Desde antes de mudar para a China, na realidade, quando nem imaginava que um dia poderia sequer visitar esse país distante, tenho muito interesse sobre várias práticas da cultura chinesa: a medicina tradicional, incluindo acupuntura, do-in etc, o Feng Shui, Tai Chi e I Ching, entre outras coisas que não me recordo agora. Aí, claro, que vivendo aqui, estamos com “a faca e o queijo na mão” para buscar toda as informações possíveis sobre essas atividades que promovem o bem estar do corpo e da mente e da medicina chinesa como sendo um tratamento global.
Hoje, vamos falar um pouco da Tradicional Medicina Chinesa (TMC), que está intrinsecamente relacionada com a cultura da China. Não sou nenhuma especialista no assunto e tão pouco quero dar receitas prontas. A intenção aqui é dividir o que aprendi em alguns cursos que fiz sobre a cultura chinesa e suas práticas, mostrando alguns conceitos básicos que nos levam a entender um pouco da lógica, crença e hábitos do povo chinês, porque no final está tudo interligado.
Tradicional Medicina Chinesa
Aqui no artigo, vou usar a sigla TMC, que é a abreviação do título em português. Se alguém tiver interesse em pesquisar mais, é bem mais fácil encontrar material em inglês onde o nome é “Traditional Chinese Medicine” e a sigla é TCM.
A definição dada para a TMC é “um completo sistema medicinal que possui um entendimento profundo das leis e padrões na natureza e aplica isso no corpo humano”. A TMC busca saber por que a doença ocorre e como diagnosticar e prevenir essas doenças mantendo o corpo sadio. É mais efetiva para dores, mas atua com muito sucesso nas doenças funcionais e do sistema nervoso.
Teoria básica da TMC
Yin e Yang: esse símbolo tão conhecido no ocidente é um dos princípios fundamentais da medicina chinesa. A forma circular representa a perfeição do universo, e as duas cores mostram a harmonia, que tudo tem dois lados – noite e dia, homem e mulher, inverno e verão.
Os cinco elementos: de acordo com a astrologia chinesa, o universo é basicamente formado pelos cinco elementos: água, terra, metal, fogo e madeira. Esses elementos se alinham em círculo, formando uma estrela que define as relações entre eles, que são – afinidade e repúdio. Cada um desses cinco elementos também apresentam características como cor, estação do ano etc.
Qi e Xue: energia e sangue. E aqui não se lê somente o “sangue vermelho”, mas todo o fluido líquido que corre pelo nosso corpo. Xue (sangue) é o fluido que nutre e hidrata o corpo. Qi (energia) é a fonte de atividades do corpo, nos protegendo de doenças e mantendo-nos aquecidos. Quando não há harmonia entre essas forças, o sangue acaba sentindo através de deficiência, estagnação ou aquecimento.
Sistema de meridianos (canais): Jing Luo – Foram descobertos há 7000 anos e tem a função de carregar e distribuir o Xue e o Qi (sangue e energia).
Jing – funciona como uma linha vertical, da cabeça aos pés.
Luo – trabalha no meridiano do corpo, na horizontal.
Diagnóstico
Os métodos de diagnósticos usados pela TMC são inspeção, odor e som, questionamento e toque. Geralmente o médico não toca o paciente, o máximo que ocorre é o toque com os dedos na parte interna do pulso. Além disso, a observação da língua e da córnea.
É impressionante como depois de sentir nossa pulsação e olhar nossa língua, as perguntas e afirmações são certeiras, do tipo: “seu intestino não está funcionando corretamente”. E você fica com aquela cara de interrogação: “Como ele descobriu isso?”.
Os principais tratamentos oferecidos
Fitoterapia – através de chás, compressas com ervas naturais ou combinadas entre si. Esse é o tratamento mais comum. Mas não se pode esperar milagres. Mais ou menos como na homeopatia, esses “medicamentos” agem devagar e, algumas vezes, precisam ser trocados devido às reações do paciente. E também, não posso mentir, são horríveis! Mas funcionam.
Massagem – com técnicas de fricção, amassamento e pressionamento. Podem ser somente nos pés (que carregam terminações para cada parte e órgão do nosso corpo), conhecidas como ou no corpo todo. Uma coisa interessante, que eu não sabia, é que, segundo a TMC, há muitas contraindicações para a massagem, principalmente a nos pés! E a gente sempre pensando na massagem como algo inofensivo…
Entre as principais, estão: problemas sérios de pressão sanguínea, doenças no coração, durante o período menstrual, gravidez, problemas com sangramentos, logo após as refeições e raiva – sim, quando se está com muita raiva de algo ou situação, essa energia pode se espalhar pelo corpo e a massagem não é recomendada.
Acupuntura – técnica que coloca agulhas nos pontos do corpo referentes a cada órgão que se deseja tratar. Eu sou fã de carteirinha da acupuntura, que comecei a praticar no Brasil.
Cupping ou Ba guan: é a técnica em que colocam copos, geralmente nas costas, que fazem uma sucção das toxinas do corpo. Eu nunca fiz e, na realidade, me incomoda muito ver as pessoas com as marcas no corpo, que levam de 5 a 7 dias para sair. Mas as pessoas que conheço que fizeram, amaram!
Gua Sha ou esfoliação: na realidade, a tradução ao pé da letra é arranhar, raspar as toxinas! Sim, isso mesmo. ‘Gua’ significa raspar e ‘Sha’ toxinas. Consiste em passar espátulas no corpo até praticamente sangrar.
Curiosidades
O Tai chi – palavra que deriva do cantonês, por isso aqui é chamada de Taiji, que é a pronúncia correta em mandarim – é considerada um tratamento preventivo pela TCM. Essa arte promove a circulação do Qi (energia) de forma harmoniosa pelo seu corpo.
A alimentação está intrinsecamente ligada à saúde dentro da TMC, fato que está cada vez mais em voga no ocidente também. Dentro dessa teoria eles classificam as comidas como YIN (frutas e vegetais), YANG (carnes) e NEUTRAS (sementes, oleaginosas, cereais, grãos, algumas frutas e vegetais como pera e a maçã). Da mesma forma, yin e yang são complementares, por isso o chinês, apesar de comer muito menos carne que os ocidentais, não é vegetariano.
O sabor dos alimentos tem ligação com partes do corpo: doce – baço e estômago; azedo – fígado e vesícula; amargo – coração e intestino fino; salgado – rins e bexiga; picante – pulmão e intestino grosso.
As cores dos alimentos também são levadas em conta: amarelo – cérebro; laranja – coração e pulmão; verde – fígado; azul e/ou roxo – calmante; vermelho – fornece energia e vitalidade.
Existem horas do dia que são melhores para cada parte ou órgão do nosso corpo, como das sete às nove da manhã para o estômago.
Cada um dos cinco elementos citados anteriormente, também é responsável por determinadas partes do corpo e a falta de equilíbrio de cada um, é um dos fatores que causam as doenças.
Os alimentos são divididos em categorias – quentes, mornos, frios e gelados – e devem ser consumidos de acordo com as estações do ano, contrapondo com a temperatura da estação. Por exemplo, no inverno devemos comer alimentos quentes e no verão os frios.
As palmas das mãos possuem todos os pontos dos órgãos e partes do corpo, como os pés. E é por isso que os chineses gostam tanto de bater palmas! Na realidade, não é bater palmas com aquele nosso jeito efusivo de “parabéns”, incentivo. É um bater as mãos, simples e ritmado, que eles geralmente fazem quando estão andando (principalmente os mais velhos) e ainda batem as palmas das mãos nos braços, ombros e cabeça. O Objetivo? Estimular os órgãos vitais e esse movimento das mãos faz com que as toxinas saiam do corpo, segundo a TMC.
Esses são os princípios básicos que aprendi sobre a medicina chinesa.
Mas os chineses estão numa fase de muita mudança e muitos optando pela medicina ocidental e as medicações alopatas. Só é bem interessante que, para algumas situações, eles são radicais nas tradições e seguem à risca o conhecimento milenar: o que comer no inverno ou verão, como cuidar de uma mulher durante a gravidez e pós-parto, tipos de chá que se toma durante o dia e à noite e assim vai.
No final fica um misto de tradição milenar, respeito pelo corpo de forma global e aquelas “receitas das avós”, que sempre são tiro e queda.
Viver essas experiências é uma das melhores coisas de se morar na China!
Até a próxima!