Vamos deixar uma coisa bem clara: eu amo morar fora. Sempre que penso no dia em que reuni todos os meus pertences e resolvi que estava na hora de ir construir a vida em outro país, sinto um pouco de orgulho pela coragem e nostalgia pela ansiedade daquele momento.
A vida em Portugal tem sido muito boa comigo. Esse país possui uma qualidade de vida muito boa e as opções de lazer em Lisboa são imensas. Com tanta coisa para fazer, é difícil se lembrar de tudo aquilo que deixamos para trás no nosso dia a dia.
É preciso aprender a aceitar
Mas tem vezes que a saudade aperta. E quando ela chega, não tem como segurar. A sensação causada pela saudade e pela angústia de estar longe da família e dos amigos é semelhante a de um parafuso bem apertado que, por mais que coloquemos a chave de fenda certa, insiste em não afrouxar.
Antes eu brigava com a saudade. Me sentia fraca e questionava minhas próprias decisões. Hoje, cinco anos após ter deixado o Brasil, aprendi a entender esse sentimento como qualquer outro da nossa rotina.
A saudade faz parte da vida do imigrante. Em alguns dias com mais intensidade, em outros com menos. Ela é como aquele tornozelo machucado que pode passar dias sem se manifestar; mesmo nos dias em que esse tornozelo não dói, temos consciência de sua fragilidade e, por isso, tomamos todo o cuidado possível em cada movimento. Mas, de repente, explode em uma dor latente que nos impede de andar.
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Como toda decisão, morar fora tem suas dores e delícias próprias. É claro que a tecnologia é uma grande aliada para combater a saudade e nos deixar mais próximos daqueles que amamos, mas tem dia em que se perceber como um rosto em uma tela no celular ou um nome em uma conversa no whatsapp ou no instagram, pesa com mais intensidade.
FOMO
Ao decidir morar fora, temos que entender que combater o famoso FOMO, Fear of missing out, é essencial. Não adianta o quanto você se esforce: você vai perder eventos importantes, você vai fazer menos parte do dia a dia de outras pessoas. Isso, no entanto, não quer dizer que aqueles que você ama vão se esquecer de você.
Eu sempre tento fazer um exercício de reflexão que consiste no seguinte: até que ponto o afastamento que ocorre é natural ou é causado pela distância? Será que se eu estivesse em São Paulo, veria essas pessoas todos os dias?
Com o tempo, aprendi a entender que as mensagens podem se tornar um pouco mais escassas, porque todos temos a nossa correria do dia a dia e nos tornamos, de certa forma, adeptos do “depois eu faço isso”. Depois eu vou mandar essa mensagem. Vou deixar para contar que lembrei desse amigo depois. Depois vou falar como me sinto.
A ideia de morar fora é, de certa forma, acostumar-se com a estranha sensação de ser feliz, ainda que incompleto.
Combatendo a saudade
Ao mesmo tempo que é importante entender isso, é necessário combater esse mal. Me tornei um pouco mais imediatista. Lembrei de um amigo? Então vou mandar mensagem contando isso. Pensei em alguém da minha família? Vou arranjar um tempinho no meu dia para fazer uma ligação, nem que seja de cinco minutos.
Dessa forma, se torna um pouco mais fácil se inserir na vida daqueles que amamos e fazer parte da rotina dessas pessoas. Dessa forma, ver aniversários, nascimentos e festas de longe, se torna menos dolorido. Porque eu sei que essas pessoas estão pensando em mim e elas sabem que também estou pensando nelas.
Ao mesmo tempo, cara amiga imigrante, você precisa entender que o mundo não vai parar só porque você decidiu se mudar para outro lugar. Assim como tem coisas incríveis acontecendo na sua nova vida, seus amigos e familiares também continuarão a viver momentos legais, e você tem que ficar feliz por eles.
O lado positivo
Ao invés de pensar nas piadas que você está perdendo, nas festas que deixou de ir, nos jantares que você não pode comparecer, foque na vida que escolheu para você e tenha a certeza de que aqueles que você ama estarão ali, de coração aberto, esperando pela sua próxima visita.
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E por mais que a gente saiba que a saudade aperta, lembre-se que, quando você voltar, os jantares, festas e piadas serão sobre as divertidas histórias que você terá para contar da vida do lado de cá, das barreiras linguísticas entre o português do Brasil e o português de Portugal, sobre o prato que você pediu no restaurante porque tinha um nome engraçado.
Morar fora é renunciar
Precisamos entender que uma vez que deixamos nosso país, nosso estado, nossa cidade ou até mesmo nosso bairro, nunca mais estaremos completos. Sempre sentiremos falta de um lugar que moramos, das pessoas que conhecemos. Deixamos uma parte de nós a cada lugar que conhecemos e, em troca, levamos um pedaço daquele lugar conosco.
Se nesse exato instante você entrar no avião e voltar para o Brasil, irá sentir falta dos amigos que fez aqui. Do seu prato preferido no restaurante local. Daquela pracinha escondida que você descobriu e se tornou seu lugar favorito para ler um livro longe do caos turístico.
A ideia de morar fora é, de certa forma, acostumar-se com a estranha sensação de ser feliz, ainda que incompleto. Acostumar-se a renunciar a certos momentos em troca de experiências.
Pensar que aqueles que amamos estão a um voo ou uma ligação de distância pode ser reconfortante. Mas, às vezes, quando a saudade aperta e não tem outro jeito, é necessário respirar fundo e se lembrar do seu propósito.