A minha experiência em uma escola nada tradicional na Polônia.
Viver na Polônia me traz novas experiências. Pensei que ja tivesse vivido todas as novidades da vida após ter passado mais de uma década em Londres, mas estava equivocada, ainda bem! A minha nova cidade, Białystok me trouxe mais um novo desafio, ser professora de inglês em uma floresta na Polônia. É isso mesmo. Há seis meses eu faço parte do time da Puszczyk, que significa coruja em português.
Embora tivesse lido sobre este tipo de escolas em países como Noruega e Suécia, não imaginava que eu pudesse me deparar com uma proposta de ensino singular, criativo e construtivo como este na Polônia. Quando a minha amiga Marta me ligou contando sobre que escola estava procurando um professor de inglês, eu não pensei duas vezes, fiquei interessada imediatamente. Ela me passou o contato de uma das realizadoras do projeto, liguei e logo em seguida marcamos de nos encontrarmos. Claro que a minha capacidade de achar endereços nunca foi um ponto forte e achar este não seria diferente. O local onde começa a escola é onde termina a cidade, no fundo de uma pequena rodovia com algumas casas, a maioria ainda em construção. Apesar do pequeno atraso, me deparei com um lugar incrível, crianças sujas de alegria, de brincar na terra, de subir em árvores, de explorarem o mundo com criatividade, onde o principal instrumento das brincadeiras é a imaginação.
A entrevista com as donas foi tranquila. Aceitei o desafio e sai de lá radiante. Mais do que um trabalho, aquele momento foi de passar a acreditar na humanidade, eu vi o futuro nos sorrisos daquelas crianças. Senti o privilegio delas, não somente por estarem em uma escola particular, mas por terem a oportunidade de passar a fase mais importante de suas vidas, a infância, ao ar livre, independente do tempo, e fazendo o que toda criança deve fazer, brincando. Esta é uma das mais valiosas formas de descobrir o mundo e de desenvolver varias das habilidades, como motora, social e emocional.
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Quando menos imaginei, me vi como a única estrangeira – que ainda não fala o idioma local – dando aula na primeira escola na floresta na Polônia. Senti como estivesse entrado em uma família. Naquele momento eu percebi que mais do que a minha habilidade de ensinar inglês para crianças de três a 12 anos, aquele era o momento de desafiar a mim mesma, e testar a minha capacidade de adaptar a uma nova forma de aprendizado, ao uma nova maneira de me relacionar com os alunos e o quanto eu consigo ficar exposta a temperaturas frias. Como não sou uma pessoa de negar desafios e vi ali um local que iria aprender tanto quanto ensinar, talvez diria que aprenderia ainda mais. Assim iniciou a minha trajetória.
Nas primeiras semanas o meu principal objetivo era me ‘enturmar’ com as crianças. Passei a observa-las e a interagir com elas naturalmente, sem forçar a amizade (ainda se usa esta expressão no Brasil?). Embora não tenhamos um idioma em comum, fiquei surpresa com a recepção dos pequenos, a qual foi ótima. Quem trabalha com criança sabe, que eles não mentem, ou gostam ou não gostam. A recepção das crianças era sempre positiva, algumas vinham me receber com abraços, gritavam o meu nome, seguravam a minha mão para mostrar algo. Umas queriam mostrar a musiquinha que sabiam em inglês, outras queriam mostrar o que conseguiam fazer com a bicicleta ou somente me traziam uma planta.
Os gringos tem a imagem que todo brasileiro cresce em meio a natureza, mas este não foi o meu caso. Sou urbana, cresci no asfalto, não subia em árvores, o meu desafio era tirar a bola que caia dentro do bueiro ou correr depois de ter apertado a campainha do vizinho. Tudo muito cidade. Mas foi na Polônia, depois dos 40, que eu subi em uma árvore como criança. E lá de cima, os papéis se confundiam. Não sabia quem era aluno e quem era professor. Éramos todos iguais. Neste caso, sentadas no tronco da árvore e com os pés balançando no ar, eu aprendia polonês e ensinava inglês.
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Toda manhã, antes de iniciarem as atividades, as crianças de reúnem em circulo e cada um diz o que esta sentindo, se esta triste ou feliz. Acredito que esta é uma maneira incrível de aprender a lidar com a inteligência emocional, um exercício para expressar os seus sentimentos e respeitar os dos amigos.
Todas as vezes que chego à escola na floresta, me deparo com um novo aprendizado. Andar pela floresta e aprender qual cogumelo e comestível ou não. Usar a imaginação ao entrar em uma ‘casa de gravetos’ e ser servida com comida ‘de neve’. Dançar e cantar juntos. Tentar motivar ao invés de fazer algo pra criança – na qual ela é capaz de fazer sozinha. Foi incrível ver crianças despertando a independência deste de cedo. Ser servida por uma panqueca que acabou de ser preparada por sua aluna de 10 anos em sala de aula. Ler um livro de inglês trazido por uma criança de apenas quatro anos. Tudo isso não tem preço. Quebrar a barreira do idioma, da cultura, e estar aberta para o aprendizado de ambos, alunos e professor.
Estas crianças tem uma infância que é de descobertas, elas se interessam em aprender e são agentes deste aprendizado, um processo que acontece naturalmente, respeitando a individualidade de cada aluno. Todos nos temos o nosso tempo. As crianças também.
A minha felicidade é imensa de fazer parte disso. Quero fazer a diferença, por isso me identifico com este tipo de ambiente, onde as pessoas ousam mudar, em fazer diferente, respeitando tudo e todos que estão a sua volta. Pra mim, é como uma família, é o futuro. O meu laço familiar cresce cada vez mais que me abro para o mundo e para as novas possibilidades. Leia uma matéria em inglês sobre a escola.
Sorte que projetos como estes existem em outros lugares, até mesmo no Brasil, como a Cidade Escola Ayni.
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Que legal a sua experiência com as crianças. Sou brasileira e moro em uma cidade próxima de Białystok. Gostaria de manter contato com vc, se possível.