Entrevistei a Carla Guimarães, escritora e roteirista, autora do livro Os Últimos Dias de Carnaval, que mora em Madri. Ela fala sobre a vida na Espanha e a experiência de escrever livros em espanhol.
Por favor, fale um pouco sobre você e da sua trajetória.
Eu nasci em Salvador e vim para Madri fazer um curso de roteiro em 2001, na Escola Universitária de Artes e Espetáculo TAI e quando os estudos terminaram, decidi ficar porque tinha gostado da experiência. A Espanha tinha uma igualdade social muito grande e isso me chamou muitíssimo a atenção. Igualmente, senti a necessidade de viver a experiência de morar em outro país, em outro idioma e escrever em outra língua que não é a minha.
Como o fato de você ter vindo para a Espanha influencia na sua obra?
A Espanha foi o país em que tive que pagar minhas contas, que encontrar trabalho, foi o país onde amadureci. Creio que o que mais influenciou foi ter vivido esta fase da minha vida aqui.
E sobre quais temas você escreve?
Trabalho muito a questão da imigração porque é um tema que não sai da minha cabeça. Tenho roteiros de cinema, documentários, curtas, peças de teatro, artigos para o jornal El País. Lancei um livro “En los últimos dias de Carnaval” com uma editora hispano-brasileira, a “Ediciones ambulantes”. Este ano, um filme cujo roteiro assino, “Estranhos”, será lançado no Brasil; outro chamado “Perto do Céu” está em fase de captação de verba. No teatro, a última peça que fiz, “La increíble estória de la chica que llegó a la última”, e fui candidata aos Prêmios Max de teatro. Ela também foi para o festival New Plays from Europe, na Alemanha, e foi esta obra que me deu mais felicidade até agora.
Este ano trabalhei como roteirista no programa “Destino Brasil”, da HBO, que era uma série de documentários que abordavam o aspecto humano do futebol desde diferentes pontos de vista. Isto é muito bom pra mim porque sigo em contato com o meu país. Atualmente, trabalho na agência EFE e preparo uma peça de teatro sobre os centros de dia para doentes mentais.
Além da sua obra literária, você também foi curadora da mostra de cinema Novo Cine que exibe filmes brasileiros em Madri e Salamanca. Conte-nos um pouco como foi este trabalho.
Fui convidada pela responsável de cinema da Casa de América, Teresa Campos, para fazer entrevistas com os diretores brasileiros que exibiam seus filmes lá. Sempre que um diretor brasileiro vinha, ela me chamava para entrevistá-lo. Assim, o pessoal da Fundação Cultural Hispano Brasileira, em 2011, me convidou para ser curadora, fazer entrevistas e apresentar a mostra para a imprensa. Foi uma experiência muito bacana que durou três anos.
Ser brasileira atrapalhou ou ajudou na sua carreira?
As duas coisas. Impulsionou porque gera curiosidade nas pessoas pelo o que tenho a dizer. Atrapalhou como sempre acontece na vida de qualquer imigrante: os papéis, os preconceitos que existem. Então, ao mesmo tempo em que abria portas, me impedia de encontrar um trabalho na minha área.
Você acha que teria as mesmas oportunidades como escritora no Brasil?
Não saberia dizer por que não vivi esta etapa da minha vida lá. O mercado literário é mais forte na Espanha; porém apesar de ter muitas coisas escritas em português, nunca tentei publicar no Brasil. Por outro lado, o fato de escrever em espanhol me obriga a me esforçar e melhorar minha capacidade como escritora.
Você recomendaria algum curso na Espanha para quem deseja seguir a carreira de escritor?
Eu fiz o curso de roteiro de cinema na TAI e depois fiz um doutorado em Filologia, na Universidade de Alcalá de Henares, em 2003. Na minha tese, analisei como os autores espanhóis tratam o tema da imigração em suas peças, algo que está profundamente ligado à minha vida. Da mesma forma fiz um curso de dramaturgia com Fermín Cabal, um dramaturgo espanhol e participei de oficinas de dramaturgia na Cuarta Pared em Madri.
Sempre é bom para um escritor estar com outros autores. Porém, recomendo a quem deseja ser escritor escrever sem parar. Um escritor é escritor porque tem a necessidade de escrever constantemente, seja publicado ou não, seja criticado ou não; escreve porque persiste nisso. É a única dica que eu posso dar: persistência. Eu continuo persistindo.
5 Comments
Fabuloso! Adorei, Ju! Muito gratificante ler que tem gente do Brasil fazendo a diferença no mundo. Eu vi o documentário da HBO ao qual ela se referiu no texto e gostei bastante. Sucesso pras duas – e pra todas as Brasileiras Pelo Mundo!
Obrigada, Cris! Se cada um fizer um pouquinho… 😉
Juliana, estava há ANOS tentando lembrar o nome da Carla Guimarães. Eu li um texto dela no El País em 2008, quando ainda morava em Madri e me apaixonei. Cheguei a adicioná-la no nosso querido Orkut, mas depois esqueci o nome da Carla e não conseguia achar o texto dela na web. Seu post me fez dar um pulo aqui da cadeira. O texto em questão, por sinal, é o seguinte: http://elpais.com/diario/2008/02/23/opinion/1203721205_850215.html
MUITO obrigado e boa sorte na cidade mais legal do planeta.
Sandro, muito obrigada!! Adoro esse texto também. Fico feliz em ter te ajudado. Abraços! PS: Concordo com você: Madri é a cidade mais legal do planeta. 😉
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