Últimas impressões da Ilha de Man: a partida.
Depois de dois anos vivendo na Ilha de Man decidimos nos mudar. Resolvi que para me despedir completamente, eu precisava fazer um balanço entre as primeiras impressões, meu primeiro texto neste blog e, o que aprendi nesse tempo. Queria pensar sobre as impressões, agora não mais no sentido de primeiro contato, mas no sentido de marca: afinal, o que a Ilha de Man deixou impresso em mim?
Durante esses dois anos o pequeno ponto no mapa do mar irlandês se tornou meu mundo. No início me senti tateando tudo, meio receosa e com um pouco de medo de não saber viver naquele país, mas eu soube, ou pelo menos me esforcei bastante para isso. Aos poucos fui me sentindo à vontade com a vida na ilha, fui conhecendo cada rua, cada praça e tendo noções da cultura manx.
Testemunhei duas vezes o país mudar sua pacata rotina para um agitado e badalado local que recebe uma quantidade de turistas que somam metade da população da ilha. Todo ano, durante duas semanas, essa mudança acontece por conta da famosa e mais perigosa corrida de motos do mundo, o Tourist Trophy – TT. E para entender precisa ler o artigo a corrida da morte na Ilha de Man.
Fui me habituando ao tempo frio, não vou dizer que passei a gostar dele, mas de certa forma soube lidar com suas nuances. Meu nariz ainda fica vermelho, mas eu não passo frio. Depois do inverno, quando as temperaturas começam a alcançar os 12° eu me sinto muito bem, chego até a dizer que está “quente”. Obviamente não sinto calor com essa temperatura, mas fui me adaptando ao tempo constantemente frio e sinto que a temperatura está agradável. Passei a apreciar as mudanças do inverno até a chegada primavera, esse foi assunto de outro artigo que conto como o país costuma vivenciar a mudança de estação.
Também aceitei o fato de não recebermos muitas visitas do Brasil porque o país está fora das rotas turísticas famosas, assim é a vida. Posso garantir que quem não foi à Ilha enquanto estávamos lá, perdeu a oportunidade de conhecer um país incrível cheios de particularidades.
Não sei tudo sobre a Ilha, mas o que aprendi foi muito importante. O sentido de comunidade, o sentimento de indignação diante do que está errado, a cordialidade, a simpatia, a honestidade, a organização, o cuidado com o que é público, dentre tantas outras coisas.
Foram conceitos que fui compreendendo a cada acontecimento diário. No meu último dia de trabalho saímos para jantar e uma amiga perdeu um daqueles braceletes de prata que tem penduricalhos que você compra de acordo com o seu gosto. Ela postou em um grupo de facebook de achados e perdidos a informação de que havia perdido o objeto perto do restaurante que fomos e que o bracelete tinha um grande valor sentimental, pois foi um presente que ela ganhou de aniversário de 22 anos de casamento. Não demorou muito o bracelete já estava em suas mãos. São coisas assim que acontecem na ilha frequentemente.
O país tem defeitos, claro, conheci alguns deles e selecionei 5 motivos para não morar na Ilha e em compensação apresentei 10 para morar na Ilha, porque sem dúvida existem mais coisas boas do que ruins nesse pequeno país.
Fiz ótimas amizades, pessoas legais que me acolheram e tornaram importantes no processo de adaptação ao país. Cada uma com sua história de vida, vindas do Brasil ou de outros países e, que espero muito reencontrar em um futuro próximo.
Nesse período que morei na Ilha de Man, percorri o país de norte a sul, leste a oeste diversas vezes, não que isso queira dizer muita coisa se levarmos em conta que essas distâncias são curtíssimas. Eu digo no sentido metafórico, consegui conhecer bastante a ilha e isso foi muito bom. Nada melhor que poder explorar os encantos de onde você mora e isso vale para qualquer lugar.
Acho que aprendi o real significado de tranquilidade e segurança. Não passei por nenhum outro lugar que eu tenha me sentido mais segura do que a Ilha de Man, talvez só quem tenha vivido lá pode entender isso com profundidade.
Fico satisfeita em saber que conheci lugares como Douglas, Port Erin, Peel, Laxey, Port St Mary e tantos outros, cada um com sua beleza e com algo em comum, uma vista constante para o mar que não nos deixa esquecer que estamos em uma ilha.
Elegi lugares favoritos e fiz deles meu refúgio, caminhei pelos glens, andei de bicicleta, experimentei restaurantes, assisti o sol se pôr às 22h no verão e às 16h no inverno. Essas experiências são aquelas que o dinheiro não compra e que guardamos com carinho. Na minha bagagem levarei a lembrança das lindas paisagens tanto na memória quanto no meu arquivo de fotos e, também a alegria de ter podido compartilhar um pouco sobre a vida nesse lugar.
Por fim, agora é hora de dizer adeus, preparar-se para uma nova etapa, uma nova cultura, um novo país e uma nova língua. Só posso dizer muito obrigada à Ilha de Man por me receber tão bem nesses dois anos. Levo comigo as amizades que fiz, o carinho das despedidas, mensagens, presentes, mas o mais importante, a certeza que a vida está em constante mudança, algumas maiores ou menores. A impermanência é realmente algo que precisamos compreender, afinal a experiência da vida é isso.
3 Comments
Priscila Valverde, como você conseguiu morar e permissão de trabalhar na ilha?
Seria sensacional ela contar um pouco do processo pra gente!
Obrigada por comentar! Ainda publicarei alguns textos sobre a Ilha de Man, e quem sabe os próximos podem contar sobre a minha adaptaçao no novo país.