Iniciativas artísticas de El Salvador
O que entende-se por arte já é uma definição subjetiva e individual, carregada com a vivência e gosto de cada um. Partindo desse ponto de vista, para sermos mais politicamente corretos, podemos dizer que as produções artísticas e culturais disponíveis em El Salvador não são muitas.
Aqui existem salas para apresentações de concertos e peças teatrais polarizadas na Zona Rosa, como o Museu Muna e o Teatro Presidente, contíguo ao Museu Marte, além das que estão espalhadas pela cidade, de forma mais periférica, nos centros culturais.
Estive presente em alguns concertos do programa do Museu Marte (Lunes musicales) onde foram citadas as iniciativas e os apoiadores que buscam a manutenção da Orquestra Sinfônica de El Salvador, visando oferecer música clássica de qualidade a todos os salvadorenhos. Todo esse esforço foi incrementado pela revitalização do Centro Histórico que inclui o Teatro Municipal, onde agora existe uma programação musical e de dança sendo oferecida.
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As salas de cinema, em grande parte, são de grandes cadeias e o cinema alternativo tem espaço e oferta bem reduzidos. Com as produções teatrais ocorre o mesmo, com alguns teatros com produção local, não existindo uma cultura de assistir a grandes produções teatrais no país.
Esse panorama não ocorre porque o salvadorenho é pouco criativo ou não possui talento. Pelo contrário, essa criatividade e talento se expressam sempre que há incentivos e programas governamentais ou privados que propiciem a oportunidade de desenvolvimento .
Alguns exemplos bem interessantes dessas iniciativas vou comentar abaixo:
Fernando Llort
Fernando Llort nasceu em El Salvador em 17/04/1949 e desde a infância apresentava grande talento para as artes. Passou por uma fase bem rebelde, nos vocais da Banda De Sol na década de 60. Formou-se arquiteto pela Universidade de El Salvador, estudou arte na França, teologia na Bélgica e também estudou nos Estados Unidos.
Toda sua expertise ele canalizou para o seu povo, os salvadorenhos. Escolheu morar em La Palma, quase na fronteira com Honduras e começou a concretizar seu maior sonho: empoderar as pessoas e comunidades através do ensino da arte. Essa localidade nunca mais foi a mesma e deixou de viver somente da agricultura, para obter reconhecimento nacional também pelo artesanato que produz! Em La Palma conheceu a esposa, com quem se casou e teve 3 filhos (todos artistas), faleceu em 2018 aos 69 anos deixando, além da grande semente do olhar artístico por onde passou, varias ideias e ideais que serão perpetuados pela fundação que leva seu nome.
Na galeria instalada em El Salvador (Los Vitrales) em conjunto com Margarita Llort, além das lindas peças produzidas com sua marca indelével, são oferecidos cursos para difundir as técnicas que ele utilizava.
Lula Mena
Lourdes Mena, salvadorenha, empreendora que desenvolveu na infância a paixão pelo desenho e reaproveitamento de materiais. Na juventude estudou desenho artesanal na universidade do país onde conheceu técnicas quase em desuso na época, passando a utilizá-las e difundí-las. A primeira foi o anil. O uso de añil é proveniente do aproveitamento de uma planta chamada xiquilite para tingir tecidos. Os tecidos ficam com uma coloração azul incrível. Essa planta é muito comum na região centro-americana e impulsionou a economia de seus países por muitos anos. Começando por essa técnica, utilizando as fibras e sementes disponíveis na flora salvadorenha e a mão de obra de mulheres de comunidades carentes, Lula Mena se tornou conhecida mundialmente. Através de seus desenhos exclusivos, as artesãs locais hoje estão empoderadas e têm outra forma de vida, que lhes permite dar um futuro diferente aos seus filhos, com educação e oportunidades.
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Iniciativas do Museu Marte
O Museu Marte de El Salvador é uma instituição privada, sem fins de lucrativos, cujo funcionamento é de responsabilidade da Associação Museu de Arte de El Salvador, visando desenvolvimento e divulgação da arte no país, o museu mantém uma exposição de arte salvadorenha com acervo próprio, de particulares e empréstimo de artistas. Mantém também exposições temporárias, através das quais podem ser trazidos ao país grandes nomes da pintura mundial. Além desse espaço possui estrutura para fornecer concertos musicais, shows e feiras de artesanato que fomentam a arte nativa.
O museu oferece programas de estágio para universitários das áreas relacionadas, capacitando assim a juventude salvadorenha para esse tipo de trabalho.
Artesania Comasagua
Em 2002 neste povoado do departamento de La Libertad, Comaságua, uma senhora chamada Ruth Hernandez buscava alguma atividade que gerasse novos ingressos. O povoado foi bem atingido pelo terremoto de 2001 e sua economia estava gravemente afetada. Nessa busca encontrou um cartão decorado com folhas secas que trouxe uma turista. Baseado nisso ela e a comunidade desenvolveram uma técnica para o secado de flores e folhas e aprenderam a plasmar as belezas do seu povoado em cartões e quadros. Pouco a pouco foram agregando outros tipos de trabalho e expandindo o negócio, desenvolvendo uma nova economia local que além de garantir o sustento da população, fomenta o turismo e a venda desses produtos.
El Salvador tem um povo muito caloroso e educado, que após a guerra civil vem buscando conhecimento e maneiras de se desenvolver em seu próprio país. As universidades começaram a existir em maior número e progressivamente estão capacitando seus professores para melhorar a qualidade do ensino e a expertise de seus alunos, que estão paulatinamente conseguindo postos de trabalho que anteriormente eram ocupados por estrangeiros. Esse mesmo movimento de capacitação da mão de obra local se percebe nos sítios arqueológicos que pude visitar. As estruturas dos museus são pequenas, mas gradualmente os profissionais locais estão se apropriando delas, ao invés de receberem restauradores e arqueólogos estrangeiros para estudá-las. Essa cultura, que é tão própria deles, finalmente está regressando ao seu lugar.