Pali Pali & Sociedade Coreana.
No meu primeiro texto, citei o “Pali Pali”, advindo da rápida industrialização do país. Explicando melhor, o “pali pali” significa “rápido, rápido”, ou seja, tudo deve ser feito o mais rápido possível, como comer, preparar comida, estudar, trabalhar, construir coisas, ou até na forma como a dinâmica da cidade funciona.
Amo a Coreia do Sul e acredito no seu potencial, porém fantasiei muito sobre ela antes de vir, e ver essa característica foi um grande choque cultural para mim.
Confuso? É um pouco. Vou dar alguns exemplos:
1) Se você acha que os restaurantes fast foods são rápidos no Brasil, aqui, todos os restaurantes servem comidas com a mesma velocidade deles. Se demorar mais do que 3 minutos, os garçons avisam e ainda pedem desculpa. Uma vez, a comida chegou, digamos que 6 minutos depois que pedi, e o garçom já veio pedindo desculpas, e perguntando se aceitávamos alguma cortesia da casa pela demora deles;
2) Como eu faço minhas refeições no restaurante universitário, vejo sempre os coreanos comendo o mais rápido que puderem, não conversam muito durante refeição e assim que acabam, eles saem rapidamente da mesa;
3) Fiz estágio durante o inverno, e várias vezes, encomendamos para comer durante o expediente, para quem assim, o serviço não pare. Um exemplo de comidas no trabalho é o 김밥 (kimbab = sushi coreano);
4) Quando estudam, deve ser o mais rápido e, portanto, muitas vezes, eles só decoram o que está escrito, não sabendo explicar o que decoraram. E isso é um dos grandes males da educação coreana;
5) Como correm muito nos afazeres diários, momentos no metrô são muito valorizados para tirar aquela sonequinha. E o silêncio é muito valorizado dentro dos ônibus e no metrô, por isso, dificilmente se vê um coreano que não esteja no celular ou dormindo.
Por causa da rapidez, o transporte público, por exemplo, acaba sendo visto como muito eficaz. O que não significa que a manutenção e as leis estão sendo respeitadas. E um dos maiores exemplos de que isso pode estar acontecendo é o acidente do Ferry do dia 16 de abril. O Ferry que fazia a rota Incheon-Jeju, naufragou na costa, resultando em 281 mortos e 23 desaparecidos.
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A população ainda está em luto, principalmente porque muitas das vítimas eram estudantes de um colégio. Conversei com vários coreanos aqui na minha universidade. Os mais velhos entendem que vários fatores culturais contribuíram e lembram que um acidente similar aconteceu há 20 anos e indignam-se. Já os mais novos, culpam o capitão, que foi um dos primeiros a abandonar o barco. Ou seja, os ânimos estão bem variados, entre luto, vergonha, raiva e sensação de desonra por isso acontecer no país deles.
A honra e o orgulho pessoal é muito importante. Desde cedo, eles são ensinados de que o sucesso deve ser o objetivo de vida. O que torna a sociedade muito opressora e de costumes muito tradicionais e, por isso, educação e beleza são muito mais valorizados por eles. Consequentemente, suicídios por causa de vergonha e desonra são até considerados normais (com uma taxa de 15 mil mortes/ano).
Após esse acidente, o governo tem tomado diversas medidas. Vimos que isso também aconteceu no Brasil após o acidente de Santa Maria-RS em 2013.
Daqui há um mês viajo para Jeju. Irei de avião. A demanda por viagem de ferry diminuiu consideravelmente. Todos estão preocupados com a segurança. Mas riscos existem em todos os lugares, devemos apenas ficar atentos e tomar atitudes caso algo esteja errado.
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A mídia nesses últimos dias tem debatido muito sobre essas anomalias sociais e a predisposição à desastres, ja que só neste último ano, vários acidentes aconteceram.
As pessoas não mudaram ainda seu modo de ver a vida, e continuam a seguir o ideal de “pali, pali”, busca pelo sucesso, a hierarquia e tradicionalismo rigoroso, formando uma sociedade pouco auto-crítica. Mas existe uma possibilidade de que esse pensamento tome novos rumos.
Não sei ainda o que esperar da Coreia no futuro em relação a isso. Mas acho que devemos prestar atenção para ver o desenrolar dessa história. Podemos aprender várias lições com eles.
9 Comments
“”PARABÉNS PELO TRABALHO””
Obrigada! Que bom que gostou!
Ótimo texto!
Obrigada! Espero ter explicado bem o que tenho absorvido da cultura deles!
Continue acompanhando o blog. xD
Oi Thainy, lendo seu texto fiquei me perguntando: como foi pra você essa adaptação no verdadeiro significado de ‘corre-corre cotidiano’?! E eu que achava que minha vida era corrida…hehe
Oi,
Obrigada por comentar. A adaptação aqui não é fácil. A dinâmica da cidade é muito eficiente, o que facilita muito. Mas em parte me deixa desacostumada com o Brasil. Estarei voltando em agosto, e nem consigo imaginar como vai ser a readaptação.
Por sorte, eu não tenho tanto corre-corre aqui, como tinha no Brasil. Sou intercambista e por causa disso, o meu tempo de estudo na universidade é reduzido, mas fico doidinha com a rotina deles…hehe
Thainy, eu sempre fui muito rápida e apressada pra fazer muitas coisas…. hoje, que dei uma bela desacelerada, nao sei se voltaria a me acostumar com tudo tao “pali, pali”. Fiquei curiosa pra saber como é feito o kimbab!!! Agora essa foto do pessoal dormindo no metrô é massa!! E a dor nas costas depois, gente do céu!!!! Quanto ao uso do celular, creio que já está mais do que claro que é uma “doença” mundial…. Beijinhos e espero mais histórias suas!!!
Adorei seu texto! No Brasil eu era “pali pali”, pra dar conta dos imprevistos, e das inúmeras coisas que fazia. e era muita improvisação pra lidar com a “espontaneidade” brasileira. rsrsr Depois tive Alemanha onde era “pali pali” da eficiência e competitividade, pois a sociedade funciona assim, tudo rápido, pratico, eficaz e inteligente.Agora moro ha 14 anos na Suica, onde tudo é “pala pala”, as pessoas falam devagar, se movem devagar, e o tempo que se leva so pra ser “polido”, com bom dia, boa tarde, pardon madame, s’íl vous plait, merci madame, etc é bem normal, Horário de funcionamento de lojas ou outros servicos são limitados pra que todos possam descansar, o silencio é apreciado, posso dizer que aprecio muito esta qualidade de vida. Hoje com os conhecimentos sobre saúde, stress, depressão, burn out, vida equilibrada, medicina preventiva, neuro-ciencia, psicologia, os Coreanos não conseguem compreender como esta pressão non-stop faz mal pra saúde e pra sociedade a longo termo? Tenho alunos que vem da Coreia do Sul, e tudo que não querem é retornar depois de viver por aqui. Sei que muitas coisas melhoraram na economia do pais, com a super valorização da educação, entretanto quando vejo em documentários, crianças dormindo pouco e em atividade non stop, “pali pali” me da um pouco de medo e sinto imensa compaixão. Namasté e ja me alegro de ler os proximos textos. Namasté Thainy:)
eu amei o artigo.
Gostaria de pedir para vc fazer um falando sobre as universidades coreanas, como funcionam, como os alunos se comportam, etc..