” Você gosta de morar em Portugal?” Uma pergunta de difícil resposta…
Quando nos mudamos de país é sempre natural e esperada a curiosidade que despertamos. Assim, mal assentamos as malas e já começam as perguntas: está gostando?
Estava pensando nisso enquanto caminhava pelo meu novo bairro, ainda tão estranho e percebi o quão complexa é essa pergunta. Não dá jamais para respondê-la de modo simples, sim ou não.
Aliás pouquíssimas coisas na vida se encaixam nessa simplicidade maniqueísta.
Resol
vi então elaborar um pouco mais essa resposta e descobrir, dentro de mim mesma se estou – ou não – gostando de viver aqui.
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Primeiramente há uma diferença importante: eu vim para Portugal depois de 5 anos de Estados Unidos. Portanto, muitas coisas que normalmente deslumbram os brasileiros, já haviam perdido o encanto e a mágica para mim. Coisas como os básicos da civilidade, que infelizmente não temos no Brasil. Não jogar lixo nas ruas e praias, respeitar faixas de pedestres, respeitar ordem das filas, ter escolas públicas decentes, estradas e ruas bem pavimentadas, caminhar nas ruas sem medo de violência, etc.
Triste que esses quesitos deveriam ser as premissas de todas as sociedades, mas lamentavelmente ainda não foram alcançados em muitos lugares da nossa pátria.
Sim, tudo isso existe em Portugal, e não há como não gostar. Porém, a mim, não encanta. Assim como hoje não consigo mais elogiar e exaltar homens que executam tarefas domésticas e educação dos filhos, pois o que fazem nada mais é que obrigação. ( segue aqui o meu lembrete feminista e sempre necessário!)
As ruas, paisagens, história, arquitetura portuguesas, etc. são realmente deslumbrantes. Acho que um dos lugares mais belos que já conheci. Sempre me surpreende.
O ritmo de vida, sobretudo no pequeno vilarejo praiano em que vivo, é infinitamente mais tranquilo do que o frenesi americano de trabalho, quase que 24 horas por 7 dias da semana.
As pausas do almoço são obrigatórias, o tempo das refeições e das férias sagrados, e tudo isso não tem como não admirar. Aqui tempo vale muito mais do que dinheiro, e isso é um modo de viver que deveria ser mandatório!
A língua também não é um problema, como foi o inglês para mim. Esse sem dúvida, é um elemento facilitador. Porém, me desculpem os portugueses que me lêem, falta no acento europeu a simpatia e a docilidade que nós brasileiros temos, quase cantamos ao invés de falar. Isso pode confundir e um tom ríspido e áspero, normalmente ouvidos, não deve nos magoar, trata-se apenas do modo como eles se comunicam.
E assim entro nas diferenças culturais e comportamentais, que por enquanto têm sido um desafio. Somos descendentes dos portugueses, dividimos o mesmo idioma e origem, porém, noto mais diferenças do que similaridades.
Apesar do país estar vivendo o “boom”turístico, com milhares de turistas estrangeiros caminhando por todos os lados, o povo português parece ainda atônito com a invasão de imigrantes, sobretudo brasileiros.
Eu estou vivendo em Cascais, um charmoso balneário nos arredores de Lisboa. Por conta da beleza do mar, esse vilarejo atraiu muitos brasileiros, e às vezes, me custa acreditar que estou em Portugal e não no Rio de Janeiro – lugar de origem da grande maioria dos moradores estrangeiros daqui.
Percebo que estamos incomodando. Fui algumas vezes, tratada aqui com uma antipatia, que nunca havia experimentado nos meus anos de Estados Unidos. Ouvi qualificações estereotipadas, que não cabem à minha família e ao meu estilo de vida. Muitas vezes, quando abro a boca e evidencio meu sotaque brasileiro, já me sinto estigmatizada como alguém que ama festas e barulhos (detesto), alguém que veio fugida da violência e do crime (não é meu caso) , alguém que tem empregados e serviçais, alguém que adora esbanjar…
São pequenas bobagens, que dependendo do dia, chateiam. Mas que também me fazem refletir sobre inúmeras coisas e a principal é: o quanto ainda estamos longe de vencermos os estereótipos. Nossa tendência é sempre julgar o todo pela ínfima parte que conhecemos e convenhamos, sabemos mesmo muito pouco a respeito de outras culturas e outros hábitos.
Apesar de estarmos já quase na segunda década do século XXI, continuamos na caverna de Platão, medindo o mundo e as pessoas através da nossa precária régua pessoal, sem nos permitirmos observar o diferente.
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Não posso qualificar os meus relacionamentos com portugueses, baseada nessa brevíssima experiência que tive. Encontrei também pessoas maravilhosas, dispostas a acolher, ajudar, agregar. E a regra só confirma o que já havia aprendido nos Estados Unidos. Não são americanos, brasileiros, portugueses, ingleses ou japoneses. São seres humanos, com sua infinita escala de valores, costumes, hábitos e peculiaridades.
Cada vez mais tenho certeza: detesto generalizações. Somos todos feitos do mesmo “barro”, dividindo ao mesmo tempo, esse lugar imenso chamado planeta Terra. É preciso que aceitemos isso para vivermos em harmonia.
Assim, não consigo ainda dizer: gosto ou não gosto de viver aqui. Sinto que há muito a descobrir, muitas barreiras a superar, e principalmente, sei que precisarei mergulhar fundo nessa nova realidade de peito e coração abertos, e isso depende de mim e não do lugar.
E você? Gosta de morar em Portugal? Compartilhe comigo sua experiência.
1 Comment
Se fosse para morar na Europa definitivamente Portugal seria minha primeira opção.