Cidade do México, 25 de novembro de 2016. Às 23:54, recebi a notícia: morreu Fidel. Vi a mensagem do presidente cubano, Raul Castro Ruz, que dizia:”querido povo de Cuba, com uma dor profunda, compareço para informar ao nosso povo, aos amigos da nossa América e do mundo que hoje, 25 de novembro de 2016, às 10:29 da noite faleceu o comandante e chefe da Revolução Cubana, Fidel Castro Ruz”.
Fiquei sem palavras ao ver Raul anunciar a morte do seu irmão e me coloquei no seu lugar. Era grande a dor entre os admiradores de Fidel. Para mim, foi como perder uma figura paterna, foi ver um herói que não morreu de overdose, contradizendo Cazuza, porém talvez, compartindo a frase “meus inimigos estão no poder”, fazendo referência ao atual governo brasileiro.
Minha admiração por Cuba começou na 6ª série, quando estudei a Revolução Cubana, uma história apaixonante. Chorei ao descobrir que Che Guevara foi assassinado e desejei conhecer a figura da história viva: Fidel Castro. Na minha coluna do mês de dezembro (concluída no dia 15 de novembro, antes da morte de Fidel) eu contei que morei em Cuba entre 2001 e 2008.
Chegando a Havana, fiquei surpresa quando vi a realidade cubana; percebi que o que aprendi na história, em 1990, não era o que eu via em 2001. Hoje sei que isso aconteceu porque deixei de acompanhar a história no momento que ela continuava a ser escrita em Cuba e no mundo.
Com a queda da União da República Socialista Soviética, um dos principias fornecedores de petróleo a Cuba, o país entrou no “período especial”, que durou de 1991 a 1997 aproximadamente, onde os cubanos passaram por medidas que modificaram seu padrão de vida. Neste mesmo período houve mais restrições em relação ao embargo econômico e de comércio a Cuba pelos EUA.
Para entender por que os cubanos choram a morte de Fidel, vamos ao contexto histórico e político cubano antes da Revolução.
1492: Cristóvão Colombo descobriu Cuba, um lugar geograficamente estratégico e importante ponto de comércio das Índias Ocidentais quando Cuba era colônia espanhola. Os autóctones indígenas foram assassinados pelos espanhóis, que a povoaram junto com os escravos africanos. Tornou-se grande produtora de açúcar, café e tabaco.
1519: É fundada a cidade de Havana, capital de Cuba.
Século 19: Os cubanos tentaram se tornar independentes, mas sem sucesso. Cuba continuou se desenvolvendo de maneira desigual sob a monarquia espanhola.
1895: Intelectuais cubanos como Jose Marti organizaram os rebeldes e tentaram liberar Cuba. Os EUA ofereceram apoio aos rebeldes, que o rejeitaram.
1898: O navio estadunidense Maine, ancorado em Havana, explodiu, e os EUA responsabilizaram a Espanha. Assim entraram no país e ganharam a guerra pela independência cubana. A Espanha assinou o Tratado de Paris. Cuba deixaria de ser colônia espanhola para se converter ao “quintal gringo”.
1901: Para regularizar o novo estado cubano e sua relação com os EUA, o senador estadunidense Orville H. Platt criou a Emenda Platt: para que Cuba continuasse sendo defendida pelos EUA, o governo cubano venderia ou alugaria as terras cubanas necessárias para que os EUA montassem fábricas de carvão ou estações navais em pontos determinados que fossem convenientes ao Presidente dos EUA. O território alugado foi Guantánamo.
1902: Cuba se converte em República, apoiada econômica e politicamente pelos EUA – preço pago até hoje pelos cubanos – com a emenda Platt e o protetorado legal a Cuba. Parte do acordo feito com a Espanha dizia que os EUA poderiam intervir militarmente em Guantánamo, independentemente da posição do governo cubano. O primeiro presidente cubano, Tomás Estrada Palma, oficializa Guantánamo como território estadunidense.
1917: Os EUA criam a Lei de Comércio com o inimigo. Decretada como “medida em tempos de guerra” pelo presidente Woodrow Wilson, consistia num pacote de medidas econômicas, comerciais e financeiras contra Cuba, além de dizer que qualquer presidente estadunidense poderia declarar “período de emergência nacional ou durante um período de guerra” e involucrar-se em países estrangeiros. Essa mesma lei foi usada contra o Vietnã e a Coreia do Norte em outras épocas e retiradas depois. O único país que continua sob essa legislação na atualidade é Cuba.
1933: Fulgencio Batista, ditador e assassino cubano, foi presidente de Cuba pela primeira vez, apoiado por investidores estadunidenses ligados ao crime organizado e interessados na exploração laboral, econômica e sexual da chamada “Las Vegas Cubana”. Foi reeleito em 1940, 1952 e em 1954, através de golpes militares e apoiado pelo exército, igreja católica e latifundiários. A população cubana era extremamente pobre, sem acesso à saúde e escola pública, passava fome e poucos tinham moradia. A burguesia cubana permanecia intacta.
Início da Era Castro
1926: nasce em 13 de agosto, na cidade de Birán, Fidel Alejandro Castro Ruz, descendente de espanhóis. Em 1950 se gradua em direito, inspirado por Marx, Lênin e Jose Martí.
1952: Castro se candidata a presidente de Cuba, apoiado por Raul Castro, Camilo Cienfuegos e intelectuais cubanos. Um golpe de estado anulou as eleições, mantendo Fulgencio no poder. Fidel inutilmente denuncia Batista por violar a constituição cubana.
1953: Depois de tentar invadir o Quartel Moncada, Fidel é preso com Raul e outros 160 homens. Condenado a quinze anos de prisão, cumpre dois anos da pena e é libertado pela anistia com os outros presos; exilado no México, conhece Ernesto “Che” Guevara.
Revolução
1956: Iniciou-se o Movimento 26 de julho. Fidel partiu do México no iate Granma, acompanhado por Raul, Camilo, Che e mais 82 combatentes para iniciar a revolução. Quando chegaram a Cuba, foram surpreendidos pelo exército de Batista na Sierra Maestra. A maioria dos revolucionários acabou ou morta, ou presa. Fidel, Che, Raul, Camilo e alguns outros sobreviventes fugiram. A população apoiou os revolucionários e o exército foi fortalecido.
1957: Em março os revolucionários invadiram o Palácio Presidencial em Havana, para tentar assassinar Fulgencio. Com isso os EUA decidem retirar seu embaixador de Cuba, debilitando o governo Batista.
Continua no próximo mês…
2 Comments
Sensacional ter voce Simone, escrevendo sobre a tumultuada historia revolucionaria de Cuba, bem como uma visao realista do lider fraternal Cubano Fidel Castro. Uma historia para ser lida, relida e compreendida e muito, muito mesmo, distante e, sem conexao alguma com os personagens da recente politica Brasileira.
Obrigada Juraci! Que bom que voce gostou! Em fevereiro tem a ultima parte!