Primeira mesquita liberal na Alemanha
Pela primeira vez em toda a Alemanha, Berlim conta desde junho de 2017 com uma mesquita liberal. Homens, mulheres, sunitas, xiitas, alevitas, sejam eles heterossexuais ou homossexuais: todas as pessoas são bem-vindas no local chamado Ibn Rushd Goethe Moschee. O nome é uma mistura em homenagem ao médico, filósofo e estudioso do islã árabe Ibn Rushd e ao poeta e cientista alemão Johann Wolfgang von Goethe. Quebrando tabus e indo na contramão das tradições, a idealizadora e carro-chefe da nova mesquita é uma mulher. Seyran Ateş, alemã de origem turca, é advogada, autora, muçulmana e ativista de direitos das mulheres.
O principal objetivo é oferecer um lugar para um islã moderno e progressista, separando firmemente religião e política e apresentando uma interpretação contemporânea e equitativa de gênero tanto do Alcorão quanto do Hádice. Além disso, a ideia é que os muçulmanos que têm uma visão crítica da religião mais tradicional e conservadora – assim como ela – se encontrem e possam se sentir bem. As prédicas ocorrem em alemão, com tradução para turco e árabe. A única coisa que não está permitido na mesquita é a burka ou niqab – ou seja, mulheres com todo o rosto coberto. Ao contrário do costumeiro, homens e mulheres rezam juntos.
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No entanto, é claro que, como muitas mudanças e novidades, o assunto gerou polêmica entre os mais religiosos e conservadores. Em resposta à inauguração da mesquita, por exemplo, representantes do Egito divulgaram uma declaração considerando a prática de homens e mulheres orando lado a lado como inadequados no islã, além da Universidade Al-Azhar também emitir uma fátua contra mesquitas liberais em geral. No início, inclusive, a mesquita berlinense teve de contar com proteção policial devido às muitas ameaças recebidas.
De maneira geral, a maioria das mensagens recebidas eram e continuam sendo de apoio. Entretanto, ainda hoje há hostilidade por parte de conservadores e alguns percalços pelo caminho, como a necessidade de maior apoio financeiro e o distanciamento de alguns apoiadores devido ao medo das ameaças. Mesmo assim, a idealizora garante que está satisfeita com o resultado e com a trajetória da mesquita até o momento, afinal o projeto já é desenvolvido desde muitos anos e, portanto, os desafios e até mesmo a rejeição de algumas partes eram situações esperadas. Outros países como França, Canadá, Estados Unidos e Inglaterra também contam com espaços semelhantes, visando ideias progressistas e a inclusão de todos independente de gênero ou orientação sexual.
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A mesquita Ibn Rushd Goethe funciona em um local adjunto a uma igreja protestante no bairro berlinense de Moabit. Além das costumeiras prédicas religiosas, outros tipos de eventos também são proporcionados como encontros interreligiosos, palestras e rodas de discussões sobre diversos assuntos (como por exemplo direitos das mulheres e dos homossexuais), brunchs ou até mesmo exposições de arte. Tudo pode ser facilmente acompanhado na página do Facebook. Outras atividades interessantes são as aulas de árabe e de Baglama (instrumento típico da Turquia e outros países) oferecidas na mesquita. Aliás, como sou aluna das classes da língua, apesar de pessoalmente não ter nenhuma ligação com o mundo árabe, posso garantir e recomendar: Os professores são maravilhosos, gentis e os ppreços ínfimos. Em caso de interesse, mais informações podem ser encontradas no website.
Trajetória da idealizadora
A luta de Seyran Ateş já começou, portanto, muito antes da criação da mesquita Ibn Rushd Goethe. Ela critica principalmente as comunidades conservadoras e luta por um posicionamento mais firme por parte do islã e dos muçulmanos contra o extremismo religioso. Mesmo antes da inauguração da mesquita liberal, muito já foi feito pela ativista. Ela chegou na Alemanha com seus pais quando tinha apenas seis anos de idade e, após concluir o curso de Direito em Berlim, abriu um centro de encontro, auxílio e aconselhamento para mulheres turcas e curdas.
Seyran Ateş publicou e ainda publica livros, artigos e faz palestras principalmente contra o que é legitimado por o que acredita ser uma falsa compreensão da segregação de gênero no islã. A opressão das mulheres é um dos seus principais temas, o que na sua visão ocorre especialmente através de convicções impostas e casamentos forçados. Outros temas abordados pela ativista são os casamentos de crianças e as “mortes por honra”. Por todo seu engajamento, a ativista já recebeu diferentes condecorações e homenagens na Alemanha. Eu, pessoalmente, sou fã!