Meus pais estão doentes e eu moro fora do país. Como é difícil conviver com isso!
Estou fora do Brasil há quase cinco anos, tendo morado primeiro na Itália (em Torino) e, desde 2016, na França (em Lyon). Viemos eu, meu marido e dois gatos – brasileiros, também, e que têm mais documentos do que nós mesmos! Queríamos ter a experiência de morar um tempo no exterior e essa motivação tornou tudo muito fácil, inclusive o complexo momento de dar adeus aos nossos pais idosos (todos entre 70 e 82 anos) e ir embora sem data para retornar.
Por um lado, a tecnologia de hoje facilita tudo e mais um pouco. Com baixo ou até mesmo zero investimento, falar com o Brasil é muito simples, e há um sem número de opções. Mas, dependendo da situação, só mesmo um “tele-transporte” ou uma “bilocação” ajudariam – por exemplo, quando nossos pais estão doentes.
E este é o meu caso. Meus pais têm 82 anos cada um e estão com uma condição de saúde bem debilitada. Estamos em dezembro e eu já fui ao Brasil, só este ano, quatro vezes. Em cada uma delas, fiquei por ao menos quatro semanas. Como sou coach executiva, tenho o privilégio (e agora, mais do que nunca, vejo isso claramente) de poder trabalhar de qualquer canto do planeta, desde que tenha um computador, uma boa linha de Internet e um canto sossegado. Mas ainda que essa mobilidade facilite minha vida, estar fora de minha base – no caso, a França – dificulta bastante os contatos e a atividade de busca de novos clientes.
Leia também: As redes sociais na vida de um imigrante
Essa difícil situação também me fez ver ainda com mais carinho e gratidão o marido companheiro que tenho: além de suportar com paciência minha ausência durante esses longos períodos, ainda me suporta incondicionalmente nos meus dias de ansiedade e tristeza.
E “ansiedade” talvez seja uma boa palavra nestes momentos complicados. É realmente muito duro você estar longe e ver seus pais em uma situação problemática. Ainda que tenha irmãos no Brasil é impossível não ficar imaginando se você já fez tudo o que poderia ter feito para suavizar a condição deles e dar um pouco mais de conforto. A cada viagem, revisitar vários check-lists em sua mente, no esforço para não se esquecer de nenhum detalhe que possa vir a fazer a diferença depois que você for embora. Rever todos os telefones de emergência, verificar os contatos de pessoas que serão úteis, avaliar se os cuidadores e outros profissionais de apoio estão realmente fazendo o trabalho para o qual foram contratados e de acordo com o padrão de qualidade que você sabe que seus pais merecem.
Leia também: tudo que você precisa saber para morar na França
Outra palavra que pode estar bem presente nesses momentos é “culpa”. Ao mesmo tempo que você reconhece que estaria super infeliz se abdicasse da sua vida fora do Brasil, o fato de não estar ao lado dos pais soa como uma ingratidão sem fim. No meu caso, um típico tipo 1 do Eneagrama(*), a personalidade que inconscientemente quer ser um modelo de “boa menina” e fazer tudo o mais certinho possível, sofro ainda mais, pois o “crítico interno” passa um bom tempo dentro da mente questionando a minha conduta e me perguntando se eu não estou sendo má e egoísta.
Sabe o que me ajuda nesses momentos, suaviza a dor e me traz certa tranquilidade? Lembrar que cada um de nós tem uma experiência que deve ser vivida. Dependendo da religião ou da crença de cada um, isso se explica de um jeito diferente. Se eu largasse e desistisse de minha vida na França em prol de estar novamente no Brasil para cuidar dos meus pais, essa frustração bateria à minha porta mais cedo ou mais tarde. E, segundo os psicólogos, o arrependimento de não ter feito algo por aquilo que era importante para você é uma das emoções mais devastadoras que existe na vida de uma pessoa. É uma mistura de omissão com inatividade e mais uma série de emoções e sentimentos danosos. Pois, o tempo passa, e rápido, e para tudo na vida há um tempo justo e certo.
Nesse sentido, retribuir e mostrar meu amor aos meus pais (e a meus sogros, também) em todo o tempo físico que eu estiver com eles, passa a ser um objetivo primordial. Não sei quanto tempo mais os terei por perto (ainda que “por longe” na maior parte das vezes, devido à distância), mas que, nos preciosos momentos que estiver ainda com eles, eles possam ter certeza de que são amados incondicionalmente e que eu sou muito grata por terem contribuído para que eu seja a pessoa que sou e pela vida que me deram. Amém.
(*) O Eneagrama é um estudo muito profundo das 9 personalidades existentes, que mostra nossos esquemas de pensar, sentir e agir e nos ajuda a quebrar nossas reações automáticas em momentos de stress ou de calma absoluta. É muito útil no trabalho e nos relacionamentos, pois nos auxilia a sermos mais atentos e compassivos em relação às pessoas que nos cercam.
2 Comments
Olá, tudo bem?
Li seu texto e confesso que fiquei com um nó na garganta…Imagino o quanto seja difícil conviver longe dos seus pais.. O que eu posso te dizer é que aproveite o máximo de tempo com seus eles…a carreira pode ser retomada eo tempo com os pais não…te digo por experiência…
Um forte abraço.
Olá Linda. Obrigada por suas doces palavras, que enchem meu coração de esperança por dias melhores para todos nós. As escolhas da vida não são mesmo fáceis, não é? Obrigada por sua generosidade em deixar uma mensagem por aqui. Um ótimo Natal pra você! : ))