Há dois anos, iniciei uma jornada interna em busca de mim mesma. Saí do Rio de Janeiro para estudar em Braga, Portugal, em busca de desafios e com a necessidade de entender quem realmente sou. Além de roupas, nas poucas malas que trouxe havia esperança, medo, vontade de aprender e me reconhecer.
Sm, eu venci a ansiedade e minhas frustrações. Consegui, finalmente, deixar para trás velhas máscaras que usei, e hoje não moldam mais meu rosto. Ganhei anos de vida! Nessa busca interior, percebi que sou uma ótima cozinheira, resgatei minha fé na vida, deixei de me importar com o que os outros pensam quando me pegam cantante em alto e bom som na rua, abri a mente para conhecer os artistas portugueses e me deparei com um repertório maravilhosamente eclético de fados, rock e pop, e ainda me permiti a dançar o rancho (dança folclórica portuguesa).
Neste mês, completo 730 dias fora de meu país. Além da saudade de minha família, considero-me uma portuguesa do Minho com orgulho e um pouco de sotaque. Nesse tempo, experimentei novos sabores, muitos vinhos e ainda mais amor. Fiz novas amizades, aceitei a minha não vocação para tomar banho de mar, deixei-me enamorar pelo ginásio e crossfit, mudei meu corpo sem culpa e pecado, envelheci e reaprendi a ler nos cafés vendo a vida passar, sem pressa.
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O mais importante de tudo é sentir orgulho por ter vencido um difícil desafio e saber que inspiro pessoas com minha história. Respondo às perguntas dos incrédulos que é preciso muita coragem para deixar suas conquistas para trás e recomeçar. É preciso motivação e altas doses de crença em si mesmo.
Por isso, resolvi escrever este texto. Quis relembrar o árduo caminho até aqui e como tudo o que vivenciei tem ajudado na minha reconstrução. Aconselho aos que planejam iniciar uma nova caminhada que se perguntem o real motivo de deixar o Brasil. Sei que as coisas não andam fáceis do outro lado do oceano, mas garanto que a vida aqui não é nada tranquila.
Principalmente, quando tomamos a decisão numa fase mais madura e estabilizada financeiramente. Digo isso porque foi o meu caso, e por vezes ainda me pego a comparar situações. Há muitas diferenças culturais, e é preciso aprender a lidar com isso. Senão, todo o sonho desmorona.
Se fosse possível resumir, diria que é preciso ter fé, coragem e foco, além de bom planejamento financeiro. Sei que cada um tem o seu motivo para reconstruir a vida em outro país. O meu foi o desafio de romper com a zona de conforto e me dar uma nova oportunidade de viver. Qual é o seu? Pergunte-se e aguarde a resposta. Entenda e planeje. Fará diferença conhecer as peculiaridades culturais e financeiras de onde quer morar.
Geralmente, somos movidos por sonhos. No meu caso, por exemplo, escolhi Braga por ser a terra de meu pai. Tenho uma ligação emocional forte com a cidade. Mesmo assim, tive um choque cultural brutal nos primeiros meses e pensei em desistir em alguns momentos.
É bom, mas nem tanto
Portugal é um país lindo. O Minho, uma região encantadora, mas que ainda conserva, infelizmente, mentalidade de cidade pequena. O país é socialista, liderado por Primeiro-Ministro e que tem o Presidente da República mais encantador que conheço: Marcelo Rebelo de Sousa adora agradar seus eleitores com selfies, abraços e beijinhos. O custo de vida é alto para os padrões salariais, mas a educação funciona e a saúde, mais ou menos. Pode não ser difícil conseguir trabalho, o problema está nos contratos, no percentual de desconto para imposto de renda e escassez de benefícios.
Portanto, não venha para Portugal achando que vai ficar rico. Nosso colonizador nos ganha pela qualidade de vida. Sair à rua tranquilamente para caminhar, poder andar livremente sem se preocupar com assaltos, tiros e sei lá mais o quê. E ainda tem leis avançadas, como o direito às mulheres ao aborto. Outro ponto positivo é o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), que ajuda verdadeiramente na recolocação de pessoas desempregadas, oferecendo cursos profissionalizantes com ajuda de custo para transporte e alimentação. Gostei muito do atendimento que recebi e já planejo minhas formações para ajudar a conseguir trabalho.
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Fora isso, a experiência tem que ser individual. Cada um traz na bagagem uma dor, uma saudade, uma história e a vontade de contá-la. Umas mais alegres, outras tristes e pesadas. O que devemos perseguir, na verdade, é uma vida melhor e mais feliz.
Braga deu-me uma nova casa, um novo amor, a construção de minha família, uma nova profissão e uma pequena horta na varanda do meu apartamento. Aqui, passei a dedicar tempo para minha felicidade. Diminuí o ritmo de vida.
Nesse emanar de coisas boas, permiti-me viver sem correria e pude verificar que o tempo também pode passar mais devagar. Com isso, meus dias são repletos de atividades. Além do ginásio e do estudo e escrita da tese, ganho as ruas em demoradas caminhadas pela manhã ou no final do dia, gosto de correr pelas ruas da cidade aos fins de semana, aprecio mais o pôr do sol e a luz da lua (às vezes, acho que Portugal está mais próximo do céu, tamanha é a beleza do luar!). Também gosto de escolher um bom restaurante (daqueles caseiros mesmo!) para degustar um bom prato e vinho locais.
Costumo dizer aos meus amigos que a minha vida recomeçou no dia 24 de setembro de 2017, quando desembarquei em Porto. De lá para cá, vejo que o universo tem sido muito gentil comigo. Hoje, tenho a certeza de que pessoas felizes, bem resolvidas, que gostam de aprender e tentam levar a vida de forma simples, são recompensadas. Por isso, tenho procurado recompensar este presente que ganhei, tentando ser uma pessoa melhor, valorizando ainda mais a minha cultura e abrindo a mente para assimilar muitas novidades. O que quero para o futuro? Continuar a trilhar este caminho com fé, coragem e foco.
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Adorei seu texto! Espero um dia me sentir assim, feliz, realizando meu grande sonho de morar na Europa. Felicidades!