Curiosidades sobre Burkina Faso.
Nós, brasileiros, apesar da forte relação histórica e cultural, temos relativamente pouco
conhecimento sobre o continente africano. Inclusive, muitos se referem à África como um grande território homogêneo, como se fosse “uma coisa só”, ignorando a diversidade e diferenças entre os países.
Há poucos meses vim morar em um dos 54 países (reconhecidos internacionalmente) dos mais de 30 milhões de quilômetros que cobrem a África. Trabalho para uma organização sem fins-lucrativos chamada Initiative: Eau, cujo objetivo é melhorar a infraestrutura dos serviços hídricos em áreas urbanas em desenvolvimento no país.
Quando eu contei para os meus amigos e família que estava me mudando para Burkina Faso por uns meses, a reação mais comum foi “onde fica isso?”.
Pois bem: Burkina é uma antiga colônia francesa na África Ocidental e faz fronteira com 6 países: Mali, Niger, Costa do Marfim, Gana, Benin e Togo.
Eu poderia mencionar alguns dados demográficos ou sócioeconômicos, te contar sobre a pobreza extrema e índices de violência do país, ou passar horas falando do calor que faz aqui durante essa época do ano. Aos interessados, podem encontrar tudo isso facilmente na internet, ou me perguntar.
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Decidi apresentar meu lar atual por meio de 10 curiosidades sobre Burkina Faso, aos olhos de um estrangeiro. Para fazer essa lista preferi não considerar apenas o meu ponto de vista, então conversei com vários amigos daqui, de diferentes partes do mundo como europeus, latinos e norte americanos. Aqui vão elas:
1 – São muito receptivos
Sem dúvida o que mais gosto em Burkina são os burkinabes. Estão sempre dispostos a te ajudar. Se você vai a uma loja na rua e não encontra o que está procurando, antes que dê tempo de você se virar para ir embora já vão estar ligando para algum amigo do amigo que vai ligar para o tio do conhecido, que vai contatar o fulano que trabalha na loja tal, até encontrarem o que você precisa. Ou quando você passa por alguém que está comendo e, mesmo que não o conheça, vai ouvir um “tu est invité”, ou “você está convidado (a se servir)” seguido de um sorriso.
2 – Homens andam de mãos dadas
É muito comum homens de todas as idades andarem de mãos dadas. Sei que isso acontece em outras culturas africanas também, como sinal de amizade entre os dois. Acho curioso algo tão banal chamar a nossa atenção, mas esse é um costume que eu certamente nunca veria no Brasil, onde homens não se permitem demonstrar carinho por outros homens com receio de serem julgados. Ao mesmo tempo, não é socialmente aceito que homens andem de mãos dadas em público com mulheres, mesmo que sejam casados.
3 – Burkinabes não sabem nadar
Quando vou a um local com piscina, principalmente na capital, é fácil identificar quem não é estrangeiro: os que não entram na água – ou que nem chegam perto – de jeito nenhum.
Recentemente viajei com meus colegas do trabalho para um resort ecológico no meio de uma barragem, a temperatura média era 42°C e não havia nada para fazer além de passar o dia na piscina.
Os estrangeiros ficaram dentro da água até enrugar a pele e os burkinabes não quiseram nem se aproximar da borda. Por ser um país sem acesso ao mar com poucos locais naturais com água apropriada para se banhar, não é comum que aprendam a nadar.
4 – Sempre lavam as mãos antes de comer
As pessoas aqui têm costumes de higiene mais precários, por diversos motivos. Há lixo aos montes nas ruas e nos quintais das casas, alimentos não são devidamente conservados, há muita poeira em todos os lugares, etc. Mas o curioso é que em qualquer restaurante que você for, mesmo que seja uma tenda com quatro cadeiras no meio do nada, você sempre vai achar uma estrutura improvisada com balde, sabão e água para lavar as mãos antes das refeições – e por pura higiene, mesmo.
5 – Os cumprimentos são conversas inteiras
Aqui não se entra em lugar algum sem desejar um bom dia/tarde/noite e logo após perguntar como a pessoa está, se dormiu bem, como vai a família e a saúde. E depois responder tudo de volta. Nem pense em entrar em uma loja já pedindo o que deseja: demonstre interesse pela pessoa com quem fala, mesmo que não a conheça e nem vá conhecê-la melhor. Se conseguir saudar no dialeto local, vai arrancar os mais sinceros sorrisos.
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6 – Na balada, ninguém dança
As baladas daqui se parecem com uma grande “área VIP”: sofás em volta de mesas baixas, balde de gelo com bebida e pessoas socializando, sentadas. Ninguém dança e, por isso mesmo, as pistas de dança costumam ser extremamente pequenas ou acabam virando passagem. Já tentei sair para dançar algumas vezes mas sempre acabo frustrada por levar cotoveladas das pessoas que passam ou por me sentir desconfortável com todos sentados olhando sem parar. Paciência, danço mesmo assim!
7 – Dirigir é sempre uma aventura
O maior perigo aqui não é o terrorismo ou a violência nas cidades: é o trânsito. As pessoas dirigem como se fossem as únicas nas ruas, não respeitam sinalizações nem limites de velocidade, motos são muito populares mas ninguém usa capacete, é a mais pura definição de caos. Tanto na capital quanto nas cidades pequenas é difícil o coração não pular do peito quando está se locomovendo. Nas estradas é comum ver carros com toneladas de coisas no teto: desde homens até sofás, motos e animais. Não é raro ver todos juntos, inclusive.
8 – Se uma mulher trai o marido, ela é expulsa de casa
E o homem fica com os filhos. Não sei o quanto isso se aplica às cidades grandes, mas nas menores ou em vilarejos é normal a mulher ser expulsa de casa se trair o marido, que acaba tendo o direito de ficar com os filhos. Ao mesmo tempo a poligamia é aceita para os homens, que chegam a ter diversas esposas e filhos com elas.
9 – Queda de energia e falta de água fazem parte do dia a dia
Principalmente durante os meses mais quentes, de março a junho. Não há infraestrutura suficiente para atender a demanda de água e energia nessa época do ano no país, por isso é normal que diversas quedas de energia ocorram durante o dia e a noite, assim como a falta de água nas casas. É um desafio e tanto conseguir viver seus dias a 45° C sem ar condicionado e ventilador, ou sem poder tomar um banho gelado.
10 – Diferentes religiões convivem em harmonia
Deixei como última a minha curiosidade favorita. Em Burkina, mais de 60% da população é
muçulmana e aproximadamente 20% são cristãos. Há também outras crenças mas essas são as dominantes. Vemos em tantos lugares do mundo religiões que não conseguem conviver em espaços comuns, e aqui acontece exatamente o contrário.
Muçulmanos e cristãos se casam e constituem famílias, mesquitas ficam próximas a igrejas e todos convivem e se respeitam.
Um dia fui visitar uma funcionária (cristã) da organização em que trabalho e, quando cheguei em sua casa, seu marido (muçulmano) me recebeu dizendo que ela estava na missa e logo voltaria. Os dois são bem devotos em suas respectivas crenças e isso não os impede de se amarem e viverem juntos.
Essa seleção de curiosidades é completamente subjetiva. Sugestões, opiniões e mais curiosidades são muito bem vindas. Se souberem mais sobre determinado tópico, vou adorar conversar a respeito.
5 Comments
Bem vinda ao BPM, Júlia, e gostei muito do seu texto! Eu também nunca tinha ouvido falar desse país e gostei de saber mais, vou continuar acompanhando para aprender mais sobre a África.
Beijos!
Adorei seu texto Júlia! Vivi na Tanzânia que, mesmo sendo do outro lado do continente, tem muitas semelhanças com os pontos que você apresentou.
Aproveite sua experiência em Burkina Faso e continue compartilhando tudo por aqui! 🙂
ola boa tarde Julia Catani adorei seu comentario estou conhecendo uma pessoa que vive ai em guagadougou e estou procurando informaçoes desta colonia da frança sou de sp interior botucatu
Olá Paulo,
A Júlia Cataniparou de colaborar conosco e, infelizmente, não temos outra colunista morando no país.
Obrigada,
Edição BPM
Olá, meu marido está trabalhando lá. Há poucos brasileiros. Se precisarem de ajuda, entrem em contato. Abraços.