Estou de volta pro meu aconchego
Trazendo na mala bastante saudade
Querendo
Um sorriso sincero, um abraço,
Para aliviar meu cansaço
E toda essa minha vontade
Este mês o artigo começa e termina musical, que é para dar o tom… Reconheceram a canção e intérprete? Continuem comigo que lá no final tem a revelação desse momento Qual é a música, Pablo!
Voltar… eis um verbo excluído do vocabulário de muitos imigrantes que decidiram deixar o Brasil para trás. Não importa em que contexto, o retorno é muitas vezes visto como algo fora de cogitação, mesmo que seja apenas para passar alguns dias de férias. Mesmo de longe, a gente acompanha o que se passa no nosso país e diante de tanto caos político, econômico e, principalmente, social, as comparações com os países de primeiro mundo onde vivemos são inevitáveis. Só que deixando essas questões de lado, acredito que retornar é preciso. Pessoalmente, voltar é uma ação pela qual eu aguardava ansiosamente e que me trouxe muita alegria e momentos de felicidade.
Depois de 2 anos vivendo no Canadá, finalmente encontrei uma oportunidade de rever minha cidade, minha família e meus amigos. Em função do processo de imigração e do início da minha vida profissional em Québec, precisei esperar todo esse tempo. Agora a sensação é de que passou muito rápido, mas enquanto a gente se encontra naquele momento de espera e muita incerteza, a percepção é bem diferente. Na fase em que não somos nem turistas nem residentes permanentes, é comum nos pegarmos pensando em como a vida era boa (mesmo quando nem era exatamente o caso). Nada que viver um dia de cada vez não mude nossos conceitos, mesmo diante dos desafios de adaptação.
Foram ao todo 5 semanas, todas muito bem aproveitadas. Fazendo uma retrospectiva desses dias incríveis, resolvi destacar três razões para se voltar ao Brasil, pelo menos em caráter recreativo, que foi o meu caso. Continuo feliz e muito bem em Québec com meu marido e nosso cachorro Tyko. Mas como bem disse Dorothy no Mágico de Oz: não há lugar como o nosso lar!
Razão n. 1 – Comer feijão e arroz e farofa à moda brasileira
A comida brasileira…eis uma das grandes vedetes da lista de desejos de quem foi embora. Podem falar o que quiserem, mas a nossa comida é maravilhosa. Do tradicional PF no buffet por quilo à incrível variedade de frutas e legumes, passando pelos nossos pratos tradicionais, não tem como literalmente cair de boca quando a gente chega no Brasil. Eu vim sonhando com banana da terra, mamão papaya, pão francês, arroz com feijão, sonho de creme, cueca-virada, cachorro quente de rua, brigadeiro, mouse de maracujá, suco de abacaxi com hortelã…. Tudo bem que em alguns casos é possível se virar no Canadá (ou em qualquer outro lugar do mundo) para satisfazer algumas dessas vontades que levam ingredientes relativamente globais. Mas aquele tempero, aquele combo do restaurante favorito, aquela padaria de frente de casa… isso não tem como reproduzir e tudo se resume à experiência, que nesse caso precisa de todas essas variáveis para ser única e irrepetível.
Razão n. 2 – Visitar lugares marcantes da nossa história
Eu amo Curitiba, minha cidade natal. Antes de ir embora, nunca havia morado em outro lugar, logo uma boa parte da minha essência vem de lá. Antes de voltar, fiquei imaginando como eu me sentiria, se acharia o ambiente meio estranho, se precisaria de uns dias para me readaptar. Não se trata de estrelismo de quem agora vive no exterior, mas quando a gente volta, nossa mentalidade não é mais a mesma. O que, aliás, é muito natural. A gente se adapta a outras rotinas, outros cenários, outras formas de se relacionar com o espaço e com a pessoas. A partir do momento em que pisei em solo curitibano, pareceu que eu nunca tinha de fato saído. Naquele momento, entendi todo o sentido da expressão que diz que a gente pode sair de um lugar, mas esse lugar nunca vai sair da gente. Os sentimentos de familiaridade e pertencimento se reconectam automaticamente, e aí é como se a gente voltasse no tempo e simplesmente continuasse de onde parou. E nessa onda de reviver sensações e histórias, andar na rua vira um exercício oras de saudosismo (aquela sensação de falta positiva), ora de nostalgia (aquela sensação de falta que faz doer um pouquinho). Minha conclusão é que todos que voltam deveriam revisitar lugares especiais e reativar a memória das coisas que nos fazem bem. Isso ajuda a valorizar mais tudo aquilo que, por força das nossas escolhas, não se encontra mais à disposição e ao alcance de alguns passos ou de uma curta viagem de carro.
Razão n. 3 – Perceber como a distância é saudável para as relações
Uma das certezas mais absolutas que tenho desde que fui embora é que guardar uma distância saudável das pessoas que amamos é vital para a qualidade das relações. Não precisa ser apenas a distância física, pode ser um simples respeitar o espaço dos outros. Com o tempo, é normal que algumas amizades mudem de cor. Por outro lado, acredito que ter ido morar fora me aproximou muito mais da minha família e de alguns amigos. Como a gente sabe que o tempo é contato, a gente não quer perder um minuto com coisas e sentimentos irrelevantes. Por isso, cada encontro e cada momento que passei com pessoas queridas tem um valor elevado a uma potência infinita. Fiquei pensando naquela frase de Saint-Exupery no Pequeno Príncipe: Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Fico feliz em saber que tenho muitos amigos que partilham dessa ideia e que também souberam me cativar. Quando você volta e quer ver as pessoas tanto quanto elas querem te ver, isso significa que investir nas relações que realmente importam sempre vale a pena, seja no Brasil ou ao redor do mundo. Essa é a grande riqueza da vida e a principal razão que me faz querer voltar sempre.
Mas… por amor, eu também tenho uma ótima razão para regressar ao Québec e ela se chama Julien! Para finalizar, Elba Ramalho me representa em De volta pro meu aconchego:
Vez em quando
Parece que falta um pedaço de mim
Me alegro na hora de regressar
Parece que eu vou mergulhar
Na felicidade sem fim
10 Comments
Sempre bom voltar pro nosso aconchego! 🙂
Mas a música, apesar de ser interpretada por Elba Ramalho, é do nosso grande e saudoso Dominguinhos, em parceria com Mando Cordel! 🙂
Obrigada pela informação complementar. Desde que vim embora, essa música sempre me emociona! Abraços
Gostei muito das suas palavras!!
Edificante ! respeito e amor com nossas raízes faz bem!
Continue feliz em Quebec e em Curitiba!!!
Obrigada Alice! Nós somos produtos das nossas origens, mas também dos nossos destinos. São as pessoas que ficaram aí, como minha Tia Ju, que me fazem querem voltar! 😉
Lindo texto! é muito bom ler as coisas positivas do Brasil.
Concordo com vc, Gisele! Ninguém aqui está querendo ignorar o que não vai bem no nosso país, mas é fato que o vínculo nunca deixará de existir. Abraço carinhoso!
Gostei muito! Escreva mais ??
Obrigada pelo comentário, Alessandra! Esse tipo de feedback me motiva a escrever mais ainda. Continue me acompanhando que de tempos em tempos eu dou umas filosofadas boas sobre a vida aqui em Québec!
Dear Ana Carolina,
Muito interessante o seu relato.
Sou inglês e moro no Brasil a mais de 50 anos. Nunca tive interesse em voltar (tanto que voltei com meus pais de 1992 e 1995 mas depois voltei ao Brasil) mas agora, com a perspectiva de um candidato condenado e outro homofóbico serem presidentes estou pensando nisso sim – dependendo de quem ficar na Presidência.
AMO Curitiba. Morei lá durante seis meses. A comida no Madalosso é uma delícia!
Beijos de Jundiaí SP (hoje mais para Raindiaí),
PAUL
Hello Paul! Thanks for the feedback! Tenho saudades dos almoços em Santa Felicidade também. Raindaí e Chuvitiba são cidades irmãs no quesito meteorologia. Abraços