Hoje o blog entrevista a Ieda Gomes, executiva na área de energia e gás, que já foi presidente da BP Brasil e atualmente mora na Inglaterra.
BPM – Fale sobre a sua trajetória, de onde é no Brasil, quanto tempo mora na Inglaterra, se já morou em outros países, sua área profissional…
Ieda – Eu nasci em Salvador, Bahia, onde me graduei em Engenharia Química em 1977; logo em seguida fui para a Suíça fazer pós-graduação em Engenharia Ambiental. Minha dissertação sobre tratamento de resíduos sólidos e produção de biogás foram decisivos para eu conseguir ser contratada pela Companhia de Gás de São Paulo (Comgás), que estava desenvolvendo um trabalho de produção e distribuição de gás de aterros sanitários. Trabalhei na Comgás por 19 anos, tendo sido presidente da empresa de 1995 até 1998. Fui convidada pela BP para coordenar a área regulatória do negócio de Gas & Power e ocupei diversos outros cargos, de Vice Presidente de Marketing da BP Solar, presidente da BP Brasil e Vice Presidente de New Ventures. Em 2001, ainda no Brasil recebi o prêmio Veuve Clicquot Business Woman of the Year. Em 2002 fui transferida para a Inglaterra, onde resido desde então. Após quase 14 anos na BP decidi iniciar uma nova fase, desenvolvendo uma portfolio career, combinando participação em conselhos de administração de empresas internacionais, consultoria e atuação em entidades internacionais na área de energia e gás natural. Faço também parte do Conselho da Brazilian Chamber of Commerce in Great Britain e no ano passado fui co-fundadora da WILL Latam, um ONG voltada para o desenvolvimento de lideranças femininas. Embora somente tenha residido em 3 países ( Brasil, Suíça e Inglaterra) tenho viajado muito, já estive em mais de 80 países, à trabalho e por lazer.
BPM – Você vem tendo cargos de diretoria ao longo da sua carreira, como foi o processo até chegar na posição que se encontra no momento, fora do Brasil?
Ieda – Eu sempre fui uma pessoa determinada e perseverante e sempre busquei conhecer bem o setor, me tornando uma expert em gás natural e energia. Além disso sou uma pessoa que tem um amplo network externo e procuro participar e palestrar em eventos relevantes para a indústria. É um processo que exige muito trabalho, motivação e disciplina, acredito que esses foram fatores extremamente importantes para chegar à posição em que cheguei, assim como um interesse muito grande em sempre estar aprendendo.
BPM – E como é trabalhar em uma área meramente “masculina”, ainda mais com uma posição de chefia, como a sua? Sendo mulher, você nota alguma diferença na hora de fechar algum contrato ou é irrelevante?
Ieda – Sendo engenheira por formação, sempre convivi bem em ambientes masculinos e tenho também confiança própria, com a qual não nasci, mas fui aperfeiçoando ao longo do tempo. Sem dúvidas ainda existe um certo clube “masculino” onde subir ao topo se torna mais difícil para uma mulher, seja por barreiras reais ou porque as mulheres são mais tímidas para se pronunciar e navegar no ambiente rarefeito do topo. Mas, o importante é entender e não se frustrar ou desesperar, o caminho é sempre para a frente, mesmo que às vezes se tenha de optar por paradas estratégicas ou recuos táticos – com integridade, que entendo ser um requisito essencial na minha vida e carreira.
BPM – Você sente que as mulheres tem realmente menos chance de sucesso na carreira, especialmente “masculinas” como lemos nas notícias ou é apenas uma questão de mídia?
Ieda – Acredito que mulheres motivadas, inteligentes e que trabalhem duro têm grandes chances de sucesso, particularmente nos dias de hoje, onde há uma maior sensibilidade por parte das empresas para promover o conceito de diversidade e igualdade de gênero. Devemos ainda refletir que chega uma hora crucial na carreira da mulher, quando ela quer ter filhos e fica difícil manter o momento ascendente se a mesma não consegue conciliar as necessidades da carreira e da família sem uma rede de apoio, incluindo creches, escolas e a disponibilidade de tempo para acompanhar o desenvolvimento das crianças. No caso dos homens, a sociedade aceita que “naturalmente” eles vão continuar a trabalhar e ascender profissionalmente após o nascimento dos fihos, no caso das mulheres, elas têm de equilibrar carreira com família de uma maneira mais direta e imediata. Posso ainda dizer que em minha carreira tive alguns chefes homens que acreditaram no meu potencial e me convidaram para cargos de liderança.
BPM – E que dicas daria a uma mulher que queira entrar para a área química, trabalhando com energia, fora do Brasil?
Ieda – Estudar muito, ser uma expert no assunto, participar de eventos, dar palestras, escrever artigos e trabalhos técnicos. Eu vejo muitas pessoas que almejam crescer em suas carreiras, mas ficam o tempo todo no escritório, em frente ao computador e não procuram se expor ao mundo e ao ambiente externo. Falar inglês é fundamental, particularmente se a pessoa almeja uma carreira internacional. Se possível um curso de pós-graduação no exterior, para conhecer outras culturas e a economia de outros países. Ser engenheira me ajudou a ser objetiva, o que é muito importante quando se dispõe de tempo escasso – eu brinco sempre que neste mundo tudo pode ser explicado por uma equação, exceto a existência de Deus.
BPM – Você tem filhos? Se sim, como é a sua rotina, como executiva e mãe, em uma cultura tão diferente da brasileira, na maioria das vezes, sem ajuda em casa?
Ieda – Eu tenho um filho, mas ele vai fazer 28 anos, formou-se na Inglaterra, em Computer Sciences e mora nos EUA desde que se formou em 2009. Eu sempre trabalhei; quando meu filho nasceu eu viajava menos, ele foi para uma creche aos 4 meses, mas como a creche era perto do escritório eu ia lá todos os dias na hora do almoço, assim consegui amamentá-lo até os 9 meses, o que foi um recorde. Quando fui para a Inglaterra meu filho era pré-adolescente, meu marido viajava menos e meus dois enteados passavam parte da semana conosco, além dos gatos, sempre presentes em minha vida. Quando eu viajava, sempre ligava para ele, ia nas reuniões da escola e pegava no pé para ele estudar. Meu filho me diz que foi bom, porque ele se tornou independente, ele também se entrosou bem com a cultura inglesa, e agora com a americana. A rotina no exterior é puxada, porque as pessoas têm de se desdobrar entre trabalho e cuidar da casa, mas no exterior as coisas são mais descomplicadas e funcionam e hoje a internet é um grande aliado no pagamento de contas, gerenciamento de tarefas à distância.
BPM – Você acha que se estivesse no Brasil teria as mesmas oportunidades na carreira?
Ieda – Uma boa parte da minha carreira como executiva teve início no Brasil, pois fui presidente da Comgas e da BP Brasil. Mas quando vim para a Inglaterra decidi que não queria ficar marcada como uma brasileira e que portanto somente entende de Brasil, procurei me diversificar e me tornei vice presidente de New Ventures para a Índia, depois incluí Ásia do Sul, Oriente Médio, em seguida África. Trabalhei em projetos e oportunidades na Índia, Paquistão, Bangladesh, Omã, Jordânia, Emirados, Gana, Egito, etc.
BPM – Deixe um recado para as brasileiras leitoras do Brasileiras Pelo Mundo, que acompanham o blog, muitas ainda apenas sonham em sair do Brasil e ter uma carreira de sucesso.
Ieda – Se você quiser ser ter uma carreira de sucesso no exterior, procure desde cedo aprender e ser fluente em uma língua estrangeira e colocar-se em empresas estrangeiras com filiais no Brasil. Se possível, faça cursos no exterior, mesmo que de pouca duração, desenvolva seu network, insira seu perfil em websites como o LinkedIn, participe de conferências e seja uma expert na sua área profissional. Peça conselhos e dicas de pessoas, homens e mulheres, que têm uma carreira de sucesso, leia muito e seja uma pessoa atualizada e antenada. Estabeleça metas claras e trabalhe para cumprí-las. E tenha auto-confiança combinada com muita disciplina. Segundo o empresário John Rohn, disciplina é a ponte entre metas e realizações.