países que aplicam a pena capital.
O assunto é delicado e, por essa mesma razão, evito falar do tema com os indonésios que conheço. Mas para aqueles que tenho mais intimidade e confiança perguntei o que achavam, e a opinião se divide. Claramente muitos indonésios não são a favor da pena de morte. A religião também fala alto neste momento e ouvi de uma amiga que “um homem não pode ter o direito de tirar a vida de outro, nem pela lei! Não somos Allah para decidir e julgar” – um claro consenso com o pensamento de cristãos e outros religiosos, deixando claro que o muçulmano não tem sede de sangue, como erroneamente se acredita no ocidente.
Porém, outros questionam o porquê de tanto frisson e revolta com a decisão do governo indonésio, quando outras nações também aplicam a pena de morte. Os vizinhos Cingapura e Malásia, por exemplo, também condenam à morte os envolvidos em tráfico de drogas.
Assim também alguns australianos publicavam abertamente em suas redes sociais comentários criticando a superproteção e sobrevalorização da vida dos paisanos condenados. Para eles, o tráfico de drogas é SIM um crime de homicídio, a longo prazo, contra a sociedade. Oito quilos de heroína carregados pela dupla australiana do Bali 9, seis quilos de cocaína carregados por Rodrigo Goularte e os outros treze de Marco Archer seriam suficientes para indiretamente matar diversos jovens, viciados ou atravessadores, e é isso o que muitos defendem.
Enfim, o assunto é polêmico e há muito a ser discutido entre países, organizações de direitos humanos e afins. O fato é que a lei está clara e aberta para todos os cidadãos que pisam solo indonésio. E para estes homens, não valeu a pena tomar o risco.
18 Comments
Bem vinda ao time Gisele! Abraços. 🙂
Obrigada Camila! É uma honra! Abraço.
Lindona!! Que belo texto…belas palavras…refletem a grande professora que o Brasil perdeu… Que vc seja muito feliz!! Um beijo com saudades!! E continue com muitos outros textos…parabéns!!
Obrigada Marcela! Grandes professoras são vocês aí no Brasil, lutando pela educação do nosso povo! Um beijo enorme!
Um tema interessante na visão de uma pessoa que respeita a maneira de ser e de estar de um povo. Parabéns pela maneira como tratas o “problema”: sem necessitar usar um ” discurso musculado”. Parabéns mesmo!!!
Obrigada Flávia! Tentei ao máximo esclarecer sem assustar, já que o assunto é delicado. Um abraço!
Parabéns Gi, ótimo texto. Lembro-me que estávamos conversando e vc falou exatamente sobre esse “recado” no aeroporto. Bjs
Obrigada Lenita! Aos poucos vou recordando dos papos e curiosidades dos amigos e publicando por aqui, continue acompanhando…beijoka!
Oi querida, bem vinda! também morei na Indonesia e convivi com os meninos no corredor da morte há alguns anos atrás! Até escrevi aqui no blog sobre isso. Parabens por abordar um assunto tao polemico
bjs
Olá Fabiana! Imagino que pra você tenha sido uma experiência marcante e, obviamente a morte de ambos tem um significado ainda mais forte para você. É uma pena o que aconteceu com eles, não somente pela pena de morte, mas pelo caminho tortuoso que escolheram e que muitos de nossos jovens no Brasil também seguem. Obrigada, Abraço!
Perfeita escrita Gi, mas de vc não poderia se esperar outra coisa! Parabéns amiga! Saudades!
Oi Érica! Saudades de você também! Obrigada e continue acompanhando o blog! As meninas tem textos ótimos, vale a pena! beijo
Oi Gisele, seja muito bem vinda! E parabéns pelo texto 🙂
Obrigada Carla! Se não fosse pelo seu blog, por ter conhecido seus textos, este aqui talvez nunca teria saído à luz! Obrigada de coração 😉
Parabéns Gi pelo ótimo texto, super esclarecedor!! Sorte por este vidão afora!!
Obrigada, Najla! Abraço
Olá pessoal, tudo bom?!
Minha mãe e eu temos muitas curiosidades sobre a Indonésia.
Se puderem nos contar mais, ficaremos gratos. 🙂
l.guilherme.ribeiro@bol.com.br
Olá pessoal, tudo bom?!
Minha mãe e eu temos muitas curiosidades sobre a Indonésia.
Se puderem nos contar mais, ficaremos gratos. 🙂