Se você está lendo este blog, temos em comum o fato de morarmos fora do Brasil ou pelo menos o desejo de quem sabe, um dia, aqui chegar. O interessante é que cada uma chega por aqui (qualquer que seja o seu aqui) por diferentes meios, com diferentes bagagens, mas tendo em comum o passaporte da República Federativa do Brasil. Por mais que não pareça, por mais que os sotaques sejam diferentes, a gente acaba tendo mais em comum morando fora, do que morando na pátria amada, salve, salve.
Aqui, todo mundo é igual. Essa é a bem da verdade. Níveis de escolaridade, condições financeiras, partido político – nada disso é tão importante quanto o fato de sermos todos brasileiros. E daí, funciona para os dois lados: positiva e negativamente. A gente faz amizades com pessoas que muito provavelmente nunca nem cruzaria na rua. Divide memórias antigas que são gostosas só porque a distância nos uniu. Mas a gente também é tachado de forma generalizada só porque é brasileiro, não tem jeito.
Tem cara que acha que toda mulher brasileira é fácil, gostosa, da bunda grande e não tem quem o convença do contrário. Tem sogra que acha que toda mulher brasileira só está atrás do green card… e por aí vai.
Como se não bastasse os gringos nos categorizarem de latinos, sem nem saberem o que o termo realmente significa, achando que a capital é Buenos Aires e por isso saudamos com “Holla”, tem compatriotas brasileiros que dão vontade de fingirmos que nem conhecemos.
Dá essa vontade porque a gente passa cada vergonha. É gente mentindo, roubando, dando jeitinho, falando alto, agindo de má fé, manipulando fatos nas mídias sociais, fazendo panelinha porque não gostou da cara de alguém, se esquecendo de onde veio e mandando ir embora quem fala português por aqui e fica com saudades das delícias de lá… está começando a reconhecer alguém com esse perfil?
Isso tem até nome: brazilphobia.
Em poucas palavras, brazilphobia é quando você evita ficar por perto, conviver, fazer amizade com brasileiros que moram no exterior, ou que estão passando por aqui. Me deparei com o termo pela primeira vez no perfil de uma amiga facebookiana e achei interessantíssimo. (Antropologicamente e socialmente o povo brasileiro é uma riqueza de pesquisa.)
Jesus amado, que história é essa???
De repente, a gente fica tão especial porque mora fora que cria até termo, enquanto que o que vira mesmo é um microcosmos. Cada um de nós se torna, ou pensa se tornar, uma embaixada do Brasil. Vira-se estatística, e é daí que vem a generalização.
Se tem uma coisa que aprendi nesses 8 anos morando fora é que a gente não podia ser mais igual como ser humano. Todo mundo é igual, só muda de endereço. Tem os mesmos desejos, anseios, inseguranças e todo mundo que mora fora de seu país tem essa impressão de que alcançou algo muuuito importante. E alcançou mesmo. Alcançou seu destino, trabalhou duro e vai começar a colher os frutos de seu esforço, com sorte, por aqui.
Mas a verdade é que “in the grand scheme of things”, mudar para cá mais um dólar te compra um café, mais nada (traduzindo a expressão “that plus a dollar bill gets you a cup of coffee). E com certeza não é isso que te faz mais ou menos que o outro que não teve a mesma “sorte”, muito menos que o outro que veio para o exterior e continua ladrão, mentiroso, imbecil. Somos todos turistas ou cidadãos do mundo.
O cara que trapaceia, trapaceia porque é trapaceador, não porque é brasileiro. O cara que ainda acredita no PT, ainda acredita porque foi iludido, não porque é brasileiro. A gente só vê assim porque conhece a fundo o brasileiro, afinal, somos todas brasileiras.
Esse tipo de mentalidade é o que mais nos separa. E isso sim parece ser bem característico do brasileiro. No Brasil a gente diria, “pôxa, mas que manipuladora, essa moça. Fez fofoca assim sem mais, nem menos”. Aqui, a gente acaba dizendo: “pôxa, mas tinha que ser brasileira mesmo. Vive fazendo fofoca… parece novela”. Atire a primeira pedra quem nunca pensou isso.
A bem da verdade é que ninguém tem tempo de ficar ouvindo imbecilidades das quais não concorda, ou tem que aceitar maluquices de um grupo em nome do velho “somos brasileiros, devemos nos apoiar”. Não. Façamos amizades com aqueles que nos acrescentam por um ou outro motivo. Mas daí, fala a verdade e chama o deslumbrado de deslumbrado, o recalcado, de recalcado, o friorento de friorento, e a mulher bonita, de mulher bonita mesmo.
5 Comments
Oi Felicia! Achei bem interessante o seu texto. Moro no exterior há quase sete anos e, cada vez menos isso “só podia ser brasileiro” porque comecei a perceber que o problema do recalque, da alienação ou burrice tem menos a ver com nacionalidade que com a pessoa. Além disso, ao usar essa frase, me incluiria porque, ao fim e ao cabo, sou brasileira também.
Nos primeiros meses, acreditava que só porque encontrava um brasileiro, seríamos amigos, estilo bff. Uma amiga, no entanto, usou uma frase que nunca esqueci: “Tati, se alguém não seria meu amigo no Brasil, não vejo motivo para que seja meu amigo só porque moro no exterior”. Na boa, até hoje, quase sete anos depois, não tive experiência nenhuma que provasse o contrário.
Odeio frases do tipo “achei que você fosse me ajudar porque somos brasileiras”. Acho típico de pessoas folgadas que esperam que sejam levadas nas costas…
Bom, é isso! Beijo
Oi Felicia querida, voce tocou um ponto interessante e importante. O preconceito do Brasileiro com o próprio brasileiro. Eu tenho a impressão que os perfis de brasileiros vivendo no exterior mudam muito de região pra região, pelo menos foi a minha impressão vivendo na Europa, e visitando amigas brasileiras nos USA ou outras partes do mundo. Eu acredito que depende muito de sua motivação pra emigrar. Eu vejo a comunidade brasileira vivendo no exterior como em 3 categorias principais: 1)aqueles que emigram pra conquistar uma vida melhor, na maior parte das vezes “financeiramente”, e neste caso acho que os USA tem muito este tipo de perfil, 2) os brasileiros que vao morar em outro pais devido aos seus estudos (MBA, PHD, Lingua local), ou trabalho (expatriados), ou por gostar e se interessar pela cultura local. 3) Aqueles que se casam com um estrangeiro. Os casos 2 e 3 tendem a interagir mais com comunidades locais, enquanto no primeiro caso a tendência é ficar entre os brasileiros, devido a dificuldade da lingua local, devido a situação muitas vezes de estar ilegal no pais, e de viverem de sub-empregos, como ajuda mutua dentro da comunidade. Acho que o fenomeno da Brazilphobia acontece mais com o perfil 1), muitas pessoas estão em uma situação de incerteza e instabilidade, e vivem em uma espécie de luta pelo seu lugar ao sol. . Concordo plenamente com voce, que somos todos seres humanos. Entretanto é verdade também que a cultura em que crescemos tem uma influencia grande como referencia de valores e comportamentos de convivência em grupo, e infelizmente a mentalidade Jerson “Gosto de levar vantagem em tudo”, ser mais “esperto” que o outro, ter atitudes de abuso, não ter respeito por regras, em geral e acima de tudo “local”como falar alto por exemplo, tudo isto é muito nosso mentalidade brasileira, como cultura somos muito narcisistas. Acho sempre uma pena, quando as pessoas emigram e não melhoram as coisas que poderiam, com o acesso a outros parâmetros e culturas. Não falo mudar tudo, mas ser internacional, nos permite fazer escolhas pra construir uma vida com maior qualidade devido a suas opcoes e acesso a diversas culturas. Provavelmente este fenômeno de BRAZILphobia ainda é maior em grandes cidades como NYC, que ja tem uma cultura de muita competição e bullying também. Mas concordo com voce que não devemos aceitar e cruzar os bracos, mas sempre criar uma discussão, uma reflexão, sobre o assunto, afinal é importante nos desenvolvermos como pessoa, acima inclusive de nossa cultura nativa. E se no Brasil existem aspectos culturais que são tóxicos, existe tambem muitos aspectos positivos, somos alegres, divertidos, carinhosos, batalhadores, e sabemos ser amigo quando queremos. Vamos mudar de Brazilphobia pra Brazilmania?! Eu me sinto embaixadora de um Brasil cheio de pessoas lindas, que são minhas referencias, que é meu Brasil, nos mostramos sempre o Brasil que temos dentro de nos mesmos. rsrsrrsrsrs Parabens pelo texto! 🙂 Namasté 🙂
Eu concordo. O pior é aquele tipo de Brasileiro, que vem pra cá, mas se acha superior, e quer á qualquer custo se distanciar da própria raiz, porque quer ser “americanizado”. E o famoso Brasileiro com a síndrome de vira-latas acha tudo aqui perfeito e torce o nariz com relação ao Brasil e com relação aos demais latinos, sendo que ele é da mesma raça. Por isso que diante de alguns tipos, eu creio que meu cachorro tenha muito mais dignidade.
Olá Felicia, tudo bem?
Eu concordo com absolutamente tudo que a Ana Cristina, acima, escreveu! No fim, tudo depende muito do seu interesse quando vai morar no exterior. O meu era mudar totalmente, tudo e mais um pouco. E eu estava sedenta por uma nova cultura, novos costumes, conhecer gente nova, etc. Eu faria um raciocínio contrário ao seu: muitas vezes, nós, brasileiros, achamos que temos que ficar unidos porque somos objeto de preconceito, de latinização, como você disse, e outras coisas. E a gente acaba se fechando para o novo pelo medo. Quando cheguei ao Canadá, ouvi que canadense era um povo super bacana até a página dois, porque eles não deixam você entrar na vida deles se você é estrangeiro. No entanto, fiz amizades com canadenses já na minha primeira semana, e o meu grupo de amigos só aumentou. Conheci meu namorado, canadense, por aqui, e confesso que tive a preocupação de que a família dele achasse que eu só queria um green card. No entanto, não poderia ter sido recebida melhor, hoje eles são a minha família aqui. Ou seja, no fim é nossa postura que conta, o nosso interesse. O meu era conhecer uma nova cultura. Não tenho absolutamente nada contra brasileiros, tenho amigos brasileiros aqui, mas eles são minoria. Não porque acho que brasileiro é x, y ou z, mas porque quis me dar a chance de viver algo diferente. =)
Abraço!
Adorei! Acho esse tema ótimo, afinal morando no exterior é super fácil encontrar alguém assim, ou até mesmo pegar esse papel pra si! (claro, em diferentes graus)
Quando eu cheguei aqui na Bélgica eu tinha contato com brasileiros, mas não entendia mesmo quem só se fechava nesse grupo e até mesmo evitava me envolver muito, pois eu pensava que já que to aqui, o melhor era conhecer quem é daqui ao invés de ficar conhecendo gente do Brasil…
Passando um tempinho eu comecei a achar que além de ser complicado criar laços com os belgas, tinha muita coisa que por serem daqui e sempre estarem aqui, os belgas não entendiam e acabei encontrando um certo refugio e similiaridades nos brasileiros e acabei fazendo exatamente o oposto do que fazia antes, andar mais com brasileiros, passand até por essa fase de ser amigos só porque temos a mesma nacionalidade…
Hoje em dia eu acho que consegui encontrar um equilíbrio, não evito nem procuro, me dou com quem eu tenho afinidade, sejam brasileiros, belgas, outros migrantes…Eu gosto afinal do contato com pessoas e fico aberta ao mesmo sempre, não nego minhas origens, nem minha cultura, pego o que me convém dela para me nutrir e vou pegando um pouco também do que encontro!
Parabéns pelo texto e pelo debate!