Até a Segunda Guerra Mundial, Varsóvia tinha uma das maiores comunidades judaicas na Europa e mesmo com toda a tragédia que a população judia vivenciou, ainda hoje podemos sentir a atmosfera desse povo na cidade.
As primeiras informações sobre o povo judeu em Varsóvia datam do século XV. As terras polonesas eram famosas por sua tolerância, o que atraía muito novos moradores. No início, os judeus se estabeleceram na Cidade Velha, mas a crescente prosperidade do seu povo acabou intimidando os burgueses de Varsóvia, e esses, por sua vez, proibiram a população judia de morar dentro da cidade. Em consequência disso, os judeus começaram a se instalar fora da cidade. A memória de um desses vilarejos sobreviveu com o nome de Alej Jerozolimskich (Avenida Jerusalém). Hoje, na Alej Jerozolimskich, existe uma palmeira artificial, projetada pela artista Joanna Rajkowska e instalada em 2002, com o nome de “Saudações da Avenida Jerusalém”. A artista diz que a palmeira é uma forma de fazer a população refletir o que é a Avenida Jerusalém para Varsóvia, sua história e a ausência atual da comunidade judaica na cidade. A palmeira tornou-se um dos símbolos da cidade.
Os judeus também se instalaram no bairro de Praga que, até 1791, era outra cidade e não um bairro de Varsóvia, como é hoje. Após a Terceira Partição da Polônia, as autoridades da Prússia proibiram os judeus de morar em Varsóvia e atribuíram novos sobrenomes a estes judeus. Acredita-se que a invenção dos novos sobrenomes tenha sido feita por Ernest Theodor Amadeus Hoffmann, poeta alemão autor do conto “O Quebra-Nozes e o Rei dos Camundongos”. Hoffman trabalhava como escrivão da cidade, e era conhecido por suas gracinhas. Os sobrenomes dados por ele sempre tinham um toque de humor. Para os judeus mais ricos, ele dava o sobrenome de Goldberg ou Goldstein ou fazia uma série de sobrenomes relacionados à fauna e flora, como por exemplo: Apfelbaum (macieira), Rosenbaum (árvore de rosas). Os sobrenomes que foram dados em Varsóvia, com o tempo, se espalharam pelo mundo todo.
Na segunda metade do século XIX, a vida social judaica floresceu e, no centro da cidade, foi construída a Grande Sinagoga, que se tornou o símbolo do judaísmo em Varsóvia. Ali aconteciam grandes cerimônias para comemorar feriados judaicos e nacionais, além de apresentações de cantores conhecidos mundialmente. Na época da Segunda Guerra Mundial, ela ficou do lado de fora do Gueto, mas foi explodida pelo General Jürgen Stroop, como símbolo da sua vitória sobre Levante do Gueto de Varsóvia, em 1942. Atualmente existe um grande prédio comercial, conhecido como Blue Tower.
Muitos artistas, cientistas e pensadores judeus moraram na cidade, entre eles Ludwik Zamenhof o criador da língua Esperanto, cujo fundamento principal seria tornar-se uma língua universal, a fim de eliminar guerras decorrentes de mal-entendidos entre os falantes de várias línguas. Varsóvia também teve muitos escritores, entre eles Isaac Bashevis Singer, prêmio Nobel de Literatura, em 1978.
A recuperação da Independência da Polônia, em 1918, significou igualdade de direitos para os judeus. Uma grande parte da população acadêmica da cidade era constituída por estudantes judeus. Na Universidade de Varsóvia estudou Menachem Begin, um dos líderes do movimento sionista, que propôs a criação do Estado Judeu na Palestina, tornou-se o sexto primeiro-ministro de Israel e ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1978.
Nos anos 30, a população judaica, que representava cerca de 30% da população varsoviana, participava ativamente da vida da cidade. Apareceram vários jornais em polonês, hebraico e iídiche. Pintores e escultores criavam de forma bastante ativa, e até hoje, é possível ver suas obras em museus ou pelas ruas. Nesta época também houve uma grande produção de filmes em polonês e iídiche; muitos destes diretores eram de origem judaica. Samuel Goldwyn, co-fundador da produtora e distribuidora de filmes Metro-Goldwyn-Mayer ou MGM, nasceu em Varsóvia. A cena musical varsoviana também era muito rica. Um dos mais famosos é Wladyslaw Szpilman, cujas memórias do tempo da ocupação tornaram-se famosas por causa do filme “O Pianista”, de Roman Polański.
O início da Segunda Guerra Mundial, significou para os judeus, o fim da vida que eles conheciam até ali. Eles foram obrigados a usar a Estrela de Davi e passaram a sofrer inúmeras restrições em sua vida cotidiana, como proibições de comércio a não judeus e confisco de bens. Em outubro de 1940, os alemães criaram um gueto aonde 350 mil pessoas – consideradas judias – foram transferidas. Os muros do Gueto dividiam várias ruas e praças da cidade. Judeus de outras cidades da Polônia e de toda Europa foram levados para o Gueto de Varsóvia. Em 1942, os alemães começaram a deportação em massa desses judeus para os campos de concentração espalhados pela Polônia, dentre eles Auschwitz.
Como resultado da campanha anti-judaica de 1968, cerca de 15 mil pessoas de origem judia saíram da Polônia e até 1989, as relações entre poloneses e judeus ainda era assombrada pelo governo comunista.
Hoje em dia, Varsóvia é, novamente, um centro da vida judaica. Na região da Praça Grzybowski, encontra-se a única sinagoga que sobreviveu à Segunda Guerra. Nela, acontecem vários eventos culturais e na própria praça, também ocorre, anualmente, o Festival de Cultura Judaica. Também nessa região encontra-se o Teatr Żydowski im. Estery Racheli i Idy Kaminskich, dois dos únicos teatros na Europa onde existem espetáculos em iídiche.
Na comemoração dos 70 anos do Levante do Gueto de Varsóvia, foi inaugurado o Museu da História dos Judeus Poloneses (POLIN), um lugar que traz de volta a rica memória de dois povos, o polonês e o judeu. A proposta do museu é celebrar a vida, e não relembrar a morte. Por esse motivo, a parte dedicada ao Holocausto não é o carro-chefe do museu.
Um outro lugar completamente novo no mapa da Varsóvia judia é uma instalação artística, conhecida como a casa mais estreita do mundo. Seu primeiro inquilino foi um escritor israelense, Etgar Keret, e por causa dele, a casa se chama Dom Kereta (casa do Keret).
Varsóvia se movimenta com as comemorações dos feriados judaicos: Pessach (Páscoa Judaica), Yom Kipur (Dia do Perdão), Rosh Hashaná (Ano Novo Judaico) ou Hanucá (Festival das Luzes), acompanhados de inúmeros eventos destinados também para não judeus. A cidade recupera, lentamente, a consciência da sua história secular ao lado do povo judeu, que também atua e sempre atuou para fazer de Varsóvia uma cidade extraordinária.
Até mais!