Quando ouço as pessoas reclamarem sobre o transporte público de São Paulo, dou risada e percebo que muita gente reclama de barriga cheia. Explico. Embora o transporte público da cidade de São Paulo esteja longe de ser ideal, se comparado ao transporte público de Manila, ele é excelente. Isso porque, nas Filipinas, o transporte coletivo é, em sua maioria, privado. Sim, isso é chocante. Mas, a verdade é que quando comparado ao ocidente, muitos aspectos da cultura oriental são bastante inusitados.
O único meio de transporte verdadeiramente público (e presentes somente em Manila) são os trens: LRT e MRT. Dizem que eles estão sempre lotados e se cobra por itinerário: depende da quantidade de paradas que se percorrera (como em Londres). Eles cobrem somente uma pequena parte da região metropolitana de Manila e muitas vezes as pessoas têm que pegar outro meio de transporte para chegarem ao seu destino final.
Nas províncias, as formas mais comuns de transportes são os tricycles (apelidados de trykes) e o jeepneys que também estão presentes em Metro Manila. Os trykes são como os tuk-tuks tailandeses: motocicletas com um anexo no qual se carrega passageiros (ou até carga, como bujões de gás) de um lado a outro. Essa forma de transporte, além de bastante comum, e barata e atende as necessidades de uma cidade de pequeno porte, como e a maioria das cidades por aqui.
Os jeepneys são exclusivos das Filipinas e é parte da identidade local. Originalmente, eles são os jipes deixados pelos americanos após a II Guerra Mundial, reformados e transformados em transporte coletivo. Eles se destacam pelas decorações chamativas e cores brilhantes.
Em Manila, os tricycles existem para transportar pessoas em curta distancia. Como o trânsito de Manila é caótico e a cidade é super poluída, não seria seguro (nem saudável) se eles transitassem pelas grandes vias, como a C5 ou a EDSA, duas das principais vias que ligam o norte ao sul da Metro Manila.
Os jeepneys, no entanto, continuam sendo um dos principais meio de transporte da cidade. Eles custam em torno de PHP 7,00, dependendo do trajeto, e você se sente como se estivesse em uma lata de sardinha super-aquecida, que deixam o pescoço torto (lembrem-se que os filipinos são, em geral, baixinhos. Eu sou mais alta que muitos homens com meus enormes 1,64m de altura). Como não tem parada de jeepneys (nem de ônibus) definidas, eles param onde o passageiro acenar e onde ele quiser descer: isso e, se alguém entrou em um ponto e 100m depois outro passageiro decide descer, ele vai parar. Claro que isso ajuda para aumentar o transito insuportável da cidade.
Embora as principais vias percorridas por ele estejam listadas na sua lateral, ainda não entendo o caminho que eles fazem. Um dia, perguntei a uma colega filipina como podia saber por onde passava um jeepney, qualquer um, e ela disse: “bem, se você souber que o destino dele e este for o mesmo que o seu, você o pega”. De uma forma quase irracional, isso funciona para a população. Para mim, é um quebra-cabeça chinês, daqueles impossíveis de ser resolvidos.
Acredito na sua importância histórica e cultural nesse país formado a partir de misturas e por isso acho que eles deveriam estar em museus ou ser usados, ocasionalmente, como transporte turístico em regiões predeterminadas. Acho que deveriam ser substituídos por meios mais modernos que produzam menos poluição, como ônibus de linha ou FXs (ou vans), outro meio de transporte bastante comum que segue as mesmas leis (ou falta delas, neste caso) que os jeepneys.
Os ônibus, que também pertencem a diversas companhias privadas, são outra opção. Como essas companhias não têm um website e tampouco existe um banco de dados central no qual se possa encontrar seus itinerários ou seus horários (indefinidos por causa do caótico transito da cidade), ou se conhece por onde eles passam (e os espera) ou não há a possibilidade de saber seus caminhos. Por exemplo, existe um ônibus que sai do meu micro-bairro ate o terminal 3 do aeroporto. Esse ônibus passa perto do escritório onde trabalho. Só sei que ele existe porque conheço o seu ponto inicial e nele está descrito seu itinerário. Vou muitas vezes ao trabalho nele, mas como eu não sei por onde ele passa na volta, não tenho idéia de onde posso esperá-lo. O ponto positivo é que muitos deles têm ar-condicionado, o que é fundamental nessa cidade que só faz calor!
Os famigerados táxis são o meio de transporte que mais uso porque estão por toda a cidade e não tenho idéia de como decifrar o mistério por trás dos transportes coletivos. Eles são relativamente baratos (a bandeira inicial custa PHP 40,00, ou seja, R$ 2,00), mas a manutenção de muitos deles é precária. Muitos não são limpos (inúmeras vezes peguei papel amassado na porta – nojento, eu sei!) e outros são imundos (nos quais se encontra ate barata – já passei por isso).
É quase impossível pegar um taxi nas horas de rush (ou seja, entre as 7h e 9h e entre as 17h e 19h) e aqueles que param se recusam a percorrer meros 10km, o que seria a distância do Brooklin a Avenida Paulista, em São Paulo. Aqueles que aceitam a corrida nessas horas decidem cobrar o quanto querem, ignorando o taxímetro. Então, muitas vezes é preferível esperar que em algum bar ou restaurante perto do local onde se está porque negociar com taxistas é bastante cansativo!
Em alguns aspectos, a loucura dessa cidade que cresceu de forma caótica, como se um cego montasse uma cidade de Lego, me lembra um pouco São Paulo. Talvez esse seja o aspecto que mais me incomoda porque sempre critiquei muito a cidade onde nasci, pela sua falta de estrutura. Conhecer o mundo me fez ver que existem muitos outros lugares, com problemas ainda piores. Ainda assim, um tem que vê-los através de seus próprios olhos e senti-los na própria pele para poder acreditar nisso.
Salamat!
24 Comments
Nossa amiga, amei seu texto! seu senso de humor ao memso tempo tao informativo! Seu estilo é tudibom!!!!!! rsrsrsr Me senti dentro de um filme de Indiana Jones e amei as fotos! Quase igual o transporte publico da Suiça! rsrsrsrsr Amiga uma pergunta e como é a questao de carros particulares? Acontece também o fenomeno como no Brasil que a industria financia até a morte, e todo mundo compra carro e como a infraestrutura de ruas nao acompanha, fica tudo congestionado? Compreendi que o congestionamento é fato, mas me questionei se é “so” devido aos pseudos transportes “publicos” e soluçoes “puxadinhos” ou a quantidade de caro so com uma pessoa também é abominavel como no Brasil? Outra coisa, com é a criminalidade nos transportes pulbicos? também existme arrastoes, assaltos, batedores de carteira, aqueles tarado que ficam te “assediando” no meio do aperto nos onibus? rsrsrsr desculpa a curiosidade, ams ja que estamos falando do probema, vamos falar “all the way through” rsrsrsrsr Amei amiga, parabéns! Namasté, gente to com vontade de tirar uim ano sabatico e ir visitar cada uma de voces! rsrsrsr Deixa meu marido escutar eu falando isto! rsrsrsrsrsr da morte e pancadaria la em casa! rsrsrsrsrr mas sonhar a gente sempre pode né?! rsrsrsrsr
Ana, minha linda, obrigada pelos elogios!!! Vem nos visitar!!! Amo a idéia do ano sabático! Hehe!
Bom, vou responder em partes… Parte da responsabilidade do trânsito caótico são os ônibus e jeepneys… Mas, seria injusto dizer que eles são os ÚNICOS responsáveis: a cidade tem muito mais carro do que pode aguentar e eles dirigem muito mal… Além disso, falta fiscalização eficiente. Tenho um colega holandês que dirige e quando lhe perguntei sobre como era dirigir nas Filipinas, ele me disse algo do tipo “você tem que dirigir tão mal quanto eles!”.
Sobre os subsídios, eu não poderia dizer porque nunca cogitei em comprar um carro lá (sou uma ameaça em quatro rodas! Haha!), mas o que posso dizer é que um carro novo sai por um preço muito parecido ao de uma casa, o que acho absurdo!
Sobre a criminalidade, existem trombadinhas, mas acho que a escala da violência em Manila é menor que no Brasil. Em nenhum dos dois lugares passei por situações ruins, mas em Manila ouvi de outro estrangeiro que pega transporte coletivo (sim, tem loucos que assim preferem… Eu não consigo entender o sistema) que, uma vez, ele saía de um jeepney e um cara perguntou se ele estava com o passaporte dele e meu colega disse que não. O rapaz então disse que estava com ele e só o devolveria se o meu colega o pagasse uma quantia (algo como R$ 100,00)… Tipo, hello? Haha!
Beijos e obrigada mais uma vez!
😉 POis e depois que fizerao os corredores em sp e a melhorias dos trens estamos chegando na qualidade.
Nossa muito interessante como as pessoas enfrenta os mesmos problemas de locomotividade dentro das grandes cidades 😉
Karla, obrigada por ler o texto! =) Aqui, em São Paulo (estou em um projeto), pego trem e metrô até a casa dos meus pais e chego lá em 40 minutos… Acho que o problema no Brasil está atrelado ao fato de que ninguém quer pegar transporte público… Acho um absurdo o trânsito todo na Marginal Pinheiros, por exemplo, onde se vê muitos carros com somente uma pessoa…
Um beijo!
Tati, depois de ler o seu texto que alem de dramatico, nao deixa de ter um excelente senso de humor, vou parar de reclamar do transporte publico de Londres. Eu dependo de trem aqui no bairro onde moro, nao tem linha de metro. E, se o tempo muda, o trem atrasa ou nao vem, impressionante. Se chove muito, o trem para. Se faz muito calor, as linhas entram em paranoia! Se neve, sem comentarios…..Bom, mas, vi que minha dificuldade aqui ficou bem pequena perto da sua ai. Adorei as fotos ilustrativas, e, como a Ana colocou acima, parece mesmo um filme do Indiana Jones!
Curiosidade: Os executivos (poderosos e ricos) tambem usam helicopteros como em Sao Paulo?
Bjs Fernanda
Oi Fê!!! Obrigada pelos elogios! Hehe! Sabe, essa dramaticidade (é essa a palavra???) é parte da minha personalidade… 😉
Sobre Londres, eu sei que o metrô de Londres tem seus problemas e é super caro (se não fosse o Oyster, não saberia andar por aí), mas ele funciona! Hehe! Com neve, nas ilhas (UK e Irlanda), nada funciona, mas os caras não estão preparados para neve (lembro-me que os ônibus pararam de circular às 20h em um dos invernos que passei na terra dos Leprechauns) porque o governo não tinha comprado sal suficiente para degelar as ruas… Coisa que só acontece na Irlanda! 😉
Nas Filipinas, os ricos e poderosos não têm acesso a helicópteros na mesma proporção que no Brasil. Lá, eles têm motoristas e enfrentam o mesmo trânsito infernal que a maioria dos mortais…
Digo maioria porque, em Manila, as empresas trabalham round the clock, ou seja, 24 horas… Eu, por exemplo, já trabalhei em mid-shift (das 15h à meia-noite) e agora vou trabalhar à noite… Nesses horários, fora do rush hour, o trânsito costuma ser mais tranqüilo (ou menos lotado)!
Beijos!
Caramba, nao sabia que era assim. Tenho uma prima que mora ai, mas ela mora em uma cidade pequena no sul das Filipinas. Coitada da populacao que depende do transporte publico.
Oi Aline! Obrigada por ler o texto!
Sabe, a população já está acostumada com o caos. Acho que existe uma lógica por trás da loucura, embora eles não saibam me explicar como funciona tudo. Tenho colegas que pegam dois ou três transportes para chegar ao trabalho e, para eles, isso é normal. Quem se estressa são os estrangeiros! 😉
Onde sua prima mora? Em qual cidade? O país é muito lindo, mas Manila, uma loucura!
Beijos!
Menina, que loucura, parece coisa de filme hahaha e como disse a Fernanda ai em cima, eh bom para pararmos de reclamar do transporte publico em Londres, que claro tambem esta longe de ser perfeito, especialmente no inverno quando neva, mas, ainda assim, nos permite (nao nevando) nos movimentar pela cidade com uma facilidade excepcional! 🙂 bj
Ann, eu também reclamava do transporte público de São Paulo e da Irlanda! Mas tem coisa pior… Hehe!
Fico revoltada com isso porque eu vejo solução! Parece simples, mas não deve ser… Acho que leis mais rígidas ajudariam, mas elas deveriam ser “enforced” (esqueci o termo em português! =P). O problema é a corrupção… Várias vezes ouvi comentários de que se um guarda de trânsito parar você, deve-se perguntar quantos Ninoys são preciso para que você possa ir. Ninoy é um ex-senador filipino que está na nota de PHP 500.
Um beijo! =)
Socorro, uma aventura acada dia, hein Tati? Nao conheco Manilla mas tenho a impressao de que existem muitas similaridades com SP…..transito, violencia, um pouco de caos todos os dias!
Oi Mônica!
Manila é uma São Paulo mega-atrasada… Então, eu que sempre critiquei São Paulo fico sem palavras quando vejo algo que parece mais caótico que São Paulo…
Em questões de violência, acho que os filipinos são meio que beginners se comparados aos brasileiros. Eles querem ser malandros, mas são raros os casos que ouço de assalto a mão armada. Em geral, eles arrancam seu colar e saem correndo ou tentam dar o golpe. Acho que isso é fruto de uma civilização que não ve saída para sua miséria… Muito triste!
Um beijo!
Adorei o texto Tati!!
Eu acho muito louco isso de transporte coletivo, porque no Rio eu achava ruim, mas tava acostumada. Ai cheguei aqui em Bruxelas e comecei a achar aqui uma maravilha e a cada visita ao Rio fica mais penosa…E agora depois de quase quatro anos aqui reclamo o tempo todo do transporte coletivo! hehehe
Achei ótimo mudar a perspectiva. Deve ser realmente uma aventura enorme!
bjks
Bia, minha linda… Soh digo uma coisa: venha para as Filipinas que apresento um transporte publico pior que o do RJ!
Estive no RJ e adoro a cidade, mas acho o “metro de superficie” (a.k.a. buses) um absurdo… De qualquer forma, no RJ, voce nao tem que lidar com uma lata de sardinhas chamada jeepney que expele fumaca por todos os lados! Haha!
Um beijo!
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Olha só, Parabéns pela iniciativa, textos, documentários, dicas e tudo mais sobre o “outro lado do mundo”.
Eu estou começando a ficar bastante entusiasmado com esse magnifico País (independente de ser em Manila, Cebu, Angeles [onde eu queria ir] ou até mesmo Boracay).
Alguns comentarios acima já foi dito que seria o caos de SP, mas o que me deixa indgnado também é a sua observação:
“Trânsito infernal na marginal pinheiros onde tem um carro pra uma pessoa…”
Enfim, Tati, continue com esse projeto de roteiros das PH, cada vez mais acho mais interessante =]
Beijos! o/
Oi Thomas! Desculpe a demora em responder ao seu comentário!!! =)
Muito obrigada pelos elogios! =) Se pudesse sugerir algo, diria para que não fosse a Angeles (pela sua fama), mas se é isso que você quer, ótimo! =)
Eu conheço bem o trânsito caótico de SP, mas acho bem comodismo do paulista escolher pegar seu carro e dirigir pela Marginal quando poderia sair meia hora mais tarde do trabalho (e entrar meia hora mais tarde também, lógico) e pegar o trem sem problema algum!
E pode ficar tranquilo! 😉 Enquanto eu viver nesse país, vou encontrar temas que mereçam ser explorados! Obrigada outra vez!
Beijos!
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Tati,
Vou para as Filipinas em Março.
Você sabe me dizer como posso transitar de uma ilha para outra?
Vou primeiramente para Oslob, e em diante: Puerto Princesa, Coron, Tubbataha, El Nido, Legazpi, Luzon.
Não há quase nada de informação sobre o transporte das Filipinas para mochileiros.
Procurei por horas e horas a internet… e nada….
Muito obrigada,
Mary
Oi Mary! Então, eu falo algo sobre viajar nas Filipinas no meu blog, o Trotamundos by Tati Sato, e há um post sobre isso aqui mesmo, no Brasileiras pelo Mundo… Cara, digo que é um terror viajar por aqui porque tudo envolve mais de um transporte: barco, avião, ônibus, van, jeepney, tricycle…
OK, olhando o seu roteiro, você vai precisar vir a Manila várias vezes. Luzon é a ilha onde está Legazpi e Manila. De aqui, você vai a estação de ônibus de Cubao para pegar o ônibus noturno a Legazpi.
El Nido, Puerto Princesa e Coron estão em Palawan. Para chegar a qualquer um deles, você precisa pegar um vôo (desde Manila). De Puerto Princesa, você pode pegar uma van para El Nido. Tarda cinco ou seis horas e é mega-apertada. De lá, você pode buscar barcos até Coron. É uma aventura: leve um saco de lixo grande para você colocar seus pertences (e eles permaneçam secos e utilizáveis). De Coron, você pega um avião até Manila.
Para Oslob: se você quiser ver os tubarões-baleias, recomendo que vá a Bohol e de lá pegue uma excursão (diária) para Oslob. De Bohol, além da praia, você pode fazer snorkel e visitar os Chocolate Hills e os Tarsiers…
Não conheço Tubbataha.
Um beijo e boa sorte!
Olá Tati.
Vou para as Filipinas. Vou chegar pelo aeroporto Clark International Airport e tenho que ir até o Ninoy Aquino International Airport. E na volta ao contrário. Qual meio de transporte que você sugere? Muito obrigado
Olá Edy,
A Tati Sato parou de colaborar conosco e, infelizmente, não temos outra colunista morando no país.
Obrigada,
Edição BPM