Como é morar em um país com terremotos frequentes?
Muitas pessoas me perguntam sobre as minhas experiências com terremotos no Japão, querem saber se estou bem mesmo quando a notícia é de abalo sísmico do outro lado do país. Perguntas sobre o que eu faço quando a casa começa a tremer e com que frequência isso acontece também são comuns e para quem vive no Brasil ou em algum outro país sem terremotos, é difícil ter uma boa noção da realidade.
Para começar, vale explicar por que o Japão é castigado com tantos tremores e por que a maioria deles, mesmo quando são relativamente fortes, não provoca dano algum. Na maioria dos casos, não há feridos nem danos nas estruturas, a menos que o tremor ocorra em uma região remota, vilarejos no interior do país que ainda possuem muitas construções antigas e pouco resistentes.
O arquipélago japonês, para a infelicidade do país, é dividido entre três placas tectônicas: placa das Filipinas, placa do Pacífico e Eurasiana. Entre essas placas, há pelo menos duas mil falhas geológicas, que podem possuir grandes extensões, passando por várias províncias. Quando uma dessas falhas se move, um terremoto é registrado.
Mas há muitos detalhes envolvendo as movimentações das falhas, que influenciam na intensidade do terremoto. No geral, os tremores com epicentro mais raso são mais fortes e causam mais danos. Quando um terremoto acontece, o Japão informa a magnitude pela Escala Richter, que é a força do tremor em seu epicentro e também informa a “escala japonesa”, de acordo com a Agência de Meteorologia do Japão (JMA), que vai de 1 a 7 e indica a intensidade do tremor na superfície terrestre.
De modo geral, um terremoto costuma chamar atenção da mídia e da sociedade quando a escala japonesa indica que a intensidade foi de -5 graus ou mais. Após o número 5, a escala varia entre -5, +5, -6, +6 e 7. Os tremores mais catastróficos, como o sismo de Tohoku seguido de tsunami em março de 2011, costumam atingir grau 7.
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PREPARO
O que garante que um terremoto de intensidade média não cause danos no Japão não é apenas as construções fortalecidas, mas também o preparo e conhecimento dos cidadãos e a ampla rede de comunicações. O Japão possui alto falantes espalhados pelos bairros e ninguém fica sem informação quando ocorre um terremoto forte.
As operadoras de internet inclusive oferecem uma rede Wi-Fi gratuita para situações de calamidade e os japoneses (e estrangeiros residentes) podem se comunicar com parentes e amigos. Quando um tremor forte ocorre e enfraquece as construções, os moradores se deslocam para um abrigo próximo, que geralmente é o ginásio das escolas e ficam por lá até que reduza o risco dos tremores secundários (que podem durar uma semana).
Comunicação e refúgio é apenas parte do processo japonês de prevenção. As famílias também costumam atuar dentro de casa. Durante um terremoto forte, é recomendado se proteger embaixo de uma mesa, para que nada caia em cima da cabeça. Os mais atentos também preparam suas casas, colocando os objetos mais pesados nas partes de baixo das prateleiras e guardando água ou comida para situações de emergência.
DIA A DIA
Quem pensa que o Japão regista terremotos todos os dias, acertou. Mas quem pensa que a população vive em tensão constante por isso, está muito enganado. A verdade é que é comum o país registrar cerca de 10 tremores por dia, que são monitorados pela JMA e podem ser acompanhados por qualquer um, através de aplicativos como o Yurekuru, que é mais voltado aos estrangeiros.
Acontece que, como a maioria dos tremores são de 1 ou 2 graus de intensidade, ninguém percebe que eles aconteceram e, se percebem, não chegam a se assustar, pois são terremotos muito fracos e que duram poucos segundos. Eu já passei por uns 3 ou 4 nesses quatro anos de Japão e, em todas as vezes, o local que eu estava parou de tremer na hora em que tomei consciência de que estava tremendo.
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CURIOSIDADES
- Não é possível prever um terremoto com precisão, mas os pesquisadores japoneses possuem suas artimanhas para fazer anúncios catastróficos. Os centros de pesquisa costumam fazer uma linha do tempo com a ocorrência de tremores fortes e ficam de olho quando um terremoto intenso em determinada falha geológica costuma acontecer uma vez a cada um número X de anos.
- Atualmente, a lenda mais assustadora para os japoneses e estrangeiros é do Terremoto de Tokai. Tokai é a região central do país, onde passa a fossa submarina Nankai Trough, de 900 km de extensão e que chega até a região de Kyushu, no sul do arquipélago. Um tremor forte seguido de tsunami costuma ocorrer uma vez a cada 100 ou 150 anos e o especialistas acreditam que o próximo deve vir a qualquer momento nas próximas décadas.
- O Japão calcula as vítimas de um terremoto até muito tempo depois que o tremor aconteceu. Neste levantamento, entra aqueles que morreram durante o terremoto, aqueles que morreram de doenças (como trombose, por exemplo), enquanto estavam se refugiando dentro de carros ou aqueles que cometeram suicídio por terem perdido familiares e a casa por causa do terremoto.
- Alguns pesquisadores japoneses (muitos dos quais eu já entrevistei como jornalista) derrubam o mito de que as províncias com mais tremores são mais perigosas. Para eles, a lógica é contrária: as províncias com tremores frequentes estão sempre liberando energia, enquanto que as que não registram terremotos estão acumulando energia e quando soltam, soltam tudo de uma vez só, provocando um terremoto intenso. Será?
1 Comment
Vou fazer um pedido a vocês, que vivem no Exterior: será possível escrever sobre coisas básicas que funcionam, sendo exemplo a INTERNET e os transportes públicos?
agradeço de coração…só morei no exterior por um curto período e fico impressionado como no brasil nada básico funciona mas não vejo indignação nem comentários, até mesmo por parte de jornalistas…Por que será???
medo? censura? perseguição? ah por favor…aguardo respostas. obrigado.