Kurban Bayramı: Feriado do Sacrifício na Turquia
No mês passado, entre 11 e 14 de Agosto, se comemorou na Turquia um dos principais feriados do seu calendário, o Kurban Bayramı (em turco) ou Eid al-Adha (em árabe), que significa “Feriado do Sacrifício”. Ocorre 70 dias após o Ramadã. Nesses 6 anos morando na Turquia, na maioria dos feriados eu aproveitei os dias livres do trabalho para viajar, mas também já passei um ano conhecendo melhor as tradições e comemorações dessa festividade, para poder compreender melhor a cultura local.
História
O Feriado do sacrifício tem origem em uma história bíblica. A história conta que Deus resolveu testar Abraão pedindo que sacrificasse o seu próprio filho. Um pouco antes de sacrificá-lo, um anjo apareceu e deu um carneiro para que fosse sacrificado ao invés da criança. O interessante é que segundo judeus e cristãos, Abraão sacrificaria seu filho Isaac; já segundo islâmicos, sacrificaria Ismael, considerado pai dos Muçulmanos.
A prática do sacrifício de animais foi deixada para trás por judeus e cristãos, mas muçulmanos a mantêm, até então, como um importante ritual religioso, que não só dá valor ao sacrifício, mas também, e muito mais importante, à partilha da fartura com os mais necessitados.
Comemorações
As comemorações duram quatro dias. Quando cai em um mês escolar, as escolas não funcionam durante toda a semana, assim como muitas empresas liberam seus funcionários por esse período. Todos os muçulmanos que possuem condições financeiras, devem sacrificar um animal e partilhar com familiares, amigos e com os mais pobres.
No primeiro dia, homens, mulheres e crianças vestem as suas melhores roupas (muitos compram roupas novas para esse feriado) e devem ir às mesquitas fazer as orações, antes de começar os sacrifícios. Os muçulmanos tradicionais continuam seguindo ao pé da letra a tradição. Antes do Bayram, muitas famílias compram animais e os alimentam para prepará-los para o sacrifício. Muitas famílias ou vizinhos se juntam para poder comprar um animal. Em cidades menores e mais religiosas, ainda são realizados rituais de sacrifício nas ruas ou nas praças. Já nas cidades maiores, essa prática é proibida, e existem lugares específicos para realizar o sacrifício.
Faz parte dessa comemoração visitar amigos e familiares. Em regra, os mais novos devem visitar os mais velhos. Em algumas nações, por tradição cultural e não pelo Islã, algumas pessoas trocam presentes. Aqui na Turquia, as crianças devem beijar a mão dos mais velhos e em seguida elevar até a testa. Depois desse gesto, a pessoas mais velha dá alguma quantia em dinheiro para a criança (tradição que acontece também no Feriado do Ramadã).
Leia também: Ramadã na Turquia
Na hora do sacrifício, o homem que corta o pescoço do animal e as pessoas em volta falam em árabe “Em nome de Allah, o mais Bondoso, o mais Misericordioso”. E o sacrifício deve ser feito da forma como os Muçulmanos exigem que seus animais sejam mortos na indústria alimentícia, o Halal. Com o corte rápido na artéria carótida e da veia jugular na área do pescoço, o animal é suspenso pelas patas traseiras, perde quase todo o sangue e morre rapidamente, sofrendo o mínimo possível. Assim evita-se que as doenças contidas no sangue do animal sejam transmitidas aos seres humanos.
No meu trabalho, eles normalmente fazem o sacrifício de 5-6 carneiros todos os anos no pátio da empresa e partilham a carne com todos os funcionários nos dias antes do feriado.
Algumas partes da cidade ficam infestadas pelo cheiro de pasto, devido à grande quantidade de animais. Aos poucos esse cheiro vai sendo substituído pelo cheiro das comidas das reuniões familiares para longos cafés da manhã ou jantares.
É muito comum também que as pessoas com melhores condições financeiras façam doações em dinheiro para alguma instituição de caridade ou ajudem alguém que esteja precisando, seja na rua ou em comunidades específicas.
Pode parecer um ritual cruel, mas para eles é uma demonstração de fé, sacrifício e partilha. Na minha opinião, acho que não podemos criticar porque comemos carnes que vêm das indústrias alimentícias, onde a maioria dos animais é morta de forma muito mais violenta. Eu fico sim com pena dos animais e não gosto de assistir o sacrifício, nem pessoalmente, nem em vídeos ou fotos. Confesso que fico me sentindo mal ao comer carne nesses dias do feriado.