Desafios de uma mãe em terras estrangeiras.
Ah, a maternidade! Tornei-me mãe em fevereiro de 2016, e até agora estou aprendendo a lidar com tudo o que envolve o significado de “ser mãe”. Na verdade, ser mãe fez com que eu me sentisse adulta de verdade. Antes, a vida podia ser uma brincadeira se eu quisesse, e agora, parece que o jogo começou para valer. Existe um pequeno ser humano que depende de mim para absolutamente TUDO. E isso mudou, sim, a forma como meu cérebro funciona, mudou o que sinto, como me alimento, o que visto, o que sou. Mudou a perspectiva da minha vida.
Quando mudei de país pela primeira vez em 2014, cheguei em Londres com a sensação de estar pousando em outro planeta, tendo de me adaptar ao clima, às pessoas, ao idioma, à ausência de amigos, enfim, um mundo novo a se descobrir. A maternidade é a mesma coisa… Quando se tem o primeiro filho temos de nos adaptar à rotina de cuidados com o bebê, aliado às expectativas da família, às mudanças do nosso corpo, à privação de sono, à culpa constante, ao ser humano novinho em folha que está ali: pequeno, frágil e difícil de ser decifrado.
Ser mãe pela primeira vez estando fora do Brasil é difícil. A maternidade em si já nos deixa fragilizadas e morando fora esta fragilidade aumenta. Quando se está longe da família e amigos, o sentimento às vezes é de estar parada no tempo. Sente-se falta do calor de pessoas queridas, sente-se falta do toque.
Leia também: tudo que você precisa saber para morar em Portugal
Tem um sábio provérbio africano que diz: “É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança.” Mas aí você mora fora do Brasil, longe de toda família e amigos. Como faz? Senta e chora? Olha, posso dizer que a minha vontade, no início, foi esta, sim. A cabeça da recente mãe fica à procura dessa “tribo”, de alguém que pegue na mão e diga: “vai ficar tudo bem”. Apoio e ajuda é tudo o que uma nova mãe precisa, e só o pai, coitado (novato na função), não consegue dar conta do recado.
Meu filho nasceu em Londres num dia que fazia muito frio, e as enfermeiras do hospital insistiam para que eu fosse andar no parque enquanto estava começando a ter as contrações. Eu, particularmente, gosto do approaching mais natural da gravidez, mas gente… com 3 cm de dilatação, ir tomar café no parque? De que planeta essas pessoas são? Só sentia medo, medo e medo. Éramos eu e meu marido ali. Mais ninguém da família. Não teriam lembrancinhas, foto com a família atrás do vidro, rostinho do bebê aparecendo no telão da sala de espera, plaquinha na porta do quarto, nada disso. Ele nasceu poucas horas depois da enfermeira ter me sugerido o rolê no parque. Ali estavam eu, meu marido, uma médica (luxo que paguei à parte!) e uma enfermeira. E assim veio ao mundo nosso primeiro filho. Sem badalação, mas também sem estar perto do amor e carinho da família e amigos.
Quando você vai para casa e tem um bebê recém-nascido, seu “sistema mãe” de alerta fica ligado 24 horas por dia, de domingo a domingo, e isso é exaustivo. Toda nova mãe precisa de ajuda. E quando se está longe de todos é preciso dar um jeito na situação. No início, quis bancar a mulher maravilha, que dá conta de tudo. Eu pensava: “não deve ser assim tão difícil cuidar de um bebê, afinal, desde que mundo é mundo, isso acontece, é algo natural, não tem mistério…” Ha-ha-ha! Olha aí a vida me surpreendendo e dizendo que estou errada. Toda mãe precisa SIM de ajuda, seja física, emocional ou psíquica. Cadê a tribo para te ajudar com a criança?
Mudamos para Portugal com o nosso filho de 4 meses nos braços. Sem conhecer ninguém neste novo país, éramos só nós: eu, meu marido, o bebê e nossa vira-latas. O isolamento de mudar-se para um novo país adicionado ao isolamento causado pela maternidade me empurrou para dentro de uma bolha, que só agora, quase 8 meses depois, estou sendo capaz de começar a sair. Dentro desta bolha se vê um mundo real muito distante acontecendo lá fora, enquanto você está dentro tendo que se adaptar num ritmo que muitas vezes é mais rápido do que o que seu coração consegue assimilar.
Meu filho está crescendo vendo os avós pelo Skype, de vez em quando. Não tem brincadeira com o vovô e mimos com a vovó no dia-a-dia. Ele está crescendo longe dos filhos dos meus amigos. Está longe dos tios e tias que tanto o amam. Isto pesa e algumas vezes até machuca. Mas tenho que pensar no bem maior a longo prazo, e que o amor e carinho podem e devem ser construídos apesar da distância.
Se você teve seu primeiro filho e está morando fora, busque apoio. Grupos de mães, rodas de brincadeira (play groups), comunidades no Facebook, brasileiras na sua cidade… Enfim, saia da bolha. Isso é importante para você e seu bebê. Não tenha medo e nem vergonha de pedir ajuda e tentar novas amizades. Acredito que o ser humano demonstra seu lado mais puro quando se dedica e se abre para conhecer novas pessoas e estabelecer novas amizades.
Ainda sobre a tribo que deve educar a criança… Você é parte dessa tribo? Pergunto porque quando eu não tinha filhos, eu achava que cada criança era única e exclusivamente responsabilidade dos pais. Depois de ser mãe, percebi que isso não é verdade. É também sua responsabilidade mostrar a esse pequeno ser humano, que está em busca de descobrir o que raios é esse mundo, que nossa sociedade é amigável. Que não só o papai e a mamãe são do bem. Que existem também outras pessoas do bem e que assim o mundo é muito melhor.
Hoje se vejo uma criança chorando, ofereço ajuda aos pais, ofereço um brinquedo à criança. Não mais torço o nariz e coloco meus fones de ouvido. As crianças são responsabilidade de todos. Apenas por um mundo melhor, e pela continuidade da nossa tribo no futuro.
17 Comments
Amei o seu texto! ?
Fico feliz que gostou, Ana! Obrigada pelo carinho em comentar 😉
Lindo depoimento ! Fiquei emocionada. Estou indo morar com marido e 2 filhas adolescentes em Portugal ano que vem.
Obrigada Rosana! Venha com o coração aberto e mente tranquila que tudo vai dar certo! Beijos, Ana
Olá, Rosana! Tudo bem? Posso te adicionar em alguma rede social? Fico curiosa para saber como será a vida dessas pessoas que mudam de país! ?
Posso chorar?
Parabéns pelo texto e pelo desempenho na função mais desafiadora e recompensadora do mundo!
Beijocas
Obrigada, Fabi! Parabens pra voce que eh mae em dobro e ainda excelente profissional! Beijos e obrigada pelo carinho de sempre 🙂
Muito bom o artigo, só uma observação, essa questão da enfermeira pedir pra você ir andar no parque é um procedimento correto (se eu entendi direito quando as contrações começaram, ela recomendou que você fosse dar um passeio lá, certo?) porque acelera a dilatação. Aqui no Brasil, em alguns lugares que defendem o parto normal, esse procedimento é padrão. O errado é justamente aquilo que vemos com mais frequência: quando começam as contrações, a mulher deita e a dilatação acaba demorando mais e todo aquele processo (desgastante e dolorido) demora muito mais. Inclusive, esses dias, vários videos e matérias sobrem grávidas dançando para acelerar a dilatação. E tudo com o apoio da doula, dá uma olhadinha:
http://jc.ne10.uol.com.br/blogs/oviral/2017/03/10/em-maternidade-gravida-danca-para-ajudar-em-seu-trabalho-de-parto/
http://delas.ig.com.br/filhos/2017-05-16/trabalho-de-parto-danca.html
Ola Helenna, super obrigada pelo comentário! Adorei os links que compartilhou! Vc está certa, a orientação de andar no parque é correta, nada de ficar deitada! Porém meu trabalho de parto foi muito rápido (não sei se ajudou mas comi muita tâmara e chá de folha de framboesa, justamente pra isso :)) E em pouco tempo já atingi os 10cm, acho que nosso corpo é mestre em sentir o que funciona para nós, e naquele momento, soube que eu não deveria ir andar no parque… Obrigada por enriquecer o texto com seu comentário! Beijos! 🙂
Parabéns pelo texto Analu! Também tive o meu pequeno há 6 meses aqui em Londres e sinto exatamente tudo que você escreveu… Bom saber que não estamos sozinhas nessa jornada! Muito obrigada por dividir isso com a gente!
Amei seu texto Analu, moro “sozinha” com o meu marido e meu bebe de 2 meses no Rio e estamos nos mudando pra Portugal. Me questiono muito sobre a falta de relacionamento no dia a dia do meu filho com nossas família, mas acredito que além dos laços firmados a distancia acho que esse é um novo perfil de uma nova geração que nós estamos construindo! Assim que chegarmos em Lisboa quero te conhecer. Eu e meu marido estamos AMANDO seu blog!
Oi Clarissa, obrigada por seu comentário! Que bom que estão gostando dos textos 🙂 Eu tb acredito que essa nova geração vai se adaptar às distâncias muito melhor do que nós. Inclusive, meu texto que será publicado em Setembro fala um pouco sobre isso, se puder quero sua opinião. Quando chegar pros lados de cá me manda uma mensagem e tomamos um café. Beijos, Ana
Olá, Analu! ADOREI seu ponto de vista e me identifiquei muito mesmo com ele! Saí do Brasil para a França há 6 anos e hoje estou aqui entre Sintra e Cascais também com meu bebé de 18 meses tentando encontrar respostas para a pergunta que não quer calar, “Será que é assim tão difícil pra todo mundo?!?”. Aliás, que não “queria” calar, porque agora depois do seu texto, exatamente “na medida” para mim, dou-me conta que sim, é difícil pra todo mundo que encara esse início de vida de mãe sem colinho, sem tribo, sem rede nenhuma de apoio, à parte o marido que, coitado, rebola para dar conta do recado! Eu sou mãe fulltime e além de respostas existenciais, estou também à procura de uns playgroups ou algo assim na região… se você conheceu algum na sua “empreitada” e puder compartilhar comigo, agradeço um milhão de vezes!!!! xx Carol
Oi Carol, fico super feliz com seu comentário e mais ainda que tenha se identificado com o texto que escrevi. Quero te mandar um email, mas vi agora que pode ser um typo… é @ymail ou @gmail? Vamos nos falar pra eu te passar os playgroups da região. beijos, Analu
Obrigada por responder!! Eu não encontrei um email de contato seu aqui no site senão te mandava um, o meu é mesmo o @ymail!!! Beijinhos, Carol
Nossa to chorando aqui! Estou passando por isso,vim morar no Japão com meu marido e descobri que estou grávida do meu primeiro filho, o sentimento é o mesmo! A falta que a tribo faz.
Oi Ester, nossa como entendo seu sentimento. É uma fase tão difícil, precisamos de todo o suporte e carinho do mundo. Um abraço bem grande e lembre-se que isso tudo te fortalece, acredite. Beijos, Ana