Enfrentando o COVID-19 na Dinamarca
O início
No início de 2020 as empresas dinamarquesas que produzem na China ou importam desse país tomaram conhecimento da epidemia de COVID-19 às vésperas do Ano Novo Chinês. Atrasos na produção e na entrega de produtos por conta do fechamento de fábricas, consequências da até então epidemia, afetaram negócios em diversas partes do mundo.
Ainda que um perigo iminente, o vírus até então parecia muito distante da realidade na Europa, e com toda a compaixão, desejamos o melhor para a China. Nesse momento mal sabíamos que justamente a Europa viria a se tornar o principal epicentro de contágio mundial.
O primeiro caso positivo de COVID-19 na Dinamarca foi diagnosticado logo após as férias de inverno, onde o costume dinamarquês é viajar para esquiar na Noruega, Áustria ou Itália. As pessoas contraíram o vírus nas férias, voltaram para casa assintomáticas e prosseguiram suas vidas normalmente. Quando o primeiro caso foi confirmado em 27 de fevereiro, a rede de contágio estava formada.
No dia 11 de março a OMS reconheceu a COVID-19 como sendo uma pandemia. Nesse mesmo dia, com 514 casos confirmados de COVID-19 no país e nenhuma morte ainda, a primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen convocou uma coletiva e anunciou o fechamento de creches, escolas, universidades e repartições públicas a partir do dia seguinte, 12 de março, recomendando aos trabalhadores de outros setores que se possível permanecessem em casa pelos próximos 14 dias. No dia 14 de março decretou-se o fechamento total das fronteiras até 10 de maio, e empresas do setor privado começaram a mandar seus colaboradores trabalharem de casa.
A Dinamarca foi um dos primeiros países europeus a optar pelo lockdown.
Um gabinete de gestão de crise foi imediatamente montado para reunir esforços contra a pandemia. Pela primeira vez na história dinamarquesa os partidos políticos deixaram um pouco as suas diferenças de lado para discutir soluções emergenciais em benefício do país como um todo.
A situação foi considerada tão delicada que a própria rainha Margrethe II, que normalmente se dirige à nação apenas no seu discurso anual de Ano Novo, organizou um pronunciamento oficial em rede nacional para falar da pandemia de COVID-19 na Dinamarca e reforçar as recomendações do Ministério da Saúde. Pronunciamentos do tipo só haviam sido feitos em situações extremas como a Segunda Guerra Mundial.
Obviamente que o lockdown impactou duramente a economia local. Demissões em massa em setores como o de turismo e fast fashion foram praticamente inevitáveis. Para ajudar as empresas do setor privado o governo lançou pacotes de ajuda econômica, evitando o desemprego em muitos setores.
Poucos dias depois do fechamento do país o número de infectados aumentou rapidamente, e a Dinamarca atingiu o pico de contaminações em meados de abril. As primeiras mortes ocorreram em seguida ao anúncio do isolamento.
Embora a recomendação fosse ficar em casa, nunca houve uma proibição explícita para não sair às ruas: a recomendação era ter o máximo de cautela, sair somente para o necessário, lavar as mãos com frequência ou desinfetá-las com álcool gel e manter uma distância das outras pessoas de pelo menos 2 metros. Aglomerações com mais de 10 pessoas e eventos sociais como festas e concertos foram terminantemente proibidos.
A polícia lançou um site e uma hotline para atendimento e informações a respeito de COVID-19 na Dinamarca, e grupos não-governamentais traduziram as informações oficiais para outros idiomas, inclusive português, facilitando o acesso às informações oficiais pelas minorias étnicas.
O que aconteceu depois do lockdown
Rapidamente as empresas tomaram medidas de segurança, como diminuir equipes e restringir o acesso ao escritório a grupos pequenos e determinados, para evitar que as pessoas tivessem contato com pessoas diferentes ao longo do dia.
Muitos passaram a trabalhar de casa, enquanto outros foram dispensados temporariamente, porém recebendo salário integral, conforme previsto nos pacotes de ajuda econômica. Eu fui uma dessas pessoas “mandadas para casa” e terei que aguardar até o dia 8 de junho para saber quais os próximos passos a tomar. Há uma probabilidade de que esses casos evoluam para demissões a partir de junho. Entretanto, o futuro ainda é uma incógnita.
Em meio às incertezas da pandemia, a rainha cancelou as comemorações pela passagem dos seus 80 anos, e nem mesmo os 75 anos de liberação da ocupação nazista em 2020 puderam ser comemorados como planejado.
Claro que também teve gente desrespeitando as recomendações por aqui. No dia do pronunciamento da primeira-ministra hordas de pessoas se lançaram aos supermercados em pânico. Passada essa fase, ainda nos primeiros dias do lockdown um sol convidativo apareceu e muita gente correu para as ruas e praias, causando aglomerações. Na véspera da Páscoa os supermercados estavam lotados. Não foi fácil convencer a todos da necessidade de respeitar o isolamento social, e a polícia foi orientada a aplicar multas.
O que esperar do futuro?
Em 07 de maio a Dinamarca apresenta 10.083 pessoas infectadas, sendo que 7.493 delas já se recuperaram; infelizmente, 506 pessoas perderam a vida para a doença no país. No total, 284.480 pessoas foram testadas para o COVID-19 na Dinamarca.
A população mais afetada foram indivíduos entre 50 e 59 anos, predominantemente homens. A taxa de mortalidade mais alta, porém, se deu entre pessoas de 70 a 79 anos com doenças preexistentes.
Hoje, passado quase um mês do lockdown, a reabertura do país começou a passos curtos e cautelosos. As escolas primárias e alguns setores do comércio, como cabeleireiros e lojas, voltaram a funcionar, sob protocolo de segurança pré-estabelecido pelo Ministério da Saúde dinamarquês.
Com os bons resultados do lockdown a pauta agora é a abertura gradual de outros setores da economia e da sociedade, com frequentes estudos e discussões ocorrendo nesse sentido. Estes estudos apontam para uma estagnação do número de infectados e queda nas mortes, com aumento de doentes recuperados, o que soa promissor.
A esperança é a de poder voltar a um ritmo dentro de um padrão de normalidade nos próximos meses.
Um estudo detalhado sobre a evolução do vírus e estratégias de combate a ele, preparado pelo Instituto de Infectologia da Dinamarca, pode ser lido em dinamarquês aqui.
2 Comments
Ótimo balanço, Cristiane! Bom trabalho!
Obrigada, Selma! Abraços e espero que possamos nos rever em breve 🙂