Um desabafo e uma pequena carta aos novos imigrantes brasileiros
Esse texto foi escrito com muita dificuldade. Simplesmente faltou inspiração. O fato de eu estar vivendo o turbilhão de mais uma mudança internacional (EUA-Portugal) contribuiu e muito, para o meu esgotamento mental.
Mas não é só isso. Comecei a me questioner profundamente sobre o conteúdo que produzo e compartilho nas redes. Aqui, no Brasileiras pelo Mundo, no meu blog pessoal e também em minhas contas de mídias sociais.
Sinto que estamos vivendo um mundo de espelhos. Cada vez mais em bolhas, que segregam e não unem, falamos para iguais e quando há um desacordo, ou conflito de opiniões, o debate cede lugar ao silenciamento. Pessoas se retiram de diálogos que não concordam e se refugiam nos seus grupos de certezas. Confesso que também faço isso!
Quando há argumento, vira-se logo discussão e apontar de dedos, todos certos de suas verdades absolutas.
Isso têm feito do mundo um lugar perigoso, árido e bruto. Passei então a me perguntar o quanto também não estou contribuindo para essa fogueira aumentar.
Parece banal escrever e compartilhar sobre as experiências na vida de imigrante, porém mesmo assim, as polêmicas se formam e passei a me questioner em que medida, de fato, a minha vivência poderia contribuir para a do outro?
Imigrar equivale a uma queda livre. Caímos de um abismo de conforto e aterrisamos em solo sempre desconhecido e desconfortável.
Alguns se agrupam novamente, entre iguais. Criam grupos de brasileiros, encontros de brasileiros, festas de brasileiros e passam a viver no pequeno Brasil, que pode ser em Bruxelas, Orlando ou Cascais.
Outros, como eu, procuram mergulhar na cultura local, adquirem novos hábitos e nem se lembram mais o que é arroz e feijão.
São experiências completamente distintas e igualmente válidas, cada uma com suas dores e delícias. Tentando então suprimir a minha arrogância e sem intenção nenhuma em ditar regras, resolvi escrever uma pequena carta aos novos imigrantes, que trata de um ingrediente fundamental ao sucesso do processo de expatriação: respeito!
Leia também: Tudo que você precisa saber para morar em Portugal
Caro imigrante brasileiro:
Em primeiro lugar, seja bem vindo a essa aventura transformadora. Prepare-se para viver uma espécie de montanha russa, com altos e baixos vertiginosos.
Muitas vezes no topo, você irá se deliciar, com as novas paisagens, novos sons, cheiros e sabores. Um horizonte vasto de possibilidades, que só conseguimos enxergar quando estamos no alto. Aproveite!
Contudo, a queda também é inevitável. Haverá a solidão do inverno, do idioma e da saudades de casa. O desconforto de não se sentir pertencente e a dúvida recorrente: será que fiz a escolha certa?
Em alguns momentos, você se deslumbrará. Achará que chegou ao paraíso ( principalmente se for nos EUA), pois finalmente vive em uma casa parecida com aquela que via na TV. Tomará seu café em um copo do Starbucks, caminhando pela rua seguramente e ficará encantado em saber que pode comprar aquele tão sonhado tênis por ¼ do preço do Brasil.
São pequenos prazeres, fúteis e efêmeros, mas que também fazem parte do pacote da imigração.
Contudo, em outros momentos, você se sentirá um complete forasteiro, sem entender nada do que se passa, sem encantar-se como turista e sem sentir-se como local. Prepare-se, a frustração será certeira.
E assim, dias somam-se e transformam-se em semanas. Muito aprendizado, muita descoberta e sempre um gostinho de querer mais.
Saiba, novo imigrante, que uma vez experimentando essa vida, fica difícil voltar e se conformar com a rotina do nosso local de origem. Nessas minhas caminhadas, quase não conheci ninguém que pensa em voltar ao Brasil.
Isso me leva a concluir que é bom e que vale a pena, mas para que a experiência seja bem sucedida lembre-se da regra básica e número um: respeito!
Quando chegamos na casa de alguém é preciso respeito. É preciso entendermos que a casa não é nossa, que as regras não são nossas e que se estamos lá, convidados ou não, devemos agir de acordo com o ritmo deles e não o nosso.
Morar nos EUA, nem sempre foi fácil. Ao contrário. Foram muitos costumes e métodos que irritavam e incomodavam a minha natureza brasileira, que é tão marcada pela espontaneidade.
Mas aprendi a respirar fundo, segurar minha onda e respeitar as regras desse novo país que me recebeu.
Assim ficou tudo mais fácil.
Isso não significa se anular, se mascarar, ou renegar nossas próprias raizes – ao contrário! Estarmos abertos a novos costumes e novas formas de encarar a vida, pode reforçar valores que carregamos. Novas possibilidades são abertas e podemos rever o sentido de tantos comportamentos que apenas repetimos, inconscientemente.
Sei que parece complicado, e realmente é! A linha tênue entre a aceitação e a subserviência pode ser extremamente difícil de ser notada.
Como já escrevi outras vezes, os EUA é um gigante país e seus costumes e hábitos variam muito, de costa a costa, de norte a sul.
Ter vivido nas cercanias da capital norte-americana, foi uma incrível experiência. Tudo era mais formal, mais comedido, mais pensado.
Quando já estava habituada e confortável em minhas caminhadas por D.C. me mudei para Seattle e foi como mudar de país.
Seattle difere em tudo da Virginia e precisei de alguns meses para me ajustar a uma nova realidade.
Um exemplo banal: minha filha mais velha sempre gostou de colorir os cabelos. Ela morava na Filadélfia e resolveu pintá-los metade azul, metade pink. Quando chegou na estação de D.C. para me visitar, parecia uma celebridade, com todos os pescoços se voltando para ela.
Se fosse em Seattle, ela seria invisível na multidão de cabelos coloridos, raspados, com dreads, toucas, etc.
Leia aqui onde falo sobre o que Seattle me ensinou.
Já em Portugal, nesse curto período que cheguei tenho vivido uma experiência completamente diferente.
As similaridades são tantas que nos sentimos à vontade, para dizermos e fazermos o que bem entendemos, como se estivéssemos na casa da avó.
Só que não estamos. A língua é a mesma, costumes e atitudes são parecidas, mas há um oceano inteiro a nos separar. Há séculos de história e cultura a nos distanciar. Não dá para agirmos desatentamente, como se estivéssemos em nosso quintal.
Portugueses me parecem um pouco atônitos com o imenso número de brasileiros que têm chegado aqui, de mala e cuia.
Que tal então mostrarmos a eles o que temos de melhor? Nossa simpatia, gentileza e educação.
Ser imigrante é ser mestre na arte de construir pontes e não muros, ao contrário do que pregam alguns líderes políticos, e a nossa contribuição é sermos atentos ao nosso comportamento diário.
Por isso caro imigrante, o convido a mostrar para o mundo o que temos de melhor e fazermos nosso trabalho de formiguinha na transformação de um mundo mais receptivo e generoso.
Sei que nós brasileiros, somos mais do que capacitados para isso. Vamos lá? Mesmo fiéis a nossas ideologias e crenças, é possível caminharmos pelo mundo com suavidade e aceitação a novas ideias e comportamentos, que podem nos acrescentar muito.
Aproveite a sua jornada e seja o melhor que puder – sempre – em qualquer canto desse mundão.
Até a próxima onde passarei a compartilhar minha vida em terras lusitanas!
1 Comment
Sempre atenta a auxiliar pessoas que passam por experiência como a sua, seu novo texto tem a palavra chave pra ser bem aceito e viver bem no Brasil ou qualquer lugar do mundo…Respeito!!!!!
Parabéns pela escolha do tema, seremos sempre respeitados se respeitarmos tbm.