Hoje irei falar sobre o sistema público de saúde na Inglaterra, o NHS, e a minha experiência pessoal utilizando o sistema. Gostaria de ressaltar que nada é verdade absoluta, e é baseado em minha experiência como moradora do país, descobrindo como funciona o sistema de saúde, exceto pelos dados retirados dos sites oficiais.
Quando cheguei à Inglaterra com o meu Entry Clearance (Agora chamado de EEA Family Permit, o visto de residência para cidadãos do Espaço Econômico Europeu)¸ eu já pude me inscrever no posto de saúde local (o médico da família, no Brasil) que era determinado pelo o meu endereço. Se o familiar do europeu já chega à Inglaterra portando esse primeiro visto de entrada, ele pode começar a organizar a vida, conforme expliquei neste post. Através da internet, consegui achar o centro médico mais próximo a minha residência e fui até ele me inscrever portando meu passaporte com o visto, meu comprovante de endereço e assim pude preencher a ficha que nos é dada ao iniciar o processo de inscrição. Pronto! Em dois dias recebi em casa o meu número de registro e já podia marcar consultas com o meu GP (médico da família).
Foto do arquivo pessoal
O NHS é um serviço de saúde gratuito para todo cidadão britânico, todo cidadão europeu e seus familiares diretos (por direito garantido pela União Europeia). Se o indivíduo não se enquadra em nenhum desses, pode consultar aqui se é necessário o pagamento de alguma taxa. Caso esteja requerendo um visto de estudante, o valor é de £150/ano e, caso seja visto de trabalho, o valor é de £200/ano – esse valor deve ser pago integralmente de acordo com o número de anos concedidos pelo visto. Tendo alguma dúvida sobre o valor a ser pago, é interessante dar uma pesquisada no site do governo.
Aqui na Inglaterra é um pouco diferente do setor privado do Brasil, pois não procuramos um especialista diretamente, passamos pelo nosso médico da família para uma primeira triagem e depois, caso o clínico geral ache necessário, vamos à consulta do especialista. Já existe esse conceito de ir a um clínico geral no Brasil, e este está se inciando no sistema público. Meu marido foi diagnosticado, ainda no Brasil, com Glaucoma, e após ter registrado em sua ficha médica essa condição, marcou uma visita ao nosso médico local e de lá, foi encaminhado para o oftalmologista. A consulta chegou marcada pelo correio, através de uma carta e não foi necessário fazer nada. Foi bem fácil.
Todas as vezes que necessitei, foi bem fácil agendar uma consulta, visto que minha clínica tem até aplicativo para celular. Sempre consigo consultas em pelo menos duas semanas, ou seja, nada muito diferente do Brasil, mesmo com planos de saúde.
Quando procuramos na internet sobre o sistema de saúde daqui, temos diversas opiniões, algumas bem ruins referentes à emergência e hospitais. Minha experiência com a emergência do NHS se refere a uma cidade pequena, sem muitos moradores e que durante a noite fica bem vazia, sendo assim, a emergência do hospital não poderia ser muito diferente dessa realidade.
A emergência
Após um surto de dor fui parar na emergência do NHS no meio da madrugada de uma quinta-feira. A cidade estava toda apagada e o hospital bem vazio. Tinha um senhor dormindo no banco, uma mãe com criança saindo de uma sala, duas recepcionistas, uma sala de triagem vazia e alguns médicos que podiam ser vistos quando abriam a cortina. Era essa a realidade daquela emergência e daquela noite fria no Warwick Hospital. Bom enredo para um filme de terror.
Como meu nome tem muitos sobrenomes para eles, soletrar estava complicado, entreguei minha carteira de identificação do NHS. Essa carteira nunca foi necessária, mas sempre ando com ela em caso de algo acontecer fora na minha cidade, pois tenho bastante dificuldade de fazer as pessoas entenderem meu nome, sobrenome e mais ainda acertarem a grafia deles. Enfim, achou meu nome, minha ficha e me mandou para triagem. A enfermeira me pesou, tirou minha pressão, minha temperatura e pediu para fazer xixi no potinho para fazer teste de gravidez – esse foi um ponto que me impressionou, pois antes de qualquer diagnóstico foi testada a possibilidade de eu não poder tomar algum tipo de medicamento por causa de uma gravidez.
A enfermeira me deu um remédio para amenizar a dor (paracetamol, eles amam esse tal por aqui) e pediu pra aguardar na recepção até a médica plantonista me chamar. E nem demorou tanto para ser chamada, fui super bem atendida, ela foi gentil e delicada, tirou sangue para fazer alguns exames, conversou sobre a dor e deu seu diagnóstico. Nada demais até aí, nada diferente do que esperava. Aguardamos bastante pelo resultado do exame de sangue e ficamos quase 4 horas dentro do hospital, mas no final das contas saí de lá com o meu remédio em mãos e sem nenhum custo.
A maioria dos remédios aqui é dada diretamente ao paciente, ou através de uma receita para retirar na farmácia sem custo, como as pílulas anticoncepcionais. Se você for menor de 18 anos, qualquer tipo de medicamento é gratuito, assim como se for aposentado. Caso seja um remédio mais caro, o governo subsidia o custo e a você será cobrado um certo valor, mas nada como os valores cobrados no Brasil.
Enfim, minha experiência com o NHS é bem pequena, mas positiva. É bem nítido que o NHS está sendo sucateado e privatizado, como pode ser lido nos jornais e ouvido nas reclamações da população, mas ainda funciona em algumas áreas. O que acho ruim no sistema é o fato de tentarem evitar qualquer tipo de tratamento até que seja absolutamente necessário e não considero o sistema de saúde daqui como preventivo. Posso dar exemplo com os exames ginecológicos, pois no Brasil fazemos exames anuais, e aqui os exames de rotina acontecem a cada 3 anos se você tem até 50 anos e depois disso, de 5 em 5 anos. Sendo assim, se você estiver morrendo, o tratamento será de primeiro mundo, mas se não estiver com o pé na cova, tente manter sua saúde através de boa alimentação e exercícios regulares, pois será mais seguro.
Pontos positivos: Não precisar pagar extorsivos planos de saúde; medicamentos gratuitos ou preços justos. Não gastam dinheiro público com exames se não for necessário.
Pontos negativos: Falta saúde preventiva. Não fazem exames de rotina se não for extremamente necessário.
Sendo assim, qualquer experiência pode ser positiva e/ou negativa, não se deixe levar apenas pelo que lê na internet, e não se deixe enganar, mesmo aqui existe a máfia da saúde e tentam privatizar o sistema. E mantenha-se sempre saudável, alimentando-se bem e praticando exercícios regularmente.
Leia mais sobre a Inglaterra: Tudo o que você precisa saber para morar na Inglaterra!
12 Comments
Parabéns pelo texto, bastante leal a realidade. Morei 6 anos em Londres e acho que você resumiu de forma muito correta.
Olá Adriana,
Muito obrigada pelo comentário.
Continue nos acompanhando aqui no BPM!
Beijos,
Pingback: NHS, o sistema público de saúde britânico. – Arrumei as malas e parti…
Maravilha. É o que nós Brasileiros merecemos aqui. Grata.wa
É o que todos seres humanos merecem, independente de nacionalidade!!
Obrigada por nos acompanhar o BPM.
Volte sempre,
Juliana.
Oi Juliana, sou GP aqui na Inglaterra e achei o seu texto muito interessante. Confesso que quando vi o titulo da materia, pensei que iria encontrar mais uma pessoa reclamando do sistema, ja’ q a muitos dos brasileiros que conheco aqui reclamam bastante. Mas voce resumiu super bem e passou a informacao muito claramente. So’ gostaria de esclarecer um pouco justamente onde todos os brasileiros acham que o sistema falha, a ideia de que medicina preventiva e’ fazer exames. Os exames sao na verdade, diagnosticos. Por exemplo, se eu pedir seu colesterol e o resultado vier alto, eu talvez terei tempo de prevenir um infarto, mas na verdade ja’ estarei diagnosticando e tratando, e lhe expondo ao risco de efeitos colaterais. Como voce disse, a melhor prevencao e’ vida saudavel, boa alimentacao e exercicios. Nisso concordo que o sistema daki e’ um pouco falho, pois deveria iniciar nas escolas (na minha opiniao, as criancas tem muito poucas oportunidades de fazer esportes na escola). Quanto aos programas de prevencao contra cancer, o motivo de fazermos aqui a cada 3 ou 5 anos, dependendo do cancer, e’ custo-beneficio, ou seja, os custos de exames anuais nao compensa os beneficios, nao altera o numero de casos novos de uma maneira significativa, pelo menos por enquanto. Mas esse intervalo pode diminuir de acordo com algumas caracteristicas individuais. Nem de longe o sistema e’ perfeito. Eu, desse lado de ca’, sei das frustacoes e dificuldades que enfrentamos, num sistema cada vez mais sulcateado pelas tentativas de privatizacao (claro q interesse de muitos politicos que se beneficiarao com essa area lucrativa!). Mas tendo trabalhado no SUS, acho aki quase um paraiso!!! O maior desafio e’ a expectativa do paciente, muitas vezes a sua experiencia com o sistema depende do que voce espera dele. Mais uma vez, parabens pelo texto.
Olá Victoria,
Muito obrigada pelo comentário, ainda mais vindo de alguém que vive intensamente o NHS e conhece a saúde brasileira.
Obrigada também por esclarecer sobre exames e prevenção. É sempre bom estar aberto para desconstruir paradigmas
Infelizmente, a lógica capitalista está tomando conta e o dinheiro está se tornando mais importante que o o ser humano e não importa o país, né?! É triste, muito triste ver a saúde ser sucateada!
Mas, vamos continuar na luta para melhorar sempre e manter nossa saúde em dia, né?!
Volte sempre,viu!
Juliana
Boa noite querida
Apenas uma duvida: Meu filho vai fazer um intrcambio numa escola, ate ai tudo certo. Ele tem passaporte italiano , caso necessite de uma emergencia, tipo operação ou coisa assim de emergencia ele tera direito como cidadao europeu?
Olá Amelia,
Eu não sei te informar como funciona emergências sem ser residente do país e sem estar cadastrado em qualquer outro país do bloco da União Européia.
Normalmente você tem que ser cadastrado no sistema de saúde do Reino Unido para poder ter direito a utilizar o NHS, mas não sei te informar como funciona para intercambio.
Acredito que a escola poderá ajudá-lo em se manter mais informado sobre isso e se será necessário que ele se cadastre para utilizar o sistema de saúde que é garantido ao cidadão Europeu.
Espero ter ajudado e obrigada por nos acompanhar aqui no BPM.
Juliana.
Boa noite. Eu tenho retocolite ucerativa e faco o uso de um remédio carissimo aqui no Brasil (Remicade), que é um remédio europeu. Pretendo ir para a Inglaterra em breve e terei a cidadania Italiana. Sabe me dizer se terei o direito de continuar esse tratamento gratuito ai na Inglaterra? Eu realmente preciso dese remédio para ter alguma qualidade de vida. Mas eu também preciso sair do Brasil para ter qualidade de vida. Se souber me informar agradeço.
Oi Juliana tudo bem? Eu estou prestes a ficar por seis meses na Inglaterra , mas confesso tenho receio porque eu tenho colite uma doença crônica e requer acompanhamento com exames de laboratório etc . Vou entrar como turista , como será que posso usar a saúde ? Plano de saúde é muito caro? Se puder me ajudar agradeço
Olá Cleide,
A Juliana Brandão parou de colaborar conosco, mas temos outras colunistas na Inglaterra que talvez possam te ajudar.
Você pode entrar em contato com elas deixando um comentário em um dos textos publicados mais recentemente no site.
Obrigada,
Edição BPM