Nepal: um amor à segunda vista.
O Nepal é um daqueles países que só pelo nome já dá vontade de conhecer. Pelo menos foi assim pra mim. E logo que decidi ir pra Índia, vi que seria a chance perfeita de aproveitar a viagem e conhecê-lo. Conversei com algumas pessoas que já tinham ido e todas foram unânimes em dizer que eu deveria, sim, esticar a viagem; e que o Nepal era um país simplesmente encantador.
Reservei 18 dias inteiros pra minha estadia; ter tempo de conhecer a capital, Kathmandu; fazer uma trilha nos Himalaias e visitar, com calma, alguma cidade do interior. Saí de Delhi, na Índia, num voo direto para Kathmandu e já estava feliz só pelo fato de estar indo embora de Delhi, que é uma cidade bastante poluída e barulhenta. E apesar de saber que Kathmandu é uma cidade grande, carregava a ideia romântica de um lugar mais “zen”. Que nada! O aeroporto, sim, é digno de uma cidade do interior – lembra muito o de Porto Seguro, na Bahia -, e os funcionários são extremamente simpáticos e tranquilos. Mas é só dar um passo pra fora dele pra começar a entender que a capital do Nepal é como qualquer outra cidade grande, com um detalhe que faz toda a diferença: parece um extenso canteiro de obras. Sim, porque o país ainda se recupera do terremoto de 2015, que devastou Kathmandu e outras cidades do entorno, além de ser uma cidade em crescimento, com muitas construções.
Mas como todo turista ama o Nepal, eu sabia que tinha algo precioso ali. E tem mesmo. Quando falam que o nepalês é encantador, não há nenhum exagero e eu tive provas e mais provas disso. A primeira foi no táxi que peguei até o hotel. O motorista era um homem simpático, educado, deu dicas de turismo, preços e me avisou, quando eu saí do carro, que tinha esquecido o celular lá dentro – um aparelho novo e caro. Depois, já no hotel, fui recebida com a mesma simpatia e educação. Um dos funcionários ainda me perguntou se eu tinha almoçado, me indicou um restaurante (com preços ótimos) e fez questão de me acompanhar até lá. No caminho, deu dicas de turismo e me contou, brincando, que os nepaleses chamam Kathmandu de “Dustmandu”, um trocadilho com a palavra em inglês “dust”, que significa “poeira”. E a região onde eu me hospedei é especialmente empoeirada. Thamel é o bairro central onde os turistas costumam ficar por causa da grande oferta de hotéis, albergues, restaurantes e lojas. É muito estratégico e adorável. Mas eu precisava descansar pra poder descobrir tudo isso.
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No dia seguinte, passei o tempo andando e conhecendo Thamel. Entrei nas lojas, me encantei pelas bandeirinhas de orações budistas que decoram as ruas e me diverti com o emaranhado de fios da rede elétrica que mais parecem um monte de espaguete enrolado nos postes de luz. E fui me encantando pelas pessoas com quem cruzei e tive a chance de conversar. Percebi que existe um hábito entre os nepaleses que é o de dar oi e logo querer saber de onde você é. E pra cada vez que respondia “Brazil”, ouvia o nome do Ronaldinho. Alguns falavam do Fenômeno; outros, do Gaúcho. Mas havia sempre essa unanimidade em idolatrar o grande Ronaldinho – que entre nós já nem é tão lembrado.
A maratona pelos templos e praças reais começou no outro dia. Três cidades do Nepal foram sedes de moradia dos reis: Kathmandu, Bhaktapur e Patan. Esses espaços reúnem templos e construções antigas e típicas. Os três podem ser visitados e o ingresso mais caro é o de Bhakhtapur, que custa 1500 rupias nepalesas. É também a praça real mais bonita, enorme e vira um passeio de um dia – principalmente porque fica fora de Kathmandu e a viagem até lá leva quase uma hora. A única que não conheci foi a de Kathmandu, porque foi a mais destruída pelo terremoto e me disseram que não valia a pena priorizá-la. O passeio por essas praças é lindo, principalmente pra ter contato com a grandeza da cultura e arquitetura do Nepal. Mas em termos de troca cultural, dois templos de Kathmandu dão uma verdadeira aula pra nós.
O templo Swayambhunath, também conhecido por Templo dos Macacos, fica no alto da cidade e tem uma lenda curiosa. Dizem que no local havia um lago com uma flor de lótus, plantada por Buda, que tinha um brilho sem igual. Quando Deus resolveu secar o lago, a tal flor foi parar no alto da colina, exatamente no local onde fica a principal estupa do templo. É uma grande estupa branca, com a ponta dourada, que se destaca de longe. Como o templo fica no alto de uma colina, é preciso subir uma escadaria com 365 degraus. Mas a vista compensa – e o trajeto também, porque a gente vai subindo e vendo vendedores ambulantes fazendo artesanato e vai encontrando os moradores ilustres do templo: um número enorme de macacos que não dão a mínima pros visitantes. O complexo do templo é relativamente grande e vale a pena dar uma circulada. No fim dele tem um pequeno monastério e eu até tentei conversar com alguns dos monges que vivem lá, mas nenhum falava inglês.
O templo imperdível, na minha opinião, é o Pashupatinath, onde são realizadas as cremações ao ar livre. Se a ideia de ir lá te causa alguma repulsa, pense duas vezes, porque é uma chance extraordinária de ter contato com uma cultura diferente da nossa e, sobretudo, de reavaliar o peso que damos para a morte. Pashupatinath é o maior templo do Nepal dedicado ao deus Shiva, do hinduísmo. E é aberto apenas aos hinduístas. Ele fica às margens do rio Bagmati, que é um dos afluentes do rio Ganges, o rio sagrado, e é exatamente na beira do rio que são realizadas as cremações. O acesso é livre. Ninguém fica do lado da família, mas é possível assistir a todo o ritual e se você conseguir deixar o preconceito e o julgamento de lado, vai ter uma experiência muito interessante. O corpo é protegido por um pano e, depois, por palhas. E, portanto, não fica exposto. A família tem um ritual para se despedir do parente, que é feito e comandado pelos homens. O fogo é colocado por uma pessoa da casta dos intocáveis – que é a casta/camada social mais baixa entre as que existem. Depois de alguns minutos, a família vai embora e deixa o corpo sendo cremado, sozinho. Quando visitei, vi umas três cremações sendo feitas ao mesmo tempo. Não assisti a todas até o fim, mas ver o ritual me trouxe reflexões profundas sobre a vida e o fim dela – por mais clichê que isso possa parecer.
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Uma dica importante que dou é ler bastante sobre os locais antes de fazer os passeios. Os templos não têm explicações em inglês e eu encontrei muito guia que apenas direcionava a visita, sem contar muitas histórias. Além de entender melhor o que vai ser visto, você ainda consegue se comportar com mais respeito nesses locais – que pros turistas podem ser apenas um ponto interessante de visita, mas pros moradores são locais sagrados. No mais, aproveite toda chance de interagir com os nepaleses porque são um povo muito especial. E vão tornar sua viagem inesquecível.