Ah, os vinhos espanhóis! Percebi que algumas de minhas colegas já escreveram sobre vinhos nos países que moram, como na Suíça, na Eslovênia, na África do Sul, República Tcheca e na Argentina, mas, aparte do texto da Fernanda Medeiros com recomendações de vinhos como presentes de Natal, não havia um sobre o tema na Espanha… Não sei como ele passou batido quando o país é o terceiro maior produtor de vinho do planeta – só perde para Itália e para França.
Vou ser honesta: quando cheguei à Espanha, não gostava de vinho. Naquele tempo, no outono de 2010, não achava graça naquele suco de uva alcoólico e não entendia os cheiros e sabores que exalavam da taça. Sabia nada… Inocente.
Comecei a viver com um espanhol – o mesmo que se tornou meu marido – e, pouco a pouco, fui introduzida ao mundo dessa deliciosa bebida, adorada pelo deus Baco. Comecei tomando kalimotxo, o cocktail que é a mistura de Coca-Cola com vinho tinto que comentei no meu último texto sobre Guipúzcoa, ou vinho com casera, uma água com gás levemente adocicada. Aos poucos, fui tomando gosto: as delícias do mundo enológico aos poucos me eram reveladas: era quase como se eu abrisse uma porta e descobrisse um novo mundo de sabores!
Aqui, a maior parte dos vinhos não é produzida somente com as conhecidas variedades Merlot e Cabernet-Sauvignon. Essas uvas podem, sim, formar parte de sua composição, mas a maior parte da produção costuma usar as variedades locais, que são mais de 200. Para citar algumas, há a Tempranillo e a Garnacha Tinta, usadas nos tintos, a Albariño e a Verdejo, nos brancos e a Parellada e Macabeo (ou Viura), usadas na produção de cava, o espumante espanhol cuja marca mais conhecida é a Freixenet.
Como a Espanha é o país com maior extensão de vinícolas do mundo, representando 15% do total mundial, não é surpreendente que o país conte com inúmeras regiões dedicadas a vinicultura. Cada região tem sua denominación de origen (D.O.) que é a classificação regulamentar da indicação geográfica espanhola, semelhante ao appellation na França, e cada região pode produzir apenas determinados tipos de vinho. A D.O. de Ribera del Duero, em Castilla y León, por exemplo, que conta com tintos excelentes feitos, em sua maioria, com a uva Tempranillo, não permite a produção de vinhos brancos, embora haja, na região, vinhedos de uvas brancas que são usadas para compor alguns de seus tintos; uma das D.O.s de Castilla y León de brancos é a Rueda, que produz ótimos vinhos frescos a partir da variedade Verdejo.
Outras D.O.s conhecidas internacionalmente são a Cava, o espumante espanhol cujo processo de elaboração é o mesmo que o do champagne francês (que é completamente diferente da elaboração do Prosecco! Atenção!) e se concentra, majoritariamente, na Catalunha, a La Rioja, pela elaboração de tintos usando, principalmente a Tempranillo e o Jerez (ou sherry), o vinho doce, de sobremesa, produzido na região de Cadiz, em Andaluzia.
Pelo tempo de permanência em barrica ou de garrafa, os vinhos são classificados por Joven, Crianza, Reserva ou Gran Reserva. Os vinhos Jóvenes, por exemplo, são aqueles engarrafados diretamente após as duas fases de fermentação, sem tempo nenhum de barrica. Já os Crianzas são envelhecidos por dois anos e parte desse tempo – de seis meses a um ano – permanecem em barrica de carvalho francês ou americano. Os Reservas são envelhecidos por três anos, sendo que devem permanecer em barricas pelo menos por um ano e os Gran Reserva, produzidos somente com uvas de colheitas excepcionais, são envelhecidos por cinco anos, dois deles em barrica. Independente de sua idade, se recomenda que o vinho seja consumido no ano que foi comprado ou, no máximo, alguns anos depois porque a Bodega geralmente o coloca no mercado no tempo que deve ser consumido. Ao se esperar muito, o vinho ficará avinagrado – ou picado, como se diz aqui. No caso da Cava, por ser uma bebida fresca, ela não deve ser armazenada e deve ser consumido no ano da compra, para que todos os seus sabores possam ser contemplados.
Aprendi bastante sobre vinhos quando visitei a região de Ribera del Duero. Como muitas, essa região também oferece muitas atividades ligadas ao vinho, como degustações e harmonizações, visitas a bodegas – que sempre terminam com a degustação de vinhos e, consequentemente, a compra de garrafas – a spas que contam com tratamentos à base de vinhos, chamados de vinhoterapia, pelas propriedades antioxidantes que essa bebida possui. Sim, um luxo etílico que eu amo!
Uma das melhores coisas é que, aqui, há bons vinhos disponíveis nas prateleiras dos mercados por menos de 10 euros. Particularmente, gosto muito de vinhos tintos e recomendo o Protos, um Ribera crianza composto 100% por uvas Tempranillo, que se encontra em qualquer mercado por menos de 8 euros. Outras boas opções de tintos são os Cune, da vinícola CVNE, cujo Rioja Crianza é composto por 85% uvas Tempranillo e 15% Garnacha Tinta e Mazuelo e custa menos que 5 euros e o Ribera Roble – um vinho entre Joven e Crianza por ter sido armazenado por um tempo em barrica de carvalho -, composto 100% por uvas Tempranillo, sai por menos de 7 euros. Entre os vinhos brancos, destaco o Marques de Riscal, um Rueda Verdejo, que pode ser encontrado no mercado por menos de 5 euros.
Se você é um amante dos vinhos, a Espanha é um país que tem que ser visitado. Os vinhos espanhóis podem não ter a fama dos franceses, mas eu, particularmente, não troco o meu Ribera por nenhum Merlot!
P.S.: Para quem tiver interesse em conhecer mais sobre as regiões produtoras de vinho na Espanha, as Denominaciones de Origenes e os tipos de uva, confiram o site Wines From Spain.
Agradecimentos super especiais a minha queridíssima amiga, Ju Balieiro, que trabalhou com vinhos e deu seu selo de aprovação, além de ter feito comentários super relevantes em relação ao texto!
4 Comments
Ótimo texto, com muita informação relevante!
Sei que você sabe, mas acho legal informar pros leitores: vinho não vira vinagre, apesar de popularmente se dizer que avinagrou, já que para virar vinagre precisa adicionar ácido acético. Vinho fica oxigenado, o que dá a sensação azeda de vinho estragado. O contato com o oxigênio não produz ácido acético naturalmente, então a famosa história de vinho que vira vinagre é pura lenda, rs. Uma coisa horrível que pode acontecer é o efeito bouchonné, que é quando há contaminação da rolha afetando o vinho, provocando um gosto de ferrugem e mofo causado pelo tricloroanisol.
Os Ribera del Duero têm lugar no meu coração, mas gosto também dos jovens da Jumilla, pouco conhecidos dos brasileiros. Já a cava não tem lugar no meu coração, não, hahaha!
Espanha é o segundo produtor de vinho depois da França. E o primeiro em plantação de vinhas.
O posto de maior produtor de vinhos historicamente sempre ficou entre Itália e França, que se revezam anualmente entre o primeiro e segundo lugares. http://italianwinecentral.com/top-fifteen-wine-producing-countries/
Poderia por gentileza citar a fonte de sua informação?
Obrigada!
Oiê! Desculpa a demora por responder aos comentários!
Cris, eu acho que quando falamos que o vinho avinagrou, nos referimos ao sabor que perdeu suas características originais. O processo de fabricação do vinagre é outro, mas uso vinhos “avinagrados” para cozinhar!
Eu aprendi a amar o Ribeira e meu corpo não aceita muito bem os espumantes de forma geral… Quando digo corpo, quero dizer a cabeça! =)
Independente de que país é o maior produtor de vinhos, não troco meus espanhóis por nenhum francês ou italiano! Haha!