Escrever sobre as mulheres de São Tomé e Príncipe não está sendo fácil para mim, já comecei e parei várias vezes. Talvez pela realidade por vezes dolorida e contraditória que vejo aqui. Sei que não é muito diferente de alguns lugares no Brasil, mas aqui vejo muito de perto, então convivo com ela. É muito triste observar, que no mesmo mundo, no mesmo planeta ou até mesmo no mesmo país, há vários níveis de desenvolvimento humano, incluindo a valorização da mulher.
Por isso, está sendo difícil escrever sobre este tema, pois me dói. Lembro do poema de John Donne, “se me perguntarem por quem os sinos dobram, eles dobram por ti”, pode parecer piegas mas é verdadeiro. Dói porque me vejo neste lugar, pois sou parte do gênero mulher ou do “gênero humano” como está no próprio poema.
Enfim, já deu para perceber pelo que escrevi até agora, que em São Tomé e Príncipe, ainda não chegou a igualdade feminina, pelo menos em relação aos direitos e costumes. Os homens são machistas, talvez nem sabendo ou entendendo conscientemente, mas são. Isto se dá desde a forma como eles “paqueram” ou “mexem” com as mulheres nas ruas, incluindo as estrangeiras, até no comportamento e tratamento diário com suas famílias e esposas. Talvez as mulheres não percebam tanto, pois nasceram aqui e para elas pode ser “normal” ou comum este comportamento por parte dos homens. Fico me perguntando de uma forma geral, quantas coisas “aceitamos” ou convivemos, sem saber que é absurdo! Pois tudo é uma questão de abrir os olhos, iluminar, enxergar, e com quantas coisas, de um modo geral, ainda estamos habituados a conviver porque ainda “não enxergamos”. É, este texto está me inclinando a reflexões.
Mulheres em aldeia de pescadores no Centro da cidade de São Tomé(acervo pessoal)
Em São Tomé, é comum os homens terem mais de uma mulher e família e elas têm conhecimento disso, embora nem todas concordem. E isso não ocorre apenas na faixa de população mais carente, e também não é uma questão religiosa, pois a grande maioria é católica.
Também há casos de violência física contra a mulher, o que levou o governo a fazer uma grande campanha contra isso. Assim que cheguei no país, assisti várias vezes na televisão local um comercial desta campanha, era uma encenação de violência e ao fundo uma música que dizia algo como “em mulher não deve-se bater e sim amar”. Desde este momento, percebi como esta questão é forte por aqui.
Conversando de vez em quando com a moça que me ajuda aqui em casa, fico sabendo como é o dia a dia delas, pelo menos desta faixa da população. Normalmente as mulheres cuidam dos filhos, trabalham fora e cuidam da casa. Dificilmente os homens as ajudam dividindo com elas as tarefas domésticas ou o cuidado com os filhos. Existe uma certa aceitação por parte delas, sinto que pode ser pela falta de confiança de que as coisas podem mudar e também por medo. Medo de violência, medo de ficarem sozinhas, medo de perderem o apoio financeiro para elas e para os filhos… enfim, medo! Uma outra menina que conheci aqui, disse que quando ela reclamava com o marido pelo fato de ele ficar muito tempo num bar bebendo, ele a batia. Ela contava em tom de reclamação, mas uma reclamação branda, não como algo absurdo. E como dar minha opinião? Mas também, como só ouvir?! Então falava alguma coisa sutil, que a fizesse pensar, pois até para ajudar é preciso sensatez. Acho que deveria haver aqui um centro de defesa ou apoio às mulheres, pois percebo que elas se sentem sós.
Ressalto para o fato de estar falando genericamente. Não são todos os homens que agem desta forma descrita até aqui!
Apesar disso tudo, as mulheres têm um papel fundamental na sociedade santomense, tanto na economia do país como na família.
Elas estão presentes em todos os setores e posições, desde vendedoras de produtos no mercado central ou nas ruas e nas colônias de pescadores, até gerentes de centros e casas culturais, gerentes de bancos, proprietárias de negócios, médicas, deputadas, escritoras. Neste momento em que escrevo, há até uma candidata à presidência da República!
Portanto, acredito que este processo da igualdade feminina em São Tomé e Príncipe, já esteja a caminho. Será uma conquista assim como tantas outras que estão em curso no país.
Há uma outra e delicada questão que diz respeito a algo mais sério ainda, a prostituição infantil. Na verdade esta realidade, infelizmente, não é exclusiva de São Tomé, em muitos lugares do mundo isto ainda acontece.
Enfim, há muito o que evoluir, não apenas aqui neste país onde estou morando, mas no meu próprio e no mundo em geral. Precisamos evoluir como seres humanos, tentar nos envolver com os problemas sociais, pois, como disse no início deste texto, o problema de um deveria ser o problema de todos. Só assim alcançaríamos um pouco de paz para o mundo!
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Gostei muito deste seu post. Muito verdadeiro. Obrigada pela sua delicadeza face à um assunto sensível.