Licença paternidade na Espanha.
Há um par de semanas, ao deixar meu filho na creche, vejo que um de seus colegas de classe vem acompanhado de seu pai e não mais de sua mãe, como acontecia habitualmente. Esta família acabava de aumentar e, enquanto a mãe permanecia em casa com o bebê recém nascido, o pai dava conta do primogênito.
Uma mudança recente da lei de licença paternidade aqui na Espanha, dá aos pais o direito a um recesso de 16 semanas, o que permite que os mesmos possam desfrutar e também compartilhar ainda mais das demandas dos filhos.
A nova lei de licença paternidade
Na Espanha, até o ano de 2007, os homens apenas tinham dois dias livres após o nascimento dos filhos. Desde então e durante uma década, esta licença se ampliou a 2 semanas. Um ano depois, em 2018, subiu para cinco semanas e em abril de 2019, passou a ser de 8 semanas.
Com a chegada de 2020, os dois meses se converteram em três e, em janeiro de 2021, as licenças maternidade e paternidade se equipararam pela primeira vez em duração e se tornou intransferível, ou seja, ambos progenitores contam atualmente com 16 semanas de folga, sendo as primeiras seis ininterruptas e as demais podem ser distribuídas ao longo do primeiro ano de vida do bebê.
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Além disso, a extensão da licença é contemplada no caso de nascimento (tutela ou adoção) múltiplas, ampliando uma semana para cada progenitor, por cada filho, a partir do segundo. No caso de filho com alguma deficiência, aumentará uma semana para cada progenitor.
Ao contrário do pai, a mãe pode antecipar o período de licença, de quatro a seis semanas anteriores a data prevista do parto. Ademais esta lei vale para a tutela e adoção de filhos.
A licença paternidade está contemplada no Real Decreto-Lei espanhol sobre medidas urgentes, aprovada em março de 2019, a fim de garantir igualdade de tratamento e oportunidades entre mulheres e homens no emprego e na profissão.
Dinâmica familiar, mercado de trabalho e desigualdade de gênero
Até que ponto o compartilhamento dos cuidados com os filhos continua quando termina a licença paternidade?
O sentido da licença paternidade ser 100% remunerada e intransferível à mãe, como já o foi aqui e é em outros países europeus, transmite a mensagem de que os pais têm o direito e a obrigação de cuidar dos filhos, exatamente nas mesmas condições e nos mesmos termos que as mulheres.
Sim, a ideia é maravilhosa, porém sabemos que a prática está um pouco distante e a mãe ainda manterá a maior carga física e mental.
Outro ponto é que a reformulação da lei, apesar de positiva, não revoga a premissa de que a formação de uma família é mais demandante à mulher.
Se faz necessário uma reformulação que esteja relacionada ao cuidado, parentalidade e trabalho. Apesar da aceitação da licença ser positiva entre os homens, as mulheres continuam a ser as que mais assistem à redução da jornada de trabalho por motivos de assistência.
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Outro ponto questionável é que 16 semanas é uma das licenças maternidade mais curtas da União Europeia, enquanto os pais terão uma das mais longas e mais bem remuneradas do continente.
Isto não resolve nenhum dos conflitos que já existiam entre a maternidade e o mercado de trabalho. As mulheres continuarão desprotegidas após a licença. As que tiverem mais recursos, terão acesso ao afastamento, enquanto o restante terá que escolher entre sair do mercado de trabalho para cuidar dos filhos ou se reincorporar.
Embora existam estatísticas que mostram a diferença de gênero que existe em quase todas as áreas da sociedade – desde o cuidado à vida profissional – no que tange a tarefas domésticas e cuidado com os filhos, não vemos explicitamente o impacto que a carga mental tem na vida das mulheres.
A licença paternidade de quatro meses não foi criada apenas para os homens colocarem mais fraldas, mas com a ideia de que eles se responsabilizem por todas as áreas da parentalidade desde o início.
A carga mental das mulheres
A carga mental, isto é, a quantidade de esforço não físico e deliberado que deve ser realizado para alcançar um resultado concreto, é quase sempre assumida pelas mulheres, o que torna o verbo conciliar mais difícil de conjugar para elas e influi na desigualdade de gêneros do mundo profissional.
Verificou-se em um estudo que 58% das mulheres espanholas, depois de serem mães, tomam decisões que implicam certa renúncia (redução da jornada trabalhista, licença ou pedido de demissão) em sua carreira profissional, frente a 6,2% dos homens.
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Nestas atitudes há duas causas: os fatores externos, sociais e legais, que favorecem que a mulher estacione seu trabalho em nome dos seus filhos; e as barreiras internas, que elas mesmas se autoimpõem. Porque, mesmo antes de terem filhos, cabe a elas – culturalmente permeando o inconsciente – cuidar deles; mesmo que ambos os pais ganhem o mesmo é quase sempre a mulher que limita sua vida profissional.
Há ainda muito a ser feito e compartilhado dentro e fora do lar!
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