O ano era 2003, e eu começava a minha primeira faculdade na Suécia. Na sala de aula éramos 106 alunos e eu a única imigrante da turma. Lembro dos meus colegas de classe me tratando como algo quase exótico. Sim, porque há 16 anos a Suécia era um país de suecos e para suecos. Hoje, a realidade é outra. De cada 10 pessoas que circulam nas ruas da Suécia, 3 têm origem imigrante.
Com a imigração acelerando, cresce também a necessidade de integração. E a integração é, diga-se de passagem, a maior barreira que o imigrante encontra por aqui. Eu acredito que a dificuldade de integrar novas pessoas não é algo especifico da Suécia, mas uma dificuldade que existe em todos os países, até mesmo no Brasil.
Mas, em se tratando da Suécia, pesquisas feitas apontam que este é o país europeu que tem mais dificuldade de integrar imigrantes, especialmente no mercado de trabalho. Enquanto 89,9 % dos suecos estão inseridos no mercado de trabalho, apenas 62,1% dos imigrantes se encontram na mesma situação. Para um país que prega a igualdade, este resultado é um sinal de que a política de integração por aqui precisa se aprimorar.
São vários os aspectos que contribuem para que um imigrante se sinta integrado em outro país. Entre eles estão: a capacidade em aprender a língua do país em questão; conhecimentos de como a sociedade funciona – incluindo aí os valores sociais e culturais da mesma, interação social e inclusão no mercado de trabalho.
Como psicóloga e imigrante vejo que um aspecto essencial da integração costuma ser deixado de lado. Estou falando do aspecto emocional. Ele é tão importante quanto os demais, já que com o psicológico abalado a integração se torna ainda mais difícil. Eu me atrevo até a dizer que o imigrante que não está bem psicologicamente provavelmente não conseguirá ser integrar. Já recebi em meu consultório muitos imigrantes que por não conseguirem aprender o idioma e não conseguirem um emprego não se sentem uma parte da sociedade, entram em depressão e se isolam. O isolamento aumenta a depressão e o resultado é: a integração não acontece.
No caso específico da Suécia, mesmo com os resultados mostrando um certo fracasso na política de integração, vejo que se há um esforço da parte do Estado para integrar os imigrantes à sociedade. Abaixo podemos ver o que se tem feito com resultados positivos*:
– A possibilidade de aprender o idioma: O imigrante que chega aqui de forma legal tem direito à aulas de sueco totalmente gratuitas como uma preparação para a entrada no mercado de trabalho e na sociedade como um todo. Se sabendo o sueco já é difícil, sem o idioma é ainda mais complicado. Ainda sobre o idioma, as bibliotecas oferecem os “språkcafe” que é uma possiblidade de treinar o sueco com outros imigrantes no mesmo processo.
– Ajuda para se colocar no mercado de trabalho: o Arbetsförmedling que funciona como uma agência de empregos estatal oferece gratuitamente tradução de diplomas para o sueco como também ajuda para escrever o currículo de uma forma que o mesmo fique atrativo para o empregador. O Arbetsförmedling também disponibiliza serviços de coaching para quem está com dificuldade de se colocar no mercado ou está querendo recomeçar a vida por aqui com uma nova profissão;
– Fazer novos amigos: os suecos são conhecidos por serem pessoas fechadas que não fazem amizades fácil e isso, é claro, influencia na integração. Por isso, as prefeituras ao redor do país iniciaram o projeto Kompis Sverige (Amigos suecos) onde suecos se cadastram de forma voluntária para encontrar um imigrante e sair para um bom bate-papo, ajudar o mesmo a treinar o sueco e aprender mais os códigos culturais da Suécia.
– Escolas e creches para crianças: Você chegando à Suécia como imigrante, os seus filhos terão acesso as escolas e creches, mesmo não dominando o idioma local. Escolas e creches em todo o país têm programas para receber crianças que falam outro idioma.
Existem, é claro, outros programas voltados à integração, mas eu resolvi citar os mais importantes. Como profissional, acredito que a Suécia pode fazer mais pela integração no que se refere a parte emocional da questão. Por exemplo: oferecendo mais terapias gratuitas ou coaching para imigrantes com dificuldades de adaptação.
Procurando por psicólogas brasileiras pelo mundo?
Mas como a moeda tem dois lados, é importante também discutir o que nós imigrantes podemos e precisamos fazer para nos integrarmos ao País. Vejo que muitos imigrantes acham que a responsabilidade da integração é apenas dos suecos e com o tempo se frustram por não conseguirem se adaptar à sociedade como um todo. A integração é “uma faca de dois gumes”, onde os dois lados necessitam se esforçar para que o resultado seja positivo. Nós imigrantes, também necessitamos fazer a nossa parte. Portanto, deixo aqui algumas dicas que aprendi aos longos dos anos:
– Aprenda o idioma, sem ele você não vai chegar longe: O idioma vai abrir as portas do mercado do trabalho como também vai te ajudar a fazer amigos e entender como os suecos funcionam;
– Se cadastre em programas e cursos que vão te ajudar a se integrar: O kompis Sverige é uma boa opção e tem em todas as prefeituras ao redor da Suécia;
– Não adote uma atitude passiva: Não culpe os suecos pelas dificuldades que possam surgir. Recomeçar é difícil para todos;
– Não se relacione somente com brasileiros ou estrangeiros;
– Seja curioso e tenha a mente aberta em relação aos suecos: Tente o contato. O sueco, é no geral, aberto a aprender sobre outras culturas, mesmo que ele não vá adota-las para si;
– Evite pré-julgamentos e frases do tipo: “mas no Brasil eu faço assim” ou “eu sou brasileira, não sou sueca”: Devemos sempre nos lembrar que o que é certo no Brasil, não precisa ser certo na Suécia.
Para escrever este artigo entrevistei algumas mulheres brasileiras que já vivem aqui há tempos e perguntei se elas se sentiam integradas à sociedade sueca. 70% das entrevistadas responderam que sim. O motivo? Elas dominam o idioma, trabalham e têm uma vida social ativa, tanto com suecos como com outros imigrantes. A maioria das entrevistadas também apontam que o fato de estarem com um parceiro sueco e de terem filhos contribuíram para que a integração ocorresse mais rápido. Já as 30% que ainda não se sentem integradas apontam a dificuldade em aprender o idioma e o desemprego como os vilões da integração. Muitas mencionaram também a dificuldade emocional que se tem para desapegar do Brasil.
*Ressaltando que o que menciono no texto está relacionado ao imigrante que chega aqui de forma legal. Para os refugiados, a política de integração é mais ampla e não cabe nesta reportagem.
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