Por que os armênios celebram o Natal em Janeiro?
Desde que cheguei na Armênia, o aprendizado tem sido diário, e me surpreendo constantemente com a cultura local e as bases sólidas por trás de tudo o que há de tradicional no país. E não poderia ser diferente quanto ao Natal que, na Armênia, é celebrado no dia 6 de janeiro!
É claro que a curiosidade surge: se a Armênia observa o calendário gregoriano, por que os armênios comemoram o Natal no dia 6 de janeiro?
Os armênios constituem um povo de muita fé, com algumas peculiaridades e diferenças em relação à Igreja Católica Apostólica Romana. Para a Igreja Apostólica Armênia, a escolha do dia 6 de janeiro para celebrar o nascimento de Cristo está pautada na argumentação de que não se sabe ao certo qual o dia Jesus nasceu e que, de acordo com as tradições muito antigas da igreja, vários eventos aconteciam para comemorar a Incarnação de Deus. Estas festas não eram chamadas de Natal, e sim de Teofania, que significa “revelação de Deus”.
No calendário Gregoriano, há 2 datas que observam e celebram o nascimento de Cristo: 25 de dezembro e 6 de janeiro. No antigo calendário Juliano, estas datas equivalem aos dias 7 e 19 de janeiro. O dia 25 de dezembro do calendário Gregoriano é o dia 7 de janeiro do calendário Juliano, e o dia 6 de janeiro do calendário Gregoriano é o dia 19 de janeiro do calendário Juliano. De todo modo, a Epifania do Batismo de Jesus é celebrada 12 dias após o Natal, período dedicado pela Igreja ao aprofundamento, contemplação e assimilação do Mistério da Encarnação do Filho de Deus.
Os armênios observam o calendário Gregoriano, exceto aqueles que moram em Jerusalém. Celebrar o Natal no dia 6 de janeiro é uma opção da Igreja Armênia que comemora tanto o nascimento quanto o batismo de Jesus no mesmo dia, quando todos os principais eventos relacionados à Teofania são relembrados, desde a revelação de Jesus como o Filho de Deus, o Verbo Encarnado, o Príncipe da Paz e Rei dos Céus. Portanto, esta celebração abrange desde a Natividade de Cristo em Belém, a visita e a visão dos Reis Magos que foram testemunhar o nascimento de Cristo como revelação Divina, a narrativa da infância de Jesus (a fuga para o Egito, a apresentação no Templo, a circuncisão de Cristo) e a Epifania ou o Batismo no Rio Jordão, onde é inaugurada a redenção do Povo de Deus pela abertura dos céus, a revelação de Deus por meio do Espírito Santo na forma de uma pomba, e a Voz de Deus Pai proclamando que Aquele era o Seu Filho muito amado.
A Teofania (ou Epifania) era celebrada em 6 de janeiro até o século V, quando o Concílio de Calcedônia (451 d.C.) declarou formalmente que o dia 25 de dezembro comemoraria o nascimento de Jesus Cristo, separando a natividade do batismo pelos 12 dias de Natal. A Igreja, sob a liderança do Papa Libério, marcou, desde o século IV, o “Dies Natalis” ou “Natalis Domini” no dia 25 de dezembro.
Embora sejam muitas as teorias sobre os motivos para os 4 Concílios Ecumênicos de Niceia, Éfeso, Calcedônia e Constantinopla terem decidido mudar a celebração da Natividade para o dia 25 de dezembro, acredita-se em geral que a data foi modificada para suprimir as festas e práticas pagãs que celebravam o solstício de inverno, porque, naquele tempo, os cristãos também observavam as festas pagãs. Os pagãos chamavam esta celebração do solstício de inverno de Saturnália, honrando o deus pagão Saturno, com uma festa que durava desde o dia 17 de dezembro até o dia 25, cultivando com o nascimento do sol invencível (Dies natalis invicti solis), na medida em que os dias começavam a ficar mais longos, porque, entre os pagãos, acreditava-se que o sol que morria durante o solstício de inverno renascia em seguida. A Igreja Católica quis ressaltar que a verdadeira luz que ilumina a humanidade é Cristo, e é a celebração do Seu nascimento é a solenidade própria que afirma a fé autêntica no mistério da Encarnação do Verbo, afastando os fiéis da prática de festas idolátricas.
Uma vez que a data da Epifania ou Batismo era mais antiga, e tinha importância litúrgica primordial, não podia-se modificá-la, ao passo que uma adição da data para celebrar exclusivamente a Natividade poderia ser feita sem grandes problemas. A origem da palavra Natal também é discutida, e há quem acredite que a palavra derivou da tradição pagã de celebrar o “Noio hel“, que significa Novo Sol. A árvore, que antes era adorada como símbolo de vida, passou a ser associada também à celebração cristã.
Entretanto, na Armênia, cujo Cristianismo tem origem nos antigos Apóstolos, não se adotou esta mudança pelo simples fato de que não mais existiam tais práticas pagãs na Armênia no século V, o que permitia que eles se mantivessem fiéis às tradições dos seus antepassados.
É por isso que, até hoje, os armênios celebram a Natividade no dia 6 de janeiro, junto da Epifania. Segundo a tradição, há uma benção das águas, com a imersão de uma cruz na água como sinal do Mistério Salvífico de Deus por meio da vida de Cristo, do útero à tumba. A água benta é, então, oferecida a todos como sinal da manifestação Divina nas águas gloriosas do rio Jordão, o local onde Jesus Cristo foi revelado como Salvador da Humanidade, trazendo nova vida para todos que n’Ele creem.
Foi fascinante pra mim descobrir a origem que justifica a comemoração do Natal na Armênia, e, também, motivo de grande alegria porque, pelo menos enquanto morarmos aqui, poderei celebrar 2 vezes o Natal!
E feliz Ano Novo pra todos!!