Antes de entrarmos no tema do post, faço um parêntese: não quero aqui parecer antipatriota ou mal-agradecida. Pelo contrário, amo o Brasil e torço muito para que encontremos uma saída para os problemas mais graves do país, como a violência e a má distribuição de renda, por exemplo.
De todo modo, estes pontos abaixo refletem as principais razões que me motivaram a buscar a felicidade em outro país. Já digo de antemão que não é fácil, nem tudo são flores, toda escolha envolve perdas e ganhos. Cabe a cada um analisar muito bem a sua situação antes de tomar uma decisão importante como essa.
De forma geral e genérica, a primeira sensação que tive ao sair do Brasil foi: a de ser livre!
1- Livre da violência de São Paulo
Apesar de saber que o que eu fiz foi burrice, ao ser assaltada a minha reação de defesa foi reagir – eu enfrentei o ladrão e poderia não estar aqui para escrever isso. Ciente do risco que corri, passei a temer tudo e todos que se aproximavam do meu carro. É um sentimento de terror que está longe de me abandonar. Até hoje quando passo em um lugar ermo ou potencialmente arriscado, ainda suo frio e começo a tremer. Acho que só daqui uns anos este trauma vai se dissipar. Torço para que minha filha nunca passe por isso na vida. Não preciso dizer que este foi o principal motivo da nossa partida: a falta de segurança e a indiferença com que a mesma é tratada no Brasil.
2- Livre do trânsito de São Paulo
Eu levava cerca de 1h30 para ir e mais 1h30 para voltar do trabalho. Tempo esse que poderia ser acrescido de mais 1 hora se qualquer coisa acontecesse no trânsito. O que não era difícil. Ou seja, passava entre 3 e 4 horas sentada no carro, estressada e com medo, como expliquei acima.
3- Livre da necessidade de ter um carro
Aqui na Itália o transporte público funciona, é prático e barato. E dá para fazer mercado e as coisas do dia a dia a pé. Sempre sonhei em buscar a minha filha a pé na escola…
4- Livre do custo de vida absurdo
São Paulo está entre as cidades mais caras do mundo. E por um misto de medo e conveniência, acabamos optando por nos enclausurar em shoppings, clubes, teatros e afins. Com isso só de custo básico, como estacionamento ou manobristas, ingressos e alimentação básica, o gasto é bem alto. Hoje eu percebo como tudo pode ser mais simples e mais barato.
5- Livre da pressão do status
No Brasil, logo após perguntarem seu nome, perguntam a sua profissão. Reparam no seu carro, na sua roupa e no seu celular. E ai de você se não estiver bem vestida, com carrão e celular de última geração. Muitas vezes, a cobrança não é direta, mas acontece por meio de um olhar de desprezo, uma piada maldosa ou um comentário irônico.
6- Livre da pressão de ter uma profissão de sucesso
Como complemento ao item acima, você tem que ter uma profissão de glamour, ou seja, tem que ser alguém com faculdade, pós-graduação, inglês fluente e mais alguma outra língua para ser alguém respeitado. Qualquer outra profissão ou trabalho que seja braçal, apesar de digno, é visto como subcategoria ou subclasse, subemprego. Algo muito feio e que precisamos mudar urgentemente.
7- Livre de pagar tudo duas vezes
Eu pagava um absurdo em tributos e ainda precisava ter plano de saúde, pagar a escolinha da minha filha e pagar condomínio por morar em apartamento para me sentir segura. Na Itália, minha filha pode estudar praticamente de graça, a saúde é subsidiada pelo Estado e me sinto totalmente segura.
8- Livre de comer comida com aditivos químicos
O sabor e a textura da comida aqui são diferentes e perceptíveis desde a primeira garfada. E olha que nem estou falando da famosa dieta mediterrânea que é praticada na Itália. Mas o tomate é doce, a alface e rúcula são (mais) crocantes, e até os sucos de caixinha são livres de açúcar e feitos de pura polpa de fruta. E não estou sendo Pollyana e usando lentes cor de rosa, o Brasil está (infelizmente) entre os países que mais usam agrotóxicos no mundo.
9- Livre de cumprir horário comercial
Atualmente sou profissional autônoma e faço meu horário de trabalho. Não quer dizer que trabalhe menos, mas sou livre para levar minha filha ao parque no meio da tarde, brincar com ela e continuar o trabalho depois que ela dormir. Sem ter que explicar nada a ninguém. Eu nunca pensei que essa flexibilidade fosse tão importante, até ter filhos.
10- Livre pois optei por viver assim
Por fim, sou livre por ter feito essa escolha de morar fora. Não é nada fácil abandonar a família, os amigos e a carreira para recomeçar do zero em outro país. Na Itália sou apenas (mais) uma imigrante buscando meu lugar ao sol. Com todos os dissabores que isso possa acarretar. Aliás, esse vai ser o assunto do próximo post.
De qualquer forma, toda vez que passo por um contratempo aqui na Itália, revisito mentalmente a lista acima e penso que o preço a pagar para manter esta liberdade conquistada é deveras baixo.
Arrivederci!
2 Comments
Prezada Ana Paula: Entendi tuas razões da mudança,porém sei que o trânsito de Roma é tumultuoso eo de Nápoles um pavor,além disto há pivetes e assaltos em roma etc….,inclusive vi um e brasileiros foram atacados .O custo de vida em euro é muito grande.Empregada etc….não é possível aí.Realmente no Brasil as autoridades e legisladores não tratam a segurança e a punição rigorosa a crimes graves etc….como deveria.
Infelizmente não, Solon.
A insegurança que vive o brasileiro é realmente torturante!
Espero que essa situação mude no curto prazo.
Sds.,
Ana