Eu sempre fui uma apaixonada por viagens, a maioria das vezes já começava a planejar as próximas férias antes mesmo delas terminarem. Planejar uma viagem é sempre algo desafiador, apesar de achar muito divertido. Planejar uma viagem com outras pessoas, seja amigos ou marido, é mais desafiador ainda já que temos que conciliar diversos gostos e vontades, e se as “outras pessoas” são crianças, há muitas outras coisas a se levar em conta no planejamento, podendo transformar tudo em um grande quebra-cabeça. Agora, quando o planejamento é de uma viagem com crianças por muitos meses consecutivos, bom, você pode imaginar o tamanho do desafio que tem pela frente.
Do momento que eu tive a ideia até partir, foram cerca de 18 meses. Precisei deste tempo todo muito mais para conseguir juntar o dinheiro do que no planejamento do roteiro em si, mas também utilizei cada minuto que tinha em pesquisa. Primeira coisa que você precisa saber sobre uma viagem de volta ao mundo, ou long term travel (viagem de longo tempo, numa tradução livre) como acho mais adequado falar: você não vai conseguir ver tudo. Aliás, não vai conseguir chegar nem perto disso. Pelos meus cálculos, seriam necessários pelo menos três vidas inteiras viajando para conseguir conhecer adequadamente todos os lugares que quero, e esses são só os que eu tenho conhecimento. Eu cortei lugares como Vanuatu, Fiji e Marrocos com uma dor no coração.
Outra dica importante: não é uma corrida. Acredite, não vale a pena visitar 20 países em 3 meses e não conseguir conhecer realmente cada lugar. Primeiro porque, e isso é uma opinião pessoal, um país é muito mais que seus pontos turísticos, e só tendo tempo para explorar uma cidade conseguimos ver isso com mais clareza. Pode ser uma experiência bem diferente do que estamos habituados em nossas férias usuais, mas é também muito enriquecedor e eu recomendo fortemente. Depois, que ficar pulando de cidade em cidade é muito cansativo (você ficará exausto em menos de um mês), além de ser muitíssimo mais caro. E você não quer isso para seu ano sabático.
Montar o roteiro é muito pessoal. Qual seu interesse: praia, trilhas, natureza, cidades cosmopolitas, experiências espirituais, culturas exóticas. Há de tudo neste mundo, para todos os gostos. Para começar, faça uma lista dos lugares que quer conhecer. Eu fiz esse processo junto com as crianças, sentamos e discutimos que lugares cada um queria conhecer. Porém, eles são crianças, é claro, e não tem tanto assim a dizer sobre o assunto, portanto fiz questão de incluir as poucas sugestões que eles deram (meu filho queria conhecer a China, a caçula queria ver cangurus e coalas, a mais velha queria ver neve). Pegue uma folha com um mapa-múndi impresso e marque cada um dos pontos da sua lista. Pronto, essa foi a parte fácil.
Agora vem a parte complicada. Se meu sonho é ver o festival das tulipas na Holanda de nada adianta chegar lá em outubro, bem como não é uma boa ideia ir para a Tailândia em junho, quando a época de monções está a toda. E de preferência tente ir na baixa temporada, que é sempre mais barato. Então você pega aquela sua lista de lugares, escreve do lado quantos dias pretende ficar em cada lugar e tenta montar o quebra-cabeça para chegar em cada lugar numa época mais ou menos decente. Vai ser impossível ficar perfeito, mas dá para encaixar de maneira satisfatória. E use esse primeiro esboço como base para decidir que lugares serão cortados, para qual lado você vai primeiro (leste ou oeste) e, o mais importante, quando vai partir. Lembre de pesquisar sobre a necessidade de visto nos países que quer visitar.
Algumas dicas práticas e super úteis:
Depois que tiver esse esboço, marque uma data para partir. Tem que ser algo realista, que te dê tempo de acertar as coisas, juntar a grana, afinar o planejamento, mas que seja uma data real e palpável. Sério, depois que você decidir a data, e internalizar ela, fica muito mais fácil trabalhar para fazer ela acontecer, e diminui muito a chance de seu sonho virar isso, só um sonho. Existem lugares incríveis nesse mundo e muito baratos. Na hora de determinar quanto tempo vai ficar em cada lugar e que países vai conhecer, leve isso em conta. Meu orçamento de viagem no Camboja e no Vietnã ficou em cerca de 60 dólares por dia para nós quatro, com tudo incluído. No Japão, passou de US$ 180. Olhe com muito carinho para a possibilidade de ficar em hostels, nós ficamos em diversos até agora, em quartos compartilhados ou individuais, e só tenho coisas boas a dizer sobre isso. Além de ter conhecido muita gente legal, meus filhos desenvolveram um senso incrível de respeito pelo espaço dos outros e do coletivo. Se você está sozinha é sempre a opção mais barata, mas às vezes um hotel normal pode ser mais barato se for para mais pessoas, portanto recomendo dar uma olhada nesses também. E mulheres, por favor, não tenham medo de ficar em hostel, em geral eles são ótimas opções, já fiquei em muitos e nunca tive nenhum problema, com ou sem crianças.
Viajar com crianças é algo incrível, eles conseguem ver diversão em praticamente qualquer coisa. Esqueça a ideia de que viagem boa para criança deve ser para algum parque temático. Você pode ficar tranquila que dificilmente vai conseguir deixá-los entediados, e não tenha medo de incluir qualquer coisa. Eles vão amar qualquer programa que você propor, museus, praias, templos, parques, desde que você esteja lá. E eles são verdadeiras esponjas, absorvem tudo que está ao redor, então se aproveite disso e apresente tudo que puder para eles, eles estão formando a visão de mundo deles, e nada melhor do que ter muitas opções para isso. Mas, é claro, é muito importante ouvir a opinião que eles formaram, e isso se resume em dar atenção e conversar, assim juntos nós vamos descobrindo o que mais gostamos e adequando nosso plano. O roteiro é mutável e está aberto para qualquer tipo de alteração que decidirmos, afinal nós só temos que fazer aquilo que quisermos.
Seja por querer mudar de país ou sair viajando loucamente pelo mundo como eu, você está pensando em mudar radicalmente de vida. Isso inclui largar todo o seu mundo para se lançar no imenso desconhecido à sua frente, e esse é um momento delicado e absurdamente apavorante. Por mais que você tenha planejado, no fundo você sabe que é impossível ter o controle de tudo, que coisas darão errado, roteiros cuidadosamente idealizados sairão dos trilhos. Mas você também sabe que vai conseguir lidar com cada uma das adversidades da melhor maneira que puder, que no fundo você tem sim essa capacidade, e depois que você abraça essa realidade, as coisas ficam muito mais fáceis e menos assustadoras. Mas há aquele momento, aquele segundo antes do pulo, entre tomar fôlego e tirar os pés do chão, em que não há mais amarras nem segurança, em que tudo está em suspenso e é impossível não ser tomada por dúvidas. Mas, então, você atinge o outro lado, e descobre que tudo valeu a pena.
1 Comment
Que experiência incrível! Adorei o relato! Parabéns pelo texto e pela coragem de fazer tudo isso. Pessoalmente, acho que está sendo uma experiência maravilhosa para seus filhos! ????