Neste mês, Junho de 2017, faz 2 anos que deixei o Brasil com 2 filhos, poucas malas, e muita Fé, Coragem e Saudades. Eu nunca tinha ficado mais de 6 meses longe do Brasil, e em 2015 depois de muitas considerações, decidimos que tinha chegado a hora de viver esta aventura por tempo indeterminado. Claro que quando se embarca numa aventura destas com filhos os cuidados são redobrados, e as consequências também.
Neste período, meio ano na Irlanda e 1 ano e meio na Escócia, muitas águas rolaram, literalmente eu diria, vivendo em 2 países onde o Sol não é o astro-rei. E o que eu aprendi ?
Chorar emagrece
Espero que sim, porque chorei muito nos 3 meses que passei no Brasil desapegando de tudo enquanto meu marido já estava trabalhando na Irlanda, e nestes 2 anos de Europa. E não foi choro de alegria não, foi choro de dúvida, de medo, de saudade.
Digo que aprendi até a chorar em Inglês. A primeira vez foi no primeiro dia de escola do meu filho menor na Irlanda. Eu morri de dó de deixá-lo na sala de aula sem entender uma palavra do que estavam falando. Eu senti como se o estivesse abandonando, e não consegui segurar as lágrimas quando o diretor veio falar comigo. No final do dia ele saiu da escola sorrindo. E isso foi só o começo!
Rolaram muitas lágrimas de saudade da família, e muitas outras em cada encontro e despedida quando voltei ao Brasil, ou quando recebi alguma visita do Brasil aqui. Sem falar no desespero acompanhando a doença do meu pai à distância, e na tristeza no final tendo que correr para abraçar minha mãe quando ele faleceu. Sem palavras para descrever.
Perdi alguns quilos nestes 2 anos. Mas infelizmente acho que já estou recuperando.
Foi melhor do que eu esperava
Claro que todo este rio de lágrimas que eu descrevi acima não foram exagero. Medo de mudança eu acho que todo mundo tem um pouco. Mudar de país por tempo indeterminado, com 2 filhos, e com mais de 40 anos não é moleza não. Mas eu acho que o Paulo Coelho tem razão : quando você quer muito uma coisa o universo conspira a seu favor. Li o livro ‘O Alquimista’ quando estava prestes a realizar o meu grande sonho de viajar sozinha para a Inglaterra muito tempo atrás, e já pude constatar várias vezes que ele tem razão.
Decidimos nos mudar 1 ano antes como eu conto aqui. Meu marido, que tem cidadania espanhola, começou a pesquisar as oportunidades no mercado de TI nos EUA e na Europa, viu que seria mais fácil na Europa, começou a mandar CV e em pouco tempo apareceu uma boa oportunidade na Irlanda. Nunca tínhamos viajado para a Irlanda, nem conhecíamos ninguém que morasse lá, mas com as informações que tínhamos decidimos que valia a pena arriscar.
Enquanto meu marido já estava trabalhando na Irlanda, vendi ou doei tudo que era móvel, coloquei o imóvel para alugar, e guardei somente alguns itens de valor emocional e fotos. Trouxemos poucos itens pessoais, alugamos casa mobiliada, e começamos tudo de novo.
Primeiro sinal de que o universo estava do nosso lado : Galway, Irlanda. País lindo, povo bom. Sou muito grata a este país por ter nos recebido tão bem, e ter nos fortalecido para continuar nossa jornada.
Depois de poucos meses na Irlanda, meu marido recebeu outras propostas de emprego. De novo, dúvidas, medo, e decidimos nos mudar para outro país que não conhecíamos : Glasgow, Escócia. Mais uma vez, começar de novo : casa, trabalho, escola, amigos.
Mais uma vez, muita sorte na escolha. Glasgow é uma cidade incrível, com muita infraestrutura e qualidade de vida, a Escócia é um país lindíssimo, e o povo escocês é muito querido e nos recebeu muito bem. Os meninos estão bem adaptados, fizemos bons amigos, e estamos adorando conhecer a Escócia.
Vivendo, e aprendendo
Outro dia enquanto estava lendo um post da colunista Anelise Kaminski sobre o encontro dela com um xenófobo, eu pensei em quanto se aprende morando fora do seu país.
O horizonte se expande infinitamente com o intercâmbio cultural diário convivendo com pessoas de nacionalidades que até então você nem tinha ouvido falar. Na escola do meu filho de 9 anos tem crianças de mais de 15 nacionalidades diferentes, e ele que quando morava no Brasil só falava em viajar para os EUA, hoje está em dúvida se quando crescer vai morar na Nova Zelândia, Islândia ou no Canadá.
Mas além de toda esta bagagem cultural, a bagagem emocional também é muito rica com tudo que se aprende sobre respeito, solidariedade, tolerância, superação. Ser estrangeiro é não pertencer, não fazer parte, não ser natural do lugar onde você vive. Essa condição te lembra o tempo todo que você é imigrante, e que por isso em muitas situações vai ser tratado de forma diferente. Por exemplo, antes de 3 anos de residência você não pode fazer nenhum financiamento e tem que implorar por um cartão de crédito, e aqui na Escócia tem que pagar integralmente e à vista pelo College ou Universidade do seu filho, enquanto os escoceses têm de graça. A carteira de motorista brasileira é válida por um ano, e depois disso você tem que tirar uma nova carteira de motorista como se você nunca tivesse dirigido, e pagar um valor de seguro altíssimo ao comprar um carro. Você também é identificado quando abre a boca, porque se você não fala errado, você tem o sotaque que te entrega.
Apesar do povo escocês ser um povo muito tolerante e simpático com imigrantes, aqui também há pessoas que votaram pela saída do Reino Unido da União Européia por causa dos imigrantes, e nada impede que você cruze uma destas pessoas a qualquer momento. Neste momento é que você vai precisar usar aquela bagagem emocional para não querer voltar pro Brasil no dia seguinte.
Fazer escolhas não é fácil porque tem que perder alguma coisa pra ganhar outra, não dá pra ter tudo. Mas é um privilégio poder escolher. Agradeço a Deus a oportunidade de estar compartilhando esta experiência com meu marido e meus filhos, e espero que continue superando minhas expectativas, me ensinando muita coisa boa, e me fazendo chorar menos.
6 Comments
Narister!!! Lindo texto!! Me identifiquei bastante! Estou morando em Aberdeen há 1 ano e meio, com meu marido e filha de 2 anos e 6 meses , e tenho 40 anos. Concordo totalmente contigo: aprendemos muito em todos os níveis (cultural, social, profissional, pessoal, espiritual…) e muitas vezes isso se acompanha de uma certa dor, pois tivemos que abrir mão de muitas coisas para receber tal aprendizado…. e tanto sentimento transborda em lágrimas… obrigada por compartilhar!!! Beijos
Oi Silvia ! Obrigada pelo comentário. Só vivendo esta experiência pra saber a dor e a delícia de ser o que é, né ? (como diz o nosso poeta Caetano Veloso). Grande beijo.
Uau que texto sensacional!!!! Muito feliz em te conhecer, muito obrigada por compartilhar algo tão pessoal, especial e valioso! Aprendemos sempre muito também com outras pessoas, especialmente com pessoas sensíveis como tu és! Parabéns pelo sucesso na jornada, e que venham muitos mais ótimas surpresas, lindos lugares, experiências incríveis, pois vocês merecem! ??❤️
Obrigada, Ingrid. Grande beijo.
Parabéns, Narister. Especialmente pela coragem e pela resiliência. Sou enfermeira, tenho 44 anos, professora em uma universidade federal, moro em Minas Gerais. Minha filha completa 15 anos e irá de intercâmbio por 2 meses para o Reino Unido. Espero um dia também realizar o sonho de passar uns tempos por aí. A Escócia seria meu país de escolha. Mas antes preciso quebrar a barreira do idioma, estudar mais, falar melhor. Boa sorte para vocês aí e obrigada pelo relato!
Olá Márcia. Que bom que sua filha vai ter a oportunidade de fazer este intercâmbio, é uma experiência inesquecível e muito enriquecedora. Espero que ela goste e aproveite bastante. Quanto a você, eu acho que a barreira do idioma é o menor dos problemas porque independente do nível de Inglês que você tem no Brasil quando chega aqui é como se fosse alfabetizado de novo. Principalmente na Escócia, o sotaque é muito diferente e tem que aprender no dia-a-dia mesmo. Dá uma lida no meu post sobre o sotaque de Glasgow (https://brasileiraspelomundo.com/o-famoso-sotaque-de-glasgow-211848462). Estou aqui há um ano e meio, e não consigo entender tudo que eles falam. Boa sorte para você também !