Está próximo de Berlim em fevereiro? Queria fugir um pouco do inverno rigoroso? Gosta de cinema? Então, tenho uma sugestão. Fevereiro é um mês especial para os cinéfilos mundo afora, pois acontece o primeiro festival importante do ano, o de Berlim (Internationale FilmfestspieleBerlin), mais conhecido como Berlinale.
Uma longa tradição
O festival começou no lado ocidental de Berlim em 1951, período em que a Alemanha tentava se recuperar dos estragos da Segunda Guerra Mundial e era um país dividido. Naquele ano o evento foi em junho. No entanto, desde 1978 ele acontece em fevereiro. O primeiro filme exibido foi Rebecca, dirigido por Alfred Hitchcock.
Em 2019, entre os dias 7 e 17 acontece a edição número 69 do mítico festival, que tem como filme de abertura Kindness of Strangers, dirigido pela diretora dinamarquesa Lone Scherfig. Clique aqui para ver a programação. Além de assistir os filmes, é possível debater as obras com os diretores e produtores responsáveis após as exibições.
O maior festival de cinema
O Festival de Berlim, juntamente com os de Veneza e de Cannes dita o que acontece em outros festivais menores durante o ano, mas o evento alemão é o maior em termos de ingressos vendidos (uma media de 300 mil a cada ano). Mais de 400 filmes englobando diversos gêneros são exibidos, e cerca de 20 concorrem a premiação. O melhor recebe o Urso de Ouro.
O Urso de Ouro engloba três categorias: Melhor filme, Melhor Curta Metragem e Conjunto da Obra (Urso de ouro honorário). Já o Urso de Prata é a segunda melhor colocação e se aplica às seguintes categorias: Grande Prêmio do Júri; Prêmio Alfred Bauer (em homenagem ao fundador do festival, é oferecido para filmes que abram novas perspectivas na arte cinematográfica); Melhor Diretor; Melhor Ator; Melhor Atriz; Melhor Curta Metragem, Realização Artística Excepcional, Melhor Trilha Sonora e Melhor Roteiro.
Para quem não tem Festival de Berlim
Mas se você não está na capital alemã e nem passando frio, só quer mesmo ter um gostinho de cinema germânico, aqui vão algumas dicas minhas de por onde começar. O país tem uma tradição cinematográfica que remete ao século XIX e que contribuiu bastante para o desenvolvimento da sétima arte e também da televisão.
A ligação com o cinema começou em 1895, quando Max Skladanowsky e seu irmão Emil exibiram sua invenção pioneira, o filme projetor, no Wintergarten Music Hall, em Berlim. Foi uma sequência de oito curtas, totalizando 15 minutos e tornando este evento a primeira exibição paga da Europa.
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Expressionismo alemão
O período conhecido como República de Weimar (entre 1918 e 1933) representou o surgimento do Expressionismo Alemão, com filmes carregados de símbolos e focados em terror (o que não surpreende, já que foram feitos logo após a Primeira Guerra). Dentre eles, esta o famosíssimo “Gabinete do Dr. Caligari” (1920), dirigido por Robert Wiene.
Este filme conta a história de um especialista em hipnose que se aproveita de um sonâmbulo para executar uma série de crimes. A estética deste tipo de obra é escura (com alternância entre luz e sombra) e as atuações dos atores são exageradas.
Outros exemplos notáveis do Expressionismo são “Nosferatu” (1922), dirigido por Friedrich Wilhelm Murnau e “Metropolis” (1927) de Fritz Lang. O primeiro retrata um vampiro interessado em uma nova residência e na esposa de um agente imobiliário.
O segundo é uma utopia de uma cidade futurística, dividida entre a classe trabalhadora e os poderosos. O filho do homem mais conceituado da cidade se apaixona por uma profeta pertencente à classe operária e ela prevê a chegada de um salvador para mediar as diferenças.
O cinema mudo se despede
Os anos 20 significaram a introdução do cinema falado e um dos mais lembrados filmes do período é “O Anjo Azul” (1930) de Josef Von Sternberg e que tornou famosa a atriz Marlene Dietrich. Trata-se da história de um professor idoso que tem a vida toda organizada, mas de repente perde o controle ao se apaixonar por uma cantora.
Filmes como propaganda ideológica
Infelizmente, durante o período em que Hitler governou, a indústria cinematográfica alemã foi usada como uma ferramenta de propaganda pelo estado totalitário.
Porém, para especialistas em cinema, os filmes de Leni Riefenstahl foram um marco na história da sétima arte, em função da técnica de filmagem movimentando a câmera e dos avanços estéticos. No entanto, eu acho um pouco difícil admirar a técnica ignorando o conteúdo nazista.
A recuperação
No pós-guerra, a parte ocidental da Alemanha se voltou para a temática do país devastado e do dia a dia da reconstrução. Um filme marcante foi o do diretor Roberto Rosselini, “Alemanha, ano zero” (1948), no qual um menino enfrenta as duras condições do período, tentando sobreviver a todo custo em Berlim.
O período entre 1960 e 1980 ficou conhecido como o Cinema Novo Alemão, e trouxe um forte componente de critica social. Um dos filmes mais representativos é “O Casamento de Maria Braun” (1979), dirigido por Rainer Werner Fassbinder.
Maria casa-se próximo ao fim da Segunda Guerra e seu marido acaba sendo enviado para o combate. Ela então se envolve amorosamente com um soldado norte-americano. Quando o marido volta, eles começam uma disputa.
A década de 80 trouxe atrações populares em audiência e um dos maiores expoentes foi “Das Boot” (1981) que até hoje detém o recorde de produção alemã com maior número de indicações ao Oscar (foram seis).
A obra, dirigida por Wolfgang Petersen, se desenvolve em 1942, em um submarino onde os combatentes estão engajados em derrotar os britânicos. No entanto, eles começam a sofrer pesadas baixas. O filme questiona como os oficiais mantêm o profissionalismo e continuam seguindo a ideologia do governo.
A modernidade chegou
Os anos 90 trouxeram novos ares para o cinema alemão com grandes lançamentos como “Corra Lola Corra” (1999) de Tom Tykwer, e os 2000 deram continuidade a essa tendência com “Adeus, Lenin!” (2003) de Wolfgang Becker, e “A Vida dos Outros” (2006) de Florian Henckel von Donnersmarck.
O primeiro narra as tentativas de Lola para conseguir levantar dinheiro para o namorado (Manni), que esqueceu uma alta quantia no metrô. Como esse valor pertencia a um criminoso, ela tem 20 minutos para conseguir isso antes que Manni roube uma loja.
O segundo traz a tentativa de um jovem de proteger a sua mãe debilitada de um choque possivelmente fatal. Ela não pode descobrir que o muro de Berlim caiu e que a Alemanha Oriental já não existe, pois era grande admiradora do regime socialista.
“A Vida dos Outros” se passa em 1984, em Berlim Oriental. Um agente da Policia Secreta (Stasi) está espionando um escritor e sua amante, mas começa a se envolver emocionalmente na vida deles e terá um papel decisivo em seus destinos.
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Lista infinita
Enfim, sugiro estes dez filmes que citei para começar a gostar de cinema alemão, mas a lista pode muito mais longa e, claro, bastante pessoal também. Acho que é uma boa oportunidade para entender melhor a história do país, a cultura germânica e me parece um pouco estranho dizer para se divertir, já que a temática de algumas das obras não e exatamente feliz. Então talvez seja melhor dizer para passar o tempo de forma interessante.