Esse texto fala sobre o estilo de vida americano e saúde mental.
Muitas pessoas têm o desejo de imigrar para os EUA. Os motivos são variados, mas, na maioria das vezes, escuto dizerem que nos EUA “tudo funciona”. Além de tudo funcionar da forma como deveria, tudo é feito rapidamente. A infraestrutura é outra. Os serviços prestados são exemplares, o atendimento ao consumidor é cordial. A gente se sente cercada por bons profissionais comprometidos com qualidade e pronta entrega. Porém…. qual o preço dessa vida de primeiro mundo tão sonhada? O custo é alto, pago com um estilo de vida que deixa pouco espaço para saúde mental.
O estilo de vida americano é semelhante ao fast food que está espalhado pelo país: tudo é padronizado e rápido, saboroso, porém nada saudável. Em termos de comida, a cada esquina temos um McDonalds, Wendys ou Starbucks. O ritmo acelerado da economia americana se reflete nessa vasta propagação de fast food. Com o tempo, e perpetuação desse estilo de vida corrido e competitivo, vieram os drive-thru, porque não basta a falta de tempo para comer no restaurante. É preciso fazer o pedido do carro mesmo, pegar a refeição e sair comendo pelo caminho.
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O estilo de vida americano é padronizado para quase tudo. É fácil transportar esse estilo de alimentação para outros aspectos da vida. Parece que vivemos num comercial do McDonalds aonde em qualquer lugar do país o menu será o mesmo com poucas variações culturais. Tudo é picture perfect igual ao que vemos na foto do menu.
Também temos essa padronização na vida. Festas seguem a mesma rotina, o almoço de família tem o ritual e tempo agendado porque todo mundo está super ocupado. E para quê sentar e jogar conversa fora se podemos assistir um filme sem nem conversar? No começo, eu amava a praticidade americana. Com o tempo, comecei a perceber que as relações são superficiais como o fast food. Da mesma forma que o lanche rápido não nos deixa saciados por muito tempo, também falta um sustento saudável nos relacionamentos e na vida. A gente se sente cercado por relações rasas.
Vamos ser honestos: tamanha padronização pode ser muito útil. Por exemplo, viajei para um congresso e não sabia bem aonde comer. Andei à esmo por alguns minutos até que encontrei um Panera Bread e consegui uma salada. A mesma salada vendida perto da casa. A MESMA SALADA, mesma seleção de verduras e legumes, mesma quantidade, mesmo sabor. IGUALZINHO. Impressionante.
Os EUA não se tornaram essa potência mundial por acaso. O estilo de vida reflete a cultura do americano. Mesmo assim, a nova geração do mercado de trabalho, entre 20 e 30 anos tem se manifestado a favor de manter a produtividade aliada a melhores condições de trabalho e equilíbrio com a vida pessoal. Porém, ainda estamos longe de um acordo saudável.
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Você deve estar se perguntando: se é tão ruim assim, por que você ainda está aí? Porque entre as perdas e ganhos nessa matemática da vida, continua valendo a pena morar aqui. Todo mundo sabe o quanto é bom morar aqui, mas é importante quebrar a ilusão de que tudo é perfeito e que mudar resolve todos os problemas. Recebo uma grande quantidade de e-mails e mensagens semanalmente pedindo informação sobre imigrar para os EUA. Sempre compartilho os pontos a favor e contra, pois acredito que compartilhar os problemas ajuda na adaptação. Muitas coisas me pegaram de surpresa e fiquei sem saber como agir. Espero que compartilhar os pontos negativos ajude na preparação para a mudança.
Além disso, é valioso saber que você não está sozinho se sentir que a vida está corrida ou superficial demais. Se a adaptação ao estilo de vida americano está afetando sua saúde mental, procure ajuda. Liberte-se do estigma sobre terapia e apoio psicológico. Equilíbrio entre a vida profissional e pessoal é fundamental para ser bem-sucedido e terapia ajuda muito! Vale a pena procurar um psicólogo que compreenda a perspectiva do imigrante, da mulher e da minoria.
Ressalto que o estilo de vida varia de acordo a região dos EUA e com a profissão. Talvez os moradores do West Coast não enfrentem a mesma pressão no trabalho que nós temos aqui no East Coast. Talvez, ser pesquisador no Colorado seja menos estressante do ser cientista em Nova Iorque. De qualquer forma, a impressão geral é que o estilo de vida pode afetar a saúde mental! Esse fast food de relacionamentos e de vida corrido não é saudável e nós não podemos nos acostumar com o que não nos faz bem.
Encerro com um trecho do poema da Marina Colasanti que diz muito sobre este estilo de vida americano (corrido) e sobre a necessidade de encontrar equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.
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(Trechos do Poema “Eu sei, mas não devia – Marina Colasanti)
“A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado.
A ler jornal no ônibus porque não pode perder tempo da viagem.
A comer sanduíche porque não dá pra almoçar.
A sair do trabalho porque já é noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia (…)
Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana.
E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo
e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado (…)
A gente se acostuma para poupar a vida que aos poucos se gasta e, que gasta,
de tanto se acostumar, se perde de si mesma”
Leia o poema completo aqui.