Em 2004, quando a China entrou na minha vida, eu realmente pouco sabia sobre esse país. Também não era simples encontrar literatura sobre a China. Não que não existisse, pois depois percebi que a maioria dos livros que li datavam de muito antes disso, mas não havia interesse coletivo, como vemos agora.
Existem centenas de títulos disponíveis em português contando um pouco da história, desvendando alguns mitos, analisando o crescimento econômico e urbano. E o que não falta na China é assunto para se escrever sem parar.
Para mim a leitura foi uma fonte imensa de conhecimento e entendimento, que de uma forma prática facilitou minha adaptação nesse país de hábitos e costumes tão diferentes dos nossos. Foi através dos livros que comecei a entender a China.
Dentre os que li, os escritos por mulheres chinesas, que contam sua história, sua trajetória de vida, suas experiências foram os mais marcantes.
Jung Chang
Li dois livros dessa autora, uma chinesa que saiu da China e resolveu escrever a história do seu país, baseada nas suas próprias vivências. Ela chegou a fazer parte do exército vermelho durante a revolução cultural; sua família apoiava a revolução, mas em determinado momento seus pais foram contra a política de Mao e toda a vida da família mudou. Quando as universidades foram reabertas, ela começou a estudar inglês e recebeu uma bolsa de estudos em Londres, onde vive até hoje.
O primeiro livro que li foi a biografia de Mao Tsé Tung, que se chama ‘Mao – a História desconhecida’. Esse livro ela escreveu junto com o marido, o historiador Jon Halliday. Apesar de ser imenso, quase 900 páginas, a autora conta toda a vida de Mao, sua trajetória, como aconteceu a revolução cultural e os caminhos tortuosos dos anos em que ele esteve no poder. Há algumas críticas ao livro que citam a parcialidade da autora, já que ela saiu da China por conta desse período da história, mas para mim, ajudou a me situar num cenário que era extremamente nebuloso.
O segundo livro de Jung Chang que li foi “Cisnes Selvagens – Três filhas da China”. Trata-se de uma biografia familiar romanceada, onde ela conta a história da avó (que foi concubina do imperador), da mãe e a dela. Foi interessante ler esse livro após a biografia de Mao, porque consegui me situar bem nos fatos históricos que ela cita, principalmente nas partes que contam sobre a vida da mãe e a dela, que estão intrinsicamente ligadas com o período de Mao na China. O que mais me chamou atenção nesse livro foi o relato sobre a realidade da mulher na China: as conquistas dentro dessas 3 gerações, as dificuldades, a relação com a cultura.
Xinran
Xinran comandava um programa de rádio que tinha como objetivo ser um canal aberto para a mulher falar de seus problemas, medos, sonhos. Por conta dos relatos, ela resolveu fazer visitas in loco e entrevistar essas mulheres. Com todo esse material em mãos, decidiu publicar um livro, mas foi proibida pelo governo chinês. Assim, resolveu sair da China e mudou-se para Londres. Lá publicou não só esse como mais 5 livros, todos sobre a vida das mulheres chinesas, dos quais eu somente li os dois que cito aqui. Na sua ânsia de defender o direito e a dignidade da mulher chinesa ela fundou uma ONG na Inglaterra, onde mora, chamada ‘The Mothers’ Bridge of Love (MBL) – 母爱桥’ (em inglês). Entre muitas ações, a ONG auxilia jovens que foram adotadas por estrangeiros a encontrar seus pais biológicos e entender sua história de vida.
‘As Boas mulheres da China’ foi publicado em 2003, e foi o livro que levou Xinran a abandonar a China. É muito interessante, mas muito triste também. Existem histórias que chocam, outras que nos emocionam. Mais um livro que mostra a situação da mulher na China, num país tão grande e desigual, que vivem situações tão diferentes, que nos faz pensar no quanto de garra, coragem e determinação algumas tiveram que ter para conseguir seu espaço, sua vida, sua dignidade. Por outro lado, nesse país imenso, existem as que ainda não sabem que há um mundo novo além das grutas em que vivem. Uma leitura marcante.
‘Mensagem de uma mãe desconhecida’ é um livro que te faz repensar todos os pré-conceitos que temos em relação a China, a restrição da lei do filho único e a polêmica preferência por meninos. É um livro de relatos de histórias que ela também presenciou através de seu programa de rádio. Percebemos que os pais muitas vezes são tão vítimas quando seus bebês. Que muitos tentam, de todas as formas que podem, burlar o sistema para manter seus filhos vivos e com eles, que não é fácil para uma mãe chinesa praticar o aborto ou abandonar seu filho sem sentir remorso, culpa, dúvidas. No final, os sentimentos são os mesmos que qualquer outra mãe do mundo poderá sentir.
Os demais livros de Xinran são “O que os Chineses não Comem”, “As Filhas Sem Nome” e “Testemunhas da China”. Todos têm como tema central a mulher chinesa.
Tanto os livros de Jung Chang como os de Xinran são proibidos na China.
Você já leu algum desses livros? O que achou? Conte para nós.
Até a próxima!
2 Comments
Oi Christine
Adorei seu texto ! Eu Li “Cisnes Selvagens” e também os” Boas Mulheres da China” e não pude deixar de me chocar com a realidade ou várias realidades da condição feminina na China. ‘Tem também um livro chamado Cinderela Chinesa que é a autobiografia da autora, onde ela conta sua histór ia juntamente com acontecimentos históricos no país. Vale a ena ler também. Aliás, adora ler sobre a vida de mulheres em outros países. Abs
Oi Cintia,
Já vou procurar esse que você citou.
E estou lendo um sobre a vida da Cixi, a última imperatriz, escrito pela mesma autora de cisnes selvagens. Estou adorando, e mudou a imagem que eu tinha dela, baseada em romances e leituras esporádicas.
Beijão.