Estudar Direito na França: como funciona?
Após um texto mais geral sobre a graduação na França decidi fazer um mais específico relativo ao Direito. Essa carreira parece ser tão particular e a primeira coisa que eu escuto, quando falo que estou fazendo Direito, na França, é que tudo é muito diferente em cada país e que estou me prendendo ao país no qual decidi cursá-lo.
É verdade que o Direito é uma carreira um pouco mais restritiva que Administração, por exemplo. As equivalências de diploma costumam ser mais simples em cursos com noções unificadas em todos os países. Entretanto, ao escolher um país para cursar essa especialidade não estamos acorrentados a ele pela eternidade.
Dentre as inovações da era moderna, uma delas é o Direito Internacional. Seja ele privado ou público envolve o conhecimento de mais de um sistema jurídico, questão que pode ser benéfica para estudantes em países estrangeiros. Além disso, e acredito que esse ponto vá ser o mais decisivo, aqui, ao se formar em um dos países da União Europeia temos a equivalência para os outros simplificada e muitas vezes podemos prestar diretamente as provas das Ordens dos Advogados dos outros países ou então adquirir o título burocraticamente.
Mas o meu texto não está sendo feito para convencer as pessoas a vir fazer a graduação aqui. A minha intenção é contar um pouquinho sobre como funciona e os contrastes com o Brasil. Como eu já disse anteriormente, cheguei a cursar um ano e meio na PUC e acabei de terminar o segundo ano na Paris 1. Acredito que já tenho a capacidade para uma comparação.
Leia também: Tudo que você precisa saber para morar na França
Bom, primeiro que a nossa graduação é composta por três anos de licenciatura e dois anos de mestrado. Por outro lado, no Brasil fazemos cinco anos de graduação simples. Apesar das optativas que podemos escolher, o sistema brasileiro preza por um estudo de todas as áreas e uma especialização posteriormente no mestrado. Na França, começamos uma pequena especialização no terceiro ano; e no mestrado, então, já escolhemos a matéria que queremos estudar (como no mestrado brasileiro). Isso faz com que já tenhamos muito claro se queremos Direito Público ou Privado e com que estudemos de maneira mais aprofundada aquilo que é de nosso interesse.
Em seguida, é importante destacar que os europeus, no geral, costumam ser mais focados academicamente, o que faz com que eles realmente comecem a estagiar no fim do mestrado. Isso não significa que eu tenha muito mais horas de aula por semana, mas que realmente estudamos tudo que é passado de maneira aprofundada, já que o momento de trabalhar virá mais tarde. É um sistema bom para o estudante, mas pode dificultar o conhecimento das áreas para quem ainda não sabe do que gosta.
Ainda, os intercâmbios são muito mais comuns. As próprias universidades divulgam muito as nossas opções e os estudantes se sentem motivados a passar por essa experiência. Ela pode ser custosa, pois não pagamos as taxas da universidade de destino, e sim a de origem (que no meu caso é pública). Entretanto, devemos arcar com moradia, alimentação, transporte e outras coisas. Para os que não têm condições, algumas bolsas são disponibilizadas e a própria universidade de origem nos informa sobre o processo.
A França, assim como o Brasil, tem seu Direito baseado no civil law (lei civil) que se contrapõe ao common law (lei consuetudinária) da Inglaterra e dos Estados Unidos, por exemplo. De maneira muito simplificada podemos dizer que no primeiro predominam as leis codificadas e no segundo a jurisprudência. Isso faz com que a própria forma de pensar do advogado seja aproximada. Todavia, aqui devemos saber, também, as jurisprudências, algo que nunca me foi cobrado anteriormente.
O último ponto me leva à análise final: a metodologia francesa e suas peculiaridades. Enquanto antes eu respondia provas com questões objetivas e dissertava livremente, agora devo respeitar uma metodologia rígida formada por introdução, parte I e parte II (sendo os dois últimos divididos em A e B, ainda). Não, eu não posso fazer só a parte I e também não posso criar a parte III. Apesar de estranho, a princípio, começamos a entender o sistema depois de um tempo e nos acostumar com essa escrita mais organizada. Por fim, pedem, ainda, muitas críticas juridicamente fundadas, já que a intenção não é apenas reproduzir um entendimento de texto, mas também analisá-lo diante da história e das perspectivas futuras.
1 Comment
Oi, Michelle! A que etapa da universidade você se candidatou? Estou preparando uma candidatura para o L2/L3 de Direito na Paris I (sonho), seria legal conversar com alguém que já passou pelo processo… Abraços!!