Micos que paguei ao falar inglês nos Estados Unidos.
Eu sempre tive o sonho de falar inglês. Quando era criança, brincava que estava em outro país e fingíamos falar inglês, então, a comunicação era feita da seguinte forma, eu falava Aise tu vanacazi di amigiz? e bem baixinho traduzia pra minha irmã e primas “eu quis dizer: vc vai na casa da nossa amiga?”. E, assim, a nossa imaginação nos levava a Nova Iorque, Londres, Sydney e por aí vai.
Um belo dia, minha mãe, que agora tinha dois empregos – tipo o pai do Chris – disse pra mim e meus irmãos: “Escolham alguma atividade que vocês queiram fazer porque, agora, eu posso pagar”. Sem pensar duas vezes escolhi fazer inglês. Eu tinha uns 14 ou 15 anos na época. Me matriculei no CNA e comecei um curso do zero. Depois de quatro anos e meio sai de lá muito orgulhosa com um diploma de conclusão de curso, eu havia terminado o último nível, o high advanced.
Na escola, todos os trabalhos de inglês ficavam sempre pra mim. Todos da sala sempre me procuravam pra tirar dúvidas de inglês e quando sai da escola, continuei com a minha paixão por línguas e resolvi estudar Letras Inglês-Português na faculdade. E não foi diferente: nas aulas todos pediam a minha ajuda com os trabalhos e as provas na matéria de inglês. Peguei meu diploma de Licenciatura depois de três anos e achei que estava super preparada para embarcar em uma aventura pela América.
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Até que um belo dia, finalmente, realizei meu sonho de morar em um país estrangeiro que tivesse o inglês como língua oficial. Embarquei para os Estados Unidos para ser au pair. Passou pela minha cabeça todas aquelas brincadeiras de criança só que agora eu realmente sabia falar inglês.
Ou achei que sabia.
A primeira dificuldade para falar inglês começou mesmo antes de chegar nos Estados Unidos. Foi quando tive a idéia de gravar alguns vídeos da minha rotina e enviar para a host family que iria me receber, ensaiei o que falar várias vezes, mas nos vídeos acabei falando um monte de baboseiras, frases sem sentido, pronúncia errada e colocação fora de ordem, ou seja, um desastre. Foi ai que me toquei que mesmo depois de tantos anos estudando inglês no Brasil, eu ainda tinha muito o que aprender.
Quando meu avião fez a primeira conexão em Chicago, lembro-me dos auto falantes soando uma voz feminina informações em inglês tão rápidas e incompreensíveis que nem reconheci que aquela moça estava falando inglês.
Quando cheguei na casa da host family, o pai das crianças olhou pra mim e falou bem firme em inglês (claro) “Eu não vou falar devagar como se você fosse uma criancinha”. Entrei em pânico e por um momento eu queria pegar um avião e voltar pro Brasil, mas não desisti, encarei o desafio e os micos começaram.
Quando fui comer fora pela primeira vez, em um restaurante mexicano, eu não entendia o cardápio e fiz uni duni tê e acabei pedindo uma prato enorme e super apimentado que eu não aguentei comer nem a metade. E a primeira vez que fui comer no Mc Donald’s a moça perguntava “For here or to go?” (pra comer aqui ou pra levar) eu não entendi, e perguntei “What?” e ela repetiu e eu não entendi de novo, então, olhei bem pra cara dela e falei “Yes?”, e ela perguntou de novo, e eu respondi “No?”. A atendente acabou desistindo e deu meu lanche em um saco de papel, ou seja, para levar, mas eu queria comer ali.
Paguei um mico também quando fui jantar com um boy, ele me levou em um restaurante chique. O cardápio era uma mistura de inglês com francês, o que piorou o meu entendimento. Eu fiquei morrendo de vergonha e não quis perguntar para ele o significado das coisas e acabei optando por uma salada, porque era a única coisa que eu tinha entendido daquele cardápio. No final, o boy perguntou se eu ia comer só uma salada mesmo e, apesar de estar morrendo de fome e com vontade de devorar o prato dele, eu falei bem contida “Não, estou satisfeita, obrigada”.
Um dia, quando eu já estava trabalhando cuidando das crianças, o pai delas me pediu um favor. Antes de sair para o trabalho ele me falou “The sheets are in the dryer, can you get them and put them on my bed?” eu entendi tudo exceto por uma palavra que deu um nó na minha cabeça. Eu confundi a palavra sheets – que significa lençóis – com shit – que significa merda. No momento que ele falou comigo eu pensei imediatamente “Péra lá, ele está pedindo pra eu pegar merda da secadora e colocar na cama dele?”. Morro de rir dessa história até hoje.
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Paguei micos por dois anos morando com uma família americana e trabalhando de au pair. Voltei ao Brasil e comecei a dar aulas de inglês. Depois voltei a morar nos Estados Unidos e depois na Austrália, onde conheci outro sotaque, outras gírias e paguei outros micos. Já faz 20 anos desde a primeira vez que comecei a estudar inglês, foram anos de descobertas, acertos e erros, aumentando o vocabulário, aprendendo expressões, melhorando a pronúncia e aperfeiçoando o sotaque.
Claro, meu inglês hoje é bem melhor, mas uma coisa é certa, a única língua que a gente domina totalmente é a nossa primeira língua , já as secundárias , nós vamos morrer aprendendo.
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