Não sei se vou ou se fico – quando a dúvida paira no pensamento do imigrante.
Ontem, o que era apenas um sonho de viver em um outro país, conhecer novas culturas, conviver com outro círculo social, aprender um idioma, hoje é a realidade. Mas e o amanhã?
Será que vou manter o mesmo encantamento, as mesmas ânsias por descobertas, a mesma vontade em seguir adiante ou tudo isso irá passar e os mesmos conflitos tomarão conta novamente dos meus pensamentos?
A verdade é que quando se decide mudar de país, seja com ou sem data definida de retorno, o que se espera é sempre algo novo e melhor – uma sacudida naquele corpo cansado e já desanimado. Pois do contrário, para que deixar o lar?
Há muitos artigos disponíveis na internet com passo a passo para realizar um bom planejamento antes de embarcar nesta aventura. E com certeza, com dicas importantíssimas que devem ser lidas e relidas antes de migrar.
Porém, acredito que o mais importante é a autoanálise. Antes de buscar um espaço novo para viver e fazer um rastreio minucioso do funcionamento daquele país, é necessário uma viagem interna.
O autoconhecimento
Ao utilizar o cenário brasileiro atual e usá-lo como parâmetro para decidir partir, é bem provável que a lista de pós e contras seja bastante imparcial.
Não é desejo do ser humano viver sob injustiças, inseguranças, intolerâncias e desconfortos.
Agora, uma decisão de tamanha importância como migrar para outro país, não pode ser pautada apenas no ambiente em que estamos e nas ocorrências que vão além do nosso controle. Enfim, mesmo diferentes e talvez menos impactantes, toda nação carrega suas agruras.
Que tal então expandir os motivos que te levam a querer partir? Comece olhando para si. Como você é, quais as suas afinidades e preferências, o que é imprescindível na sua vida. Traços de personalidade podem sim influenciar diretamente na adaptação dos imigrantes.
A solidão é um dos grandes acompanhantes dos que decidem deixar o país, então se você não lida muito bem com o estar só, repense. Não que isso seja um impeditivo, mas que deve ser preparado.
Este processo de autoconhecimento e de repensar sempre sobre quem somos, não para quando já se está longe de “casa”. É importante que seja constante, pois antes de ser uma nacionalidade, você pertence a este ser, que deve ser ouvido.
Compreender, através do autoconhecimento, se algumas emoções que está vivenciando são causadas pela dificuldade de adaptação ou se estão relacionadas a conflitos anteriores e mais amplos – “fugir” de um espaço não é sinônimo de resolução de conflitos. É possível sim não lidar com eles e se ajustar, mas desde que esteja ciente.
A bagunça emocional
Adaptar-se a um novo país não é tarefa fácil, enfim no país de origem estão todas as referências – a família, a comida, os amigos, o idioma. Agora é necessário se reinventar e se descobrir novamente como pertencente a outro espaço físico e social.
É natural a sensação de não pertencimento e esse sentimento de inadequação contribui para a fragilidade emocional, principalmente em decorrência da falta de identificação.
Saiba que é legitimo estar triste, insatisfeito ou sentindo-se incompleto mesmo estando no país dos seus sonhos, assim como é legitimo estar super feliz – esta tal bagunça emocional.
A adaptação em si e todas as mudanças influenciam o humor e é preciso aprender a lidar de maneira mais leve. A forma como você gerencia as suas emoções pode ajudar ou ao contrário, te fazer desistir das aventuras, antes de experimentar todas as possibilidades.
Cuide de você! É preciso estar bem consigo mesmo independente da localização geográfica.
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O migrar como processo de luto
Quando se está em um novo país, o desejo pela adaptação, por inserir-se neste novo contexto, por pertencer àquele ambiente é tamanho que desejamos acelerar o tempo, pois precisamos dessa incorporação para nos sentirmos bem – acontece que não é assim.
O tempo conta diferente e é preciso muita paciência. Seja gentil consigo mesmo e não se cobre tanto.
Pode chegar o tempo em que a lua de mel acaba e as pequenas dificuldades se tornarão grandes problemas e então as diferenças culturais passam a ser irritantes. É possível que surjam frustrações e impaciência, que você comece a sentir que não tem controle sobre a própria vida e comece a idealizar a vida que levava no país de origem.
Neste momento há uma grande possibilidade de você encontrar diversas razões para não gostar do país e passar a criticar as pessoas e a cultura, quando na verdade é você que não o está acolhendo – e o rejeitando na verdade.
Se e quando isso acontecer cabe ao imigrante ajustar-se e buscar o caminho da adaptação, ressignificando-se e permitindo abrir-se para o novo ou isolar-se e manter a decisão de relacionar-se apenas com brasileiros, tentando fugir de qualquer aproximação mais real com a nova cultura. Uma irreal tentativa de manter a vida de antes em um novo espaço geográfico.
Para completar o processo de luto (sabendo que pode ser aberto novamente a qualquer tempo) é esperado que o imigrante se ajuste e se adapte, desenvolvendo a habilidade de resolver problemas e cultivando sempre a resiliência.
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Não sei se vou ou se fico
Continuar a viver em um lugar no qual não faz parte e onde não se reconhece, é sofrível. É mais um sobreviver!
Em tempos atuais, muitos imigrantes estão se questionando sobre a viabilidade emocional de continuar distante de suas raizes. Há um peso gigante pairando sobre a existência e sobre as prioridades.
É um momento de racionalizar sobre o irracional emocional; onde há danos em ambos os lados, e que se faz ainda mais necessário o autoconhecimento e a validação dos sentimentos. É tarefa árdua para o imigrante!
Migrar é vivenciar a dor da morte na ida e na volta. Na ida as referências precisam ser deixadas para trás, mas a volta também pode ser assustadora ao se deparar com a sensação de perder o controle e o carinho com aquilo que um dia foi tão conhecido. Enfim, o tempo passou para todos e nada mais está como o deixado ao partir.
Recomeçar aqui, ali ou acolá. Ir ou ficar. Para tudo, é necessário trazer a aceitação e a ressignificação para dentro das nossas vidas.
2 Comments
Parabéns pelas precisas e honestas informações. Adoro a Europa todas as 3 vezes que visitei fiquei encantado.
Tenho intensões de morar em Madrid ou Barcelona ou qualquer outra cidade. Como autônomo creio que será
mais fácil o tramite do visto, mas um bom colchão de Euros é obrigatório para aguentar o primeiro ano.
Obrigada Adilson, por ler e comentar.
Se desejar, escrevi recentemente um artigo sobre como ser autônomo na Espanha, aqui mesmo na plataforma BPM.
Abraços e boa sorte.
Marcela