Autoconhecimento: a lição mais importante ao morar fora do país.
Há quase um mês em Lisboa e não sei se posso mais me identificar como uma mulher com personalidade forte e única. Costumava ser assim. Toda noite quando me deito, penso: “vou viver um dia de cada vez”, e fecho meus olhos, esperando algo novo no dia seguinte.
Sempre fui uma mulher bem planejada e obstinada a conseguir o que quero, pelo menos me encontrava neste rótulo. Propus-me a viver na Europa 15 meses com meu marido para fazer pós-graduação em Tendências de consumo, na Universidade de Lisboa. No início era apenas para estudar e trabalhar em qualquer coisa que surgisse. Até meu trabalho no Brasil aceitar que eu fosse morar e estudar fora, mas trabalhando remotamente.
Fiquei indecisa inicialmente porque achava que não viveria plenamente meu “sonho europeu” tendo minhas amarras no Brasil. Mas estando aqui, penso que foi a melhor decisão possível, pois consigo ter uma base financeira garantida, além de ter essa experiência de trabalhar remotamente e novos desafios.
Aos 33 anos, deixei a cidade onde estava me adaptando, após outra mudança brusca de 10 anos vivendo em São Paulo e voltei para minha cidade natal com 80 mil habitantes. Alguns me acharam louca e inconsequente. Via nos olhos das pessoas e familiares o sentimento de que não precisava fazer isso. Uma mulher em plena idade de ser mãe e casada, ir morar fora do país como uma recém-formada? Louca, de certo. Decidi ouvir os que me apoiavam e me olhavam com admiração, coragem e respeito por buscar um
sonho antigo.
Enfim, parti feliz da vida e com a certeza de que seria ótimo para mim e para minha evolução. Já havia tido uma experiência parecida há quase 10 anos, como AuPair nos Estados Unidos, mas naquele momento a busca era diferente. Não havia a preocupação da carreira profissional martelando na cabeça, o relógio biológico dizendo que o tempo está ficando curto para a maternidade, a preocupação única era falar inglês o máximo que conseguisse.
Leia também: tudo que você precisa saber para morar em Portugal
Hoje as buscas são um pouco mais pesadas, eu diria. Começando pela adaptação do espaço de menos de 20m² que temos de dividir, a falta de uma alimentação balanceada que já estava acostumada, os exercícios físicos os quais já estava na programação semanal, o inverno e a falta de vitamina D, a falta de amigos nos momentos mais difíceis, e o euro, claro! Algumas regras impostas por mim mesma após alguns aninhos a mais de experiência. Coloco tudo na conta da minha evolução e desenvolvimento pessoal.
Lisboa tem pago o débito desta conta e a saudade que persiste em aparecer com sua paisagem. A cidade é linda em cada detalhe, em cada parque, em cada telhado que reluz a luz do sol persistente e mais amarela que em qualquer outro lugar que já vivi, e olha que nasci em Araraquara, a morada do Sol.
Há muitos lugares para conhecer, muita história para entender e sentir e terei tempo para isso. Ficamos em Lisboa até junho, em seguida vamos viajar para Itália, França e Inglaterra. Em agosto, iniciamos uma nova etapa em Barcelona, onde faço a segunda fase do meu curso.
Estou tentando aproveitar esta fase de renovação e novas experiências e organizando um blog de tendências de varejo, a área na qual trabalho. Já tenho visto e vivido muitas ideias diferentes das que temos no Brasil e que são adaptáveis e funcionais para lá.
Alguns momentos penso que o tsunami de novidades e sensações antes não vividas vão me levar a um colapso mental. Mas para isso a experiência e a idade são úteis. A calma para analisar as sensações e
entender com maestria o que está acontecendo dentro de mim é bonito de se ver. Claro, falta aquela
terapeuta para dar uma mão, mas tenho me virado sozinha. Horas correndo, horas cozinhando, horas simplesmente andando e admirando, e, por fim, tendo conversas difíceis com o marido, que também está
vivendo tudo isso, com um agravante: sem trabalho no dia a dia!
Tudo parece tão intenso, mas será sensacional me ver daqui 15 meses com toda esta experiência vivida dentro de mim transformada em autoconhecimento.
3 Comments
Ana, excelente post!! Também colaboro para o BPM e estou no Porto! Conheço bem sua cidade natal, Araraquara pois fiz faculdade lá!
Sucesso para você nesta nova etapa!!
Obrigada Soraya! Que bom que gostou!
Ana Paula, muito obrigada pelo texto. Descreve muito bem varios momentos que ja passei morando nao em Portugal, mas ha quase 3 anos aqui na Dinamarca
Aindo estou contruindo essa minha nova identidade, sei que nao é fácil e por inumeras vezes ainda tenho aqueles momentos de “quero sumir daqui!”, mas pelo menos voce tem a vantagem do idioma ser bem semelhante ao nosso, coisa que o idioma dinamarques, aqui para mim ainda me causa desespero e frustacao. É difícil conter a necessidade de poder se expressar sem se parecer com uma crianca de vocabulario limitado e sem desenvolvura na comunicacao. Isso é o que mais me incomoda, mas aos poucos pretendo superar mais esse desafio.
Obrigada novamente.