Entrevista com a Chef Alessandra Montagne da França.
Foi num sábado ensolarado no 13éme arrondissement de Paris que Alessandra Montagne, mineira de Poté no Vale do Mucuri, marcou nossa entrevista. Ela vive na França desde 2000. Têm dois restaurantes no currículo: o “Tempero” que completa 2 anos e o “Tempero Le Comptoir” um bebê de 2 meses sob os cuidados de seu marido Olivier. Reconhecidos pela renomada revista francesa “Gault et Millau”, ela nos contou como esta dedicada professora primária trouxe sua sensibilidade ao paladar francês.
Alessandra, por que a França? E Por que Paris?
Então, a minha mãe morava na França, eu vim só para passar 6 meses, não para morar, mas daí eu conheci meu marido e não teve como voltar…(risos). Paris porque aqui tem esse charme tão grande, é um espetáculo tão grande que não tem como não deixar a cidade.
Como se deu essa mudança de ser professora primária e virar uma gastrônoma?
O que aconteceu é que eu queria mesmo era ser professora, passar algo para o outro, participar de alguma maneira na educação das pessoas. Porém meu primeiro ano de professora foi super complicado. Eu amava ser professora, estar com as crianças ensinar a ler e escrever, mas eu me apeguei e tinham crianças que não tinham uma situação privilegiada como todas devem ter, chegavam marcadas e a gente não podia fazer nada.
Foi quando eu vim para Paris para espairecer, aprender francês, ver outra coisa. Fiz muitos amigos, conheci muita gente interessante que são amigos até hoje. E também foi nesse momento que conheci meu marido, a gente amava cozinhar, passava nosso tempo fazendo comida, recebendo os amigos…
Então foi nesse momento que você descobriu que ia utilizar a gastronomia como maneira de se expressar?
Demorou. Foi uma coisa que foi se instalando aos pouquinhos. A gente convidava pessoas para almoçar , para jantar. Depois começamos a fazer festas, e a cada vez que tinha uma aniversário era a gente que fazia a comida. E foi vindo assim natural essa necessidade de trabalhar com as mãos, de fazer algo com as minhas mãos.
Dividir algo com as pessoas. Dar comida para alguém é algo tão importante.
Às vezes estou na minha cozinha, que é aberta, aí quando eu vejo a pessoa comendo, eu consigo ler nos lábios “Que delícia”. É enorme isso!
Leia também: custo de vida na França
Como vocês decidiram a abrir um restaurante?
Complicado, demorou!
Me inscrevi na Fac de Tolbiac, então trabalhava de dia e estudava a noite. E a gente começou a pensar com mais seriedade na comida, pois todo mundo perguntava o tempo todo porque a gente não abria um restaurante. Eu falei “Olivier vamos tentar, então? ”. Ele topou. Mas falei que um dos dois tem que ir para a escola, porque fala sério, tem que saber o que que é a cozinha de verdade, de maneira profissional. Se é para estudar é comigo mesmo. Fui e me inscrevi.
Bom, depois de inscrita eu fazia 2 dias na escola, 2 dias no restaurante fazendo estágio.
Terminei o curso, e tive que voltar para o antigo trabalho, mas daí comecei a sentir falta da cozinha. Então me demiti e me lancei! Olivier e eu montamos um site para ser cozinheiro chef na casa das pessoas e daí foi! E vimos que era isso que queríamos.
Como a sociedade francesa te acolheu?
Nossa, super bem. Como estrangeira, não tive problemas, mas sofri um pouco por ser mulher. Mas que também não durou muito, porque quando você mostra que é motivada, tudo vai bem.
Onde foram os seus estágios?
Eu fiz um no “Ze Kitchen Galerie” que tem uma estrela no guia Michelin, com o chef William Le Deuil, depois 6 meses no “Yam T’Cha” também com uma estrela e mais um ano na “Grand épicerie de Paris” fazendo a pâtisserie (doces). E em seguida abrimos nosso restaurante.
E o que você gostou mais?
Nossa eu adorei a pâtisserie. É muito bom. Pâtisserie é uma coisa incrível, é muito escolar. Assim, na cozinha (salgada) a gente pode arrumar um prato, por exemplo, é só colocar mais sal, ou água, ou pimenta, batata…já na pâtisserie se colocou 50 gramas a mais de açúcar, ou de manteiga pode jogar no lixo. Tudo é muito perfeitinho e o resultado também é muito lindo, que parece uma jóia. E ver que você quem fez aquilo, dá vontade de chorar!
A minha maneira de cozinhar salgado melhorou depois da pâtisserie, porque usei as técnicas de um no outro.
Quem dita as regras na sua cozinha Brasil ou França?
Nossa é bem misturado, porque a cada vez que vou criar um prato tento pensar no que eu gostava de comer no Brasil e acrescentar elementos da nossa cozinha no prato francês, seja no feijão, na farofinha crocante…
Você tem mais francês ou estrangeiros na sua clientela?
Praticamente só francês. Acho que o fato da comida ter esse monte de gosto atrai os franceses.
E se você estivesse no Brasil? O que você acha que seria diferente?
Eu acho que nunca teria sido cozinheira, porque o fato de ter vindo para a França deu vontade de cozinhar, a gente é influenciado pela comida, existem muitos restaurantes e a França foi uma inspiração para mim.
Quais facilidades e dificuldades você encontrou na sua trajetória?
Eu achei que foi legal, que foi super legal. Toda a experiência é valida, e faz crescer, te faz sentir viva. Acordar e ir na padaria com um dicionário e depois quando o tempo passa e você se dá conta que você fez um caminho tão grande. É difícil, é legal, é bonito, é engraçado, é viver né?
Mas o mais difícil foi suportar o primeiro inverno e saudade dos amigos. Mas que tudo isso também passa, a gente se adapta, porque não pode ficar ali no mesmo lugar.
Qual conselho você daria para um brasileiro que quer vir para a França fazer gastronomia?
Venha, venha, venha. Aqui é “O” lugar para fazer gastronomia. Você sente cheiro de comida 24h por dia, e na hora já vem as idéias na cabeça.
E qual curso você recomenda?
A l’école français de gastronomie Ferrandi , faz um curso em sessão internacional. Cursos para estrangeiros totalmente em inglês para os que não sabem falar francês. Dura 1 ano, 6 meses na escola e 6 meses de estágio.
Deixe uma mensagem para o BPM
Mulherada, parabéns por terem tido a coragem de sair do Brasil, de ver outras coisas, porque tem muita gente que não tem, que tem medo. Parabéns, coragem e continuem!
TEMPERO fica na 5 rue Clisson 75013 Paris (tel: 09 54 17 48 88)
TEMPERO LE COMPTOIR na 124 Boulevard Vincent Auriol 75013.
Ambos atendem nos mesmo horários: de segunda à sexta das 12hs às 14:30hs e nas quintas e sextas também funcionam à noite das 19:30 às 22hs.
10 Comments
Eu comi com os olhos os pratos que ilustram a entrevista. Parabens a entrevistadora Ana Lozon e a chef Alessandra Montagne, vcs nos premiaram com informacoes “deliciosamente” inspiradoras. Fluiu tao bem que parece facil, mas como ela mesmo afirma, sabemos que e’ “difícil, é legal, é bonito, é engraçado, é viver né”.
Oi Juraci, fico feliz que gostou!
A Alessandra além de ótima cozinheira é uma pessoa incrível e encantandora. Eu fiquei muito feliz quando surgiu essa pauta, pois coincidentemente eu já havia comido no restaurante dela, e foi uma delicia.
Então fica a dica, quando vier para Paris não pode deixar de comer no TEMPERO!
Tchau!
super interview! la classe!
Oi Ana, adorei sua entrevista. E quanta coisa gostosa… uhmmm… estou com água na boca:)
Não creio que estive em Paris recentemente e não visitei o restaurante dela.
Beijos
Ah Cleo, vai ter que voltar, pode comprar as passagens de volta!!
bisous.
Muito motivador ler a historia de quem se arriscou para manter um relacionamento e conseguiu combinar a isso o sucesso profissional. Adorei a entrevista, Ana.
Obrigada Gi!
A Alessandra é uma pessoa inspiradora e batalhadora. Com esse sorrisão e um jeito cativador de ser ninguém se desmotiva perto dela!
Parabens Ana pela esta entrevista ! A Alessandra e o marido são pessoas geniais !! Com uma generosidade incrivel !! E um talento sem nome. Adoro a cozinha deles ambos.
Nossa Aninha do céu Chapeau meninas, deliciosa esta entrevista e eu vou estar em Paris agora em Outubro e ja coloquei no meu caderninho, vou TER que ir ao TEMPERO!!!! Alessandra voce é uma linda, e os pratos so refletem este sorriso e este carinho todo que vem da sua aura! Meninas show de bola!!! Amei e principalmente BRAVO, qualificaçao é tudo!!!! Admiro muito quando o povo nao tenta fazer puxadinho, mas pega o boi pelo chifre e vai a luta e se qualifica e faz bonito!!!! UHUUU me aguardem no Tempero em breve! heheheh
Lindo isso… principalmente a questão dos alimentos frescos e orgânicos, qualidade acima de tudo e muita saúde. Parabéns!