Flexibilidade é, sem dúvida, a palavra chave para a boa convivência no reino da Arábia Saudita. A região na qual eu vivo é chamada de eastern province (a província oriental), e funciona como se fosse o nome de um estado no Brasil. Eu moro na cidade de Al Jubail, a qual abriga um dos maiores parques industriais do mundo, e é também nesta província que está localizada a segunda maior reserva de petróleo do mundo.
Conforme citado no documentário “A história do petróleo” apresentado pelo History Channel, estamos em cima de um oceano negro. Portanto é formada essencialmente por estrangeiros que vêm para o reino em busca de um sonho, de crescimento profissional ou de melhores condições de vida.
Cerca de 30% da população da Arábia é composta por expatriados, trabalhadores, de todos os cantos desse planeta. Sírios, indianos, paquistaneses e egípcios estão no topo dessa lista, os países ocidentais somam 1% da população do país, segundo dados da Global Media Insight.
Não é nada incomum que, na mesma calçada, possamos ver um grupo com diversas vestimentas e idiomas diferentes. Essa mistura de etnias, costumes, culinária e principalmente pronúncia, exige do expatriado muita flexibilidade e paciência. Viver em um ambiente tão miscigenado pode ser um desafio, mas também pode ser fonte de muito aprendizado e desenvolvimento pessoal.
Com exceção da comunidade brasileira que se torna nossa família, meus melhores amigos por aqui são da Síria e da Jordânia, por influência deles hoje faz parte da minha rotina, por exemplo, o azeite Sírio, o café turco, hommus (pasta de grão de bico), sempre entrar descalço em casa e tomar chá cerca de duas vezes por dia, sempre com hortelã. Eu até desapeguei do arroz com feijão, visto que não é tão disponível por aqui.
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Todavia, nem sempre foi descomplicado assim, quando cheguei por aqui, há cerca de 3 anos, eu não conseguia entender uma única palavra do “inglês asiático”, o sotaque se torna a principal barreira, quando tudo o que estudamos no Brasil vem do “inglês americano”. Não é rotina no Brasil aprendermos outros sotaques, nosso foco e nossa influência vêm sempre dos Estados Unidos, verdade essa que vem sendo alterada à medida que os brasileiros estão desbravando o globo.
Foi preciso muita paciência, muito estudo para conseguir estabelecer uma comunicação, e hoje eu de fato entendo melhor a pronúncia indiana e árabe do que a australiana, por exemplo.
Os obstáculos causados pela comunicação foram, certamente, os mais difíceis de serem superados. Tarefas simples e rotineiras podem se tornar embaraçosas se você tem um bloqueio na informação.
Uma boa dica, caso você esteja pleiteando morar ou fazer turismo em algum país da Ásia é assistir alguns filmes do Bollywood, cinema indiano, que está bem longe do investimento e da produção de Hollywood, mas me ajudou muito a conseguir entender algumas expressões no “inglês indiano”.
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Ainda que seu foco não seja a Índia, no continente asiático grande parte da força trabalhadora vem de países como a Índia, o Paquistão, Bangladesh e as Filipinas. Com exceção do último, todos têm a pronúncia parecida, eles falam rápido e não têm paciência de explicar caso você não entenda, por isso é importante ter muita calma ao interagir. Além disso, aqui na Arábia a maioria dos motoristas é indiano, o que nos faz conviver quase diariamente com o sotaque.
Para compreender as diferenças e aprender a ter a flexibilidade em entender e estabelecer um diálogo efetivo é preciso muito estudo e dedicação, porém também é preciso compaixão e interesse pelo outro, afinal aqui no reino somos mais de 10 milhões de imigrantes, que deixaram sua pátria, que deixaram sua família, amigos, o conforto em viver na nossa cultura.
E fizemos isso em busca de um sonho, para atingir um objetivo, para alçar novos voos, enfim, somos todos parte de uma mesma raça, separada por cor, idioma e religião, mas no âmago somos todos iguais, porém diferentes, ou como diz a expressão tão típica da Ásia: Same same, but diferent”.