Quando se escolhe o recomeço
Parece fácil sair de um trabalho que te consome. De uma vida que não te deixa tempo de parar e pensar, onde se tem mais é que trabalhar, beber no tempo livre e dormir, já que como diz minha mãe, amanhã tem mais.
Aí você sai, joga tudo pro alto e resolve ir pro mundo. Só que chegando no mundo, de repente, a ansiedade continua, as dúvidas aparecem para tomar café da manhã e nada é exatamente como você sonhou.
Reclamar não vale, já que a escolha foi sua, mas como começar uma história diferente e sem culpas? Não tenho as respostas, se souber, me conte. Mas talvez escrever possa ajudar um pouco a clarear as idéias e achar um rumo nesse trem doido que é a vida.
Começando do começo. Me chamo Camila, tenho 29 anos, sendo os quatro últimos dedicados a assistir Friends, comer sopas, aprender a trazer bebês para o mundo e ler mais livros e quadrinhos do que posso contar. Alguns desses anos sofrendo por relacionamentos meia boca, como a maioria dos mortais; não agora que tenho do lado um jovem senhor, que faz piadas de 1945, porém que tem o dom de ajudar mais que a mim mesma na minha sanidade mental.
Sou de Minas Gerais, comedora de pão de queijo e com direito registrado no cartório de falar UAI. Cresci em uma família que me apoia em tudo e que costuma falar mais alto do que o comumente aceitável, mas que provavelmente deve ser parecida com a que a maioria das pessoas tem em casa: com carinho, às vezes problemas, e onde se ouvia Raça Negra nos típicos churrascos de domingo, com o pano de prato no ombro do pai.
Estudei a maior parte da vida em escola pública (coisas boas, coisas ruins e uma história comprida demais). Quando me formei já sabia que queria ser veterinária, afinal sempre podemos confiar nos cachorros, não?
Por escolhas do destino, depois de seis anos de café pelas madrugadas de estudo, me formei em medicina em 2014 e escolhi ser ginecologista e obstetra. Gosto de conversar. Por que não conversar com mulheres e tentar ajudá-las, além de ter o privilégio de ser a primeira a tocar no ser mais puro, inocente, redondinho e fofo do mundo?
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Mas e aí, o que faço falando que joguei tudo pro alto e toda essa conversa? O que eu escolhi fazer me faz feliz. Apesar de ser exaustivo por mais motivos que esse parágrafo possa comportar, uma mãe te agradecendo ou o primeiro choro de um bebê, sempre valem a pena.
Só que o que mais amei fazer sempre foi viajar. Sabe aquela paixão que te tira o sono, que te faz despertar sorrindo pela manhã, imaginar surpresas, e que te deixa com o olhar meio bobo? Então, esse era o sentimento quando eu tinha alguma passagem comprada ou algum lugar novo para ver que não me saía da cabeça, ou quando imaginava como era linda a neve.
Sensação melhor que andar descalça na grama e mais gostosa que brigadeiro de colher. Colecionava sites de viagens no tempo da internet discada, a meia noite escondida dos pais, e lia catálogos pegos nas agências de turismo, me deliciando com nomes exóticos como Butão e imaginando se um dia pisaria no Japão (hoje posso falar que já comi Ramen na terra do Sol Nascente).
Então estou aqui, na Espanha, escondida na Catalunha, morando em Tarragona, uma cidadezinha onde você vira uma esquina e se depara com um anfiteatro romano, um aqueduto escondido, uma coluna de 2000 anos esquecida, uma catedral gótica ou com todo azul do Mediterrâneo.
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Com a cabeça cheia de pensamentos nunca antes pensados, desde o porquê eu não estou conseguindo comprar o tamanho de calcinha certo até, depois de visitar uma catacumba, me pegar pensando em porque fazemos tanta coisa na vida, já que vamos todos morrer um dia e, ao mesmo tempo, procurando uma maneira de colocar tudo que está aqui dentro no lugar, ou pelo menos, ligeiramente perto do lugar.
Decidi escrever, porque por mais assustador que seja começar, uma hora tem que pegar no tranco. No meu caso no papel, ou no computador. O que importa é sair do lugar.
15 Comments
Inspirador! Faz a gente refletir se vive a nossa melhor versão ou um padrão de vida imposto. Parabéns pela coragem de viver sua versão mais autêntica! E parabéns por escrever de uma forma que parece que estamos pertinho batendo papo e tomando um café.
Todo mundo sempre falando como devemos viver, não nos deixa tempo para escolher, isso mesmo. Obrigada, e queria esse cafézinho.
Delicia de texto Camila! Recomeçar é como pular na água gelada em um dia quente, da medo do choque, mas quando você pula a sensação é boa e logo se acostuma e agua fica gostosa. Boa sorte no seu recomeço! Adorei sua escrita!
Quando entra na água não quer mais sair, isso mesmo! e Muito obrigada!
Que bacana, menina! Sempre achei que tu ia longe…com esse sorriso maroto tinha que se realizar mesmo. Voe alto, voe a altura dos seus anseios, que bem sei, são infinitos. Amei o seu depoimento, uma gostosura de ler. Faça tudo com o maior amor que puderes e a vida retribuirá esse seu cativante riso.
Desejo tudo de maravilhoso para você e seu amado. Beijos ????.
Obrigada, Margarida, fico feliz da vida, que achou uma gostosura de ler, hehehehe. E sim, tudo que fazemos com vontade e amor, é retribuído. Tudo de bom para vocês aí também, beijos!
É sempre maravilhoso ler textos bem escritos e com tantos detalhes! Leitura muito prazerosa! Quero mais textos assim! ????????????
Obrigada, Carlos, fico muito feliz de saber que gostou, obrigada pelo incentivo! um abraço
Tão comodamente estou lendo, que parece que estou sentada no sofá da Vó Nina falando de “todos os mundos” com você. Parece mágico, viajei num sonho meu, teu e de muitas outras pessoas por aí. Dizem que depois que vive livre, depois que aprende a voá, passarim num volta pra gaiola não. Você não teve medo de ganhar a liberdadade que é a arapuca que acomoda e incomoda. Texto incrível prima! ????????
Ahhhhhh Isa, que saudade do sofá da Vó Nina e de falar de “todos mundos” com você e seu shortinho rosa. E tomara que todos consigam sair da arapuca do mais cômodo. Tomara que meu texto ajude a inspirar. Você já começou também, só continuar! Beijão
Eba! Estava esperando um blog!
Boas lembranças do primeiro ano de faculdade, a gente conversando no corredor sobre livros e sobre nossa carteirinha da biblioteca municipal! Sempre doidinha, cantando até perder a voz no maroon 5. Entre “tapas e beijos” na residência hahahahahaha e vc descobrir seu lugar no mundo perdida na espanha é demais! Admiro sua coragem, pq essa vida vai levando a gente, vai passando, tudo vai acontecendo e a gente não vê. Seja feliz sempre! Beijo
hahahahahahahaha, não lembrava da conversa das carteirinhas, muito bom! Não têm coisa melhor que cantar até perder a voz, mesmo em show mais ou menos, e em se permitir perder-se na vida. Agora, sem mais “tapas e beijos”, que a gente tenha muitas viagens, eu palpite em muitos roteiros seus e que a gente se veja nesse mundão, que eu sei que você também tem alma de viajante!Beijo grandão
Camila!!!! Que menina linda!!!! Amei ler seu texto…muito prazeroso!! Então, vc não me conhece mas sou uma antiga amiga de sua mãe, trabalhamos e rimos muito juntas!!! E agora, pra minha alegria, depois de muitos anos nos reencontramos no face.Imagino o orgulho da Fátima por essa mulher forte e corajosa que você é. Parabéns !!! Continue vivendo essa sua liberdade com bastante persistência,
pois nada melhor nessa vida do que a gente ir pra onde a gente quer ir. Sucesso!! Bjos.
Que legal te conhecer por aqui, Marília! fico muito contente que tenham se encontrado de novo. Adorei o comentário e mais ainda que gostou de ler. E sim, temos que persistir no que sonhamos, sempre, assim vamos longe! Beijo grande!
Olá Camila. Eu também morei em Tarragona, por 3 meses no final de 2018. Adorei a cidade. Parabéns pelo texto e sucesso na sua vida.