A maior lição de ser imigrante é a empatia.
Saltar de um paraquedas, sobreviver a um câncer, escalar uma montanha, perder um ente querido, recomeçar uma nova carreira profissional, divorciar-se, envelhecer, etc. São várias as maneiras que a vida nos proporciona para que a gente cresça. Algumas fáceis e outras nem tanto. No alto dos meus 42 anos, que para mim já são um bocado, o que mais me fez crescer foi a experiência de ser imigrante.
Nada pode ser melhor do que isso para nos ensinar a sermos humildes, e principalmente nos colocarmos nos lugares de minorias. Ainda mais para alguém, que sempre usufruiu de alguns privilégios. Viver e morar dentro do nosso país, cercado de familiares e amigos, já é um imenso privilégio. Aquela velha história, só valorizamos o óbvio, quando o perdemos.
Mas de verdade, para mim não foi uma perda. Foi um ganho gigantesco. Morar nos EUA me fez entrar imediatamente naquele grupo dos que vivem pelas beiradas. Vou explicar: independente de ‘status’ migratório, cor de pele, ou conta bancária, não sou americana, e ainda que meus filhos nascessem aqui e tivessem a cidadania, eles seriam eternamente considerados “brazilian-americans” e nunca americanos, simples assim.
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Ser latino por aqui implica em muitas coisas. Até nossa raça é modificada. No Brasil multi-colorido sempre fui branca e loira. Aqui meu cabelo natural já seria considerado moreno, e a minha ascendência racial, por mais longe de um bronzeado que eu esteja, jamais será branca caucasiana, e sim latina.
Isso é ofensivo? Não, em hipótese alguma! Ao contrário… De alguma maneira, ver o mundo sob a perspectiva de uma minoria social, me fez crescer como ser humano. Penso que jamais me adaptaria de novo à velha vida brasileira que eu tinha. Meu olhar mudou e aquilo que antes tinha algum valor, hoje não faz mais sentido.
Essa é a grande lição que imigrantes do mundo inteiro aprendem. Convivo, virtualmente, com mulheres brasileiras que imigraram para os quatro cantinhos do globo, e arrisco dizer que, todas nós temos um ponto em comum: a experiência que nos transformou.
Enquanto escrevo isso, assisto de longe o Brasil se desfazendo. Uma instabilidade política assustadora, uma violência galopante e uma tristeza generalizada, que nunca foi comum aos meus conterrâneos. Gostaria que cada um que ficou por lá pudesse compreender, que nós que voamos, sentimos na pele essa dor. Talvez até de forma amplificada.
Os noticiários tendem sempre a ser espetaculares, amplificando os problemas e dramatizando situações. Estamos longe e nunca há ninguém pertinho, como um vizinho, um atendente de café ou caixa de supermercado, com quem possamos dividir nossas agonias.
O contrário também acontece como vimos recentemente. É quando assistimos pelos filtros do Instagram e do Facebook, amigos e familiares abraçados em volta de uma garrafa de vinho, um copo de cerveja, um balde de pipocas, comemorando ou lamentando a seleção canarinho na Copa do Mundo.
Estamos às margens, sempre. Tanto lá, quanto aqui e isso dói, mas também faz crescer de uma forma que seria impossível se estivéssemos acomodados em nossas zonas de conforto. Já explorei muitas vezes esse tema em meu blog pessoal, veja aqui.
Eu recomendo – e muito, a experiência! Assisto agora a uma horda de brasileiros deixando o país. Muitos em condições bastante privilegiadas. Apesar de já morarem e viverem nos topos das grandes cidades, estão em busca de algo maior. Segurança, limpeza, honestidade, conforto, coisas que o Brasil carece tanto.
Tenho esperança que essas pessoas se abram para o novo e passem também a encarar o mundo e as relações sociais, por outros ângulos, que não aqueles à que estavam acostumados. Que passem a olhar seres humanos como iguais e percebam que nessa vida sobre a Terra, não passamos disso: animais racionais à procura de bem-estar, muitas vezes longe dos ninhos. Que não levem para as novas terras, os seus vícios de confortos e privilégios, mas sim, a humildade de aprender a descobrir novas perspectivas.
Sírios, haitianos, palestinos, hispânicos, asiáticos, judeus, muçulmanos, brasileiros, etc. etc. etc. Somos iguais. Estamos todos nesse grande barco da vida, que mesmo em águas turbulentas, só procura um lugar de repouso.
Despir-se de preconceitos e ver o mundo além dos nossos limites, são os únicos caminhos que poderão nos guiar a tempos melhores. Eu arrisco a dizer que, o mais importante conceito para esses tempos atuais, é a empatia. Sem isso não somos nada. Mais do que nunca é preciso colocar-se no lugar do outro e ser capaz de compreender suas premissas, ainda que sejam radicalmente opostas às nossas.
Para fechar esse texto, com lágrimas nos olhos e dor no coração, recomendo a série televisiva Parts Unknown de Anthony Bourdain, que deixou esse mundão de forma trágica.
O seu legado foi de abrir-se para o novo, escutar o desconhecido e experimentar novos sabores e costumes, sem expectativas pré-concebidas. Isso é o que mais nos engrandecerá como seres humanos. Foi, sem dúvidas, um dos maiores exemplos de empatia da atualidade.
Sejamos capazes disso.
Até a próxima!
“Significado de Empatia
Substantivo feminino: Ação de se colocar no lugar de outra pessoa, buscando agir ou pensar da forma como ela pensaria ou agiria nas mesmas circunstâncias.Aptidão para se identificar com o outro, sentindo o que ele sente, desejando o que ele deseja, aprendendo da maneira como ele aprende etc.” – Fonte www.dicio.com.br